Primeiro, foram os caminhoneiros.  “Vamos parar esse País,” disseram. “Não aguentamos mais o custo deste diesel. Estamos sendo violentados e não temos como colocar pão na mesa das nossas famílias.”  Como estava todo mundo puto com o preço da gasolina, rolou uma grande empatia, e o povo aplaudiu os caminhoneiros.

Em seguida foram os lixeiros.  “Vamos parar a coleta”, disseram.  “Ganhamos uma me#$@ para tanta insalubridade, e isso prejudica nossa saúde.”  Como o brasileiro tem pena de quem acorda cedo e tem a mão calejada, rolou uma grande empatia, e o povo aplaudiu os lixeiros.

Os garçons logo acordaram.  “Somos mal remunerados, toleramos todo tipo de grosseria, e chegamos em casa fedendo a comida.  Queremos condições melhores.”  Como todo mundo é amigo de um garçom camarada, rolou certa empatia e o povo aplaudiu os garçons.

Aí vieram os professores.  Vendo que tantas categorias conseguiam a atenção do Governo apenas cruzando os braços, os professores decidiram tentar o esquema.  “Recebemos tão pouco e muitas vezes compramos o giz com dinheiro próprio,” disse o seu líder.  Como o brasileiro sabe que educação é a base de tudo, rolou forte empatia, e o povo aplaudiu os professores.

Em uma semana, o País estava como no ‘Ensaio sobre a Cegueira’, do Saramago. O lixo não era recolhido, a água não era tratada, e eletricidade não havia. Todos aplaudiam os grevistas, mas tinham que se estapear no mercado pelo mesmo saco de farinha, e comprar água mineral com ágio.

Entre tantas categorias, era difícil escolher aquela cuja demanda tinha mais mérito (ainda que, particularmente, eu torcesse pelos professores).

E o País entrou no impasse:  todo mundo admirava a luta e a resistência dos grevistas, mas ninguém aceitava colocar a mão no próprio bolso para corrigir a situação.  Vivia-se de duas coisas:  o coitadismo e a cultura do subsídio.

“Já sofremos muito!  Não aguentamos mais!” dizia o povo, pronto para eleger o primeiro que prometesse comida grátis, passagem grátis, e aposentadoria aos 50.

E a greve continuou.