A Blau Farmacêutica acaba de precificar seu IPO a R$ 40,14 por ação, dando ao mercado mais uma alternativa no setor de farma, e depois que o vento contra forçou a companhia a reestruturar a oferta.
Para botar a operação de pé, a Blau cancelou a tranche secundária — que o controlador havia concordado em fazer em parte para aumentar a liquidez do papel — e reduziu em 10% o piso da faixa indicativa, que ia de R$ 44,60 a R$ 50,60.
No preço da oferta, a companhia levantou R$ 1,26 bilhão e estreia valendo R$ 7,20 bilhões.
O preço implica um múltiplo de 20 vezes o lucro estimado para este ano, de R$ 355 milhões, e é um prêmio de 30% sobre o múltiplo da Hypera, até agora o único player do setor de farma do mercado (sem contar a Biotoscana, que é ilíquida).
A transação atraiu fundos internacionais focados em saúde e outros dedicados ao nicho de biofarma. Cerca de 60% da alocação ficou com investidores internacionais, e das 10 maiores ordens, sete eram de estrangeiros.
O total de ações em circulação será de 17,5% do capital, com um waiver da B3 para que a companhia aumente o free float para 25% em até um ano e meio.
A Blau teve margem EBITDA de 34,4% e lucrou R$ 254 milhões em 2020. Este ano, deve faturar R$ 1,5 bilhão, com EBITDA de R$ 550 milhões e lucro líquido de R$ 355 milhões.
Fundada e controlada por Marcelo Hahn — um corredor da Fórmula Porsche plugado nos 220 volts — a Blau quer dobrar de tamanho em três anos e tem uma ambição global, ainda que seu pipeline de lançamentos seja focado no Brasil.
A companhia faturou R$ 1,2 bilhão ano passado vendendo medicamentos biológicos, oncológicos e especialidades. A maior parte das vendas é feita diretamente a hospitais e clínicas — e ao Ministério da Saúde, dada a complexidade dos produtos envolvidos.
A Blau tem um portfólio concentrado: 70% do faturamento vem de 19 medicamentos, expondo o negócio ao risco do supply chain evidenciado pela pandemia. Outro calcanhar de Aquiles: os medicamentos biológicos e oncológicos tipicamente têm insumos importados, sujeitos ao risco cambial. A cada desvalorização, a companhia pode enfrentar dificuldade de repassar preços.
O carro-chefe da Blau é a imunoglobulina, que ano passado foi 22% das vendas. A alfapoetina, outra droga usada no tratamento do câncer, foi 15% da receita. A Blau tem 50% do mercado de imunoglobulina e 85% do de alfapoetina. Além do câncer, ambas são usadas no tratamento da AIDS e da esclerose múltipla.
Para fabricar imunoglobulina, a indústria precisa de plasma. A Constituição brasileira não permite a venda de sangue; os EUA, sim. Resultado: a Blau está criando um banco de plasma nos EUA — onde acontecem 70% da coleta de plasma no mundo — em sociedade com uma empresa americana. A Blau poderá vender esse plasma no mercado americano ou exportar. (A JV já tem contratos pré-assinados.)
Hoje, a imunoglobulina fabricada no Brasil usa plasma da Coréia.
Numa reunião com investidores, Hahn explicou por que decidiu fazer o IPO.
“Todo mundo fala que eu não preciso abrir capital porque a empresa gera caixa, mas eu quero crescer muito e só eu sei das dificuldades que tive para encontrar capital, tive até que hipotecar minha casa para dar garantias. Com o IPO, os bancos vão me receber, vai entrar dinheiro novo e vou poder acelerar e deixar um legado,” disse Hahn, de acordo com investidores que participaram da sessão.
O empreendedor é a quarta geração de uma família que fundou farmacêuticas na Alemanha e na América Latina.
Depois de tentar o IPO pela primeira vez em maio de 2018 e receber críticas do mercado, Hahn contratou mais executivos, melhorou a governança e entregou o que prometeu em crescimento, governança e redução da dependência do setor público. De 2017 para cá, a companhia reduziu sua exposição ao SUS de 45% do faturamento para 27%.
“Na Hypera a gente compra o canal comercial, na Blau, a gente compra o Marcelo,” disse um investidor que participou da oferta e tem os dois papéis na carteira.
Os coordenadores foram Itau BBA (líder), JP Morgan, Bradesco, Citibank, XP e BTG.