O novo arcabouço fiscal, que deve ser apresentado pelo Ministério da Fazenda nos próximos meses, deve ser uma regra “simples, fácil de entender e executar, e que garanta a sustentabilidade da dívida ao mesmo tempo que permita resistir a possíveis choques.”

É essa a visão de Guilherme Mello, o Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda.

“Tivemos a primeira geração de regras fiscais, da qual a LRF foi o grande representante. Depois da crise de 2008 tivemos a segunda geração, que foi o resultado fiscal estrutural. Agora, pós-covid, queremos criar a terceira geração de regras fiscais,” Guilherme disse hoje durante o Latin America Investment Conference do Credit Suisse, em São Paulo.

Para ele, o atual arcabouço fiscal — teto de gastos, regra de ouro e LRF — perdeu a credibilidade, tirando a previsibilidade para as finanças públicas, já que nos últimos anos esse arcabouço foi emendado diversas vezes para permitir mais gastos.

“Um dos problemas das regras fiscais que foram criadas até agora é que quando tem choque você tem que acionar válvulas de escape, e aí é difícil retomar depois,” disse ele, acrescentando que o novo arcabouço precisa ter mais flexibilidade para essas situações.

Guilherme disse que o desenho da regra ainda não está definido, mas que o Ministério está trabalhando para entregar uma proposta nos próximos meses, até para orientar a LDO.

“Queremos que esse arcabouço dialogue com as tendências mais recentes no mundo. Tem vários casos de países latinoamericanos que tiveram regras fiscais mais duradouras.”

Guilherme também falou sobre a reforma tributária que está sendo desenhada pelo Governo e garantiu que a proposta não está pensada para aumentar a carga tributária. 

“O objetivo é, com um patamar semelhante, melhorar a qualidade da tributação brasileira,” disse. “Temos enorme complexidade nos tributos indiretos, o que destrói a competitividade das empresas. Temos que avançar para a aprovação de um IVA, um IVA moderno baseado na literatura e experiência internacional.”

Segundo ele, o governo também quer mexer no imposto de renda para “simplificar o imposto e melhorar a distribuição de renda.”

Na conversa, a economista-chefe do CS, Solange Srour, notou que seria preciso de um ajuste de 4 pontos porcentuais no PIB para a dívida pública se estabilizar. 

“Se não vai ter aumento da carga tributária, vai ter reforma de gastos para esse ajuste ser feito?” questionou Solange. “Porque nas nossas contas, a dívida sobe 5 pontos em 12 meses.”

“Do ponto de vista de gastos, estamos colocando uma ênfase de, junto com o arcabouço fiscal, criar uma cultura de spending review, para avaliar de maneira técnica a qualidade da política pública e quais são os ajustes e melhorias de políticas públicas que precisar ter nos próximos anos,” respondeu Guilherme.

Ele deu o exemplo do Auxílio Brasil, que, segundo ele, teve um orçamento recorde mas tem uma série de problemas. “Você pode melhorar a política e às vezes com o mesmo recurso ou até menos fazer mais. Acreditamos que podemos melhorar isso e tornar isso uma cultura do Estado brasileiro.”

O secretário disse que espera recuperar de forma “bem veloz” o resultado primário brasileiro. 

Segundo ele, existe a possibilidade de zerar o déficit este ano, mas o governo está trabalhando hoje com um déficit de 0,5% a 1% para este ano. 

“Com isso, a tarefa de reduzir a dívida se reduz para os próximos anos. E a aprovação dessas duas reformas (novo arcabouço fiscal e tributária) tem potencial de reduzir o prêmio de risco e a taxa de juros neutra, criando um cenário para gerar estabilização da dívida.”

O secretário também debateu o aumento da meta de inflação, um tema que começou a ser discutido nas últimas semanas depois de declarações do Presidente Lula. 

Guilherme disse que esse tema não está pautado no Ministério da Economia, e que é um debate que o CMN deve ter mais à frente, em junho, e “até lá muita coisa pode acontecer.”

“Mas o que colocamos, e o próprio presidente do BC já falou isso, é que os juros reais do Brasil são muito altos, um dos maiores do mundo. Obviamente é desejo de todo governo reduzir essa taxa preservando a trajetória de queda da inflação. O que cabe a nós é trabalhar para apresentar as reformas e medidas econômicas que permitam que o BC tome as medidas na política monetária.”