As gestoras 4UM Investimentos, Organon Capital, Charles River e Real Investor, que juntas somam quase 10% das ações da Tupy, estão preocupadas com a decisão de BNDES e Previ de mudar o comando da metalúrgica.
Para esses minoritários, que não apoiam a medida e não enxergam nenhuma razão para a troca de CEO, trata-se de uma decisão meramente política.
A informação sobre a provável troca “definida por BNDES e Previ” saiu no jornal Valor Econômico no dia 18 e foi confirmada pela Tupy num fato relevante que afirma que “a presidente do conselho de administração e a Secretaria de Governança Corporativa” receberam da BNDESPar “a sugestão de ‘avaliar como potencial candidato a eventual sucessão do Diretor Presidente, o Sr. Rafael Esmeraldo Lucchesi Ramacciotti’”.
A sugestão, segundo a nota, vem no contexto de que o mandato da diretoria atual se encerra em 30 de abril. A BNDESPar tem 28,2% da Tupy, e a Previ, 24,8% — juntas, elas detêm 53% da empresa e a maioria no conselho, que tem a atribuição de escolher o CEO.
“Essa notícia foi para nós uma surpresa negativa. Primeiro porque estamos muito satisfeitos com o atual CEO, que é parte importante da reconstrução da Tupy”, Camilo Marcantonio, um sócio da Charles River, disse ao Brazil Journal. “Depois pela escolha de um nome que não tem histórico de executivo e nunca foi CEO de companhia.”
No dia em que a indicação foi divulgada, a ação da Tupy caiu 7%; a queda acumulada desde então é de 13,5%. A empresa vale R$ 2,70 bilhões na Bolsa.
O economista Rafael Lucchesi, como é conhecido, é diretor na Confederação Nacional da Indústria (CNI) e diretor-superintendente do Sesi. Foi nomeado presidente do conselho de administração do BNDES em fevereiro de 2023, logo no início do Governo Lula.
O conselho deve se reunir para tratar do assunto no dia 28.
Se a decisão for confirmada, Lucchesi substituirá Fernando Rizzo, que está à frente da Tupy há sete anos. Rizzo começou sua vida profissional como trainee da Mercedes-Benz do Brasil, entre 1992 e 1995. No ano seguinte transferiu-se para a Tupy, onde fez carreira desde então.
Sob sua gestão, a companhia tornou-se uma consolidadora no segmento de fundição de blocos e cabeçotes para motores a combustão de veículos pesados.
O executivo fechou aquisições que internacionalizaram a companhia. No final de 2019, a Tupy anunciou a compra da Teksid, uma subsidiária da Stellantis que fazia basicamente o mesmo que a Tupy, mas com contratos piores. Desde a aquisição, a Tupy aumentou a rentabilidade da operação. Em 2022, a gestão de Rizzo comprou a MWM, um negócio transformacional que colocou a Tupy como protagonista da descarbonização no Brasil.
A MWM produz motores mas tem outras frentes, de geradores elétricos a diesel; reposição de peças e componentes de motores; e bioplantas, que abriram a porta de entrada para a Tupy no agronegócio. As bioplantas transformam resíduos de porcos em combustível renovável e fertilizante organomineral. A Tupy passou a transformar motores para receberem biocombustível, além de fornecê-lo.
Raphael Maia, sócio da Organon Capital, disse que o atual CEO mudou a avenida de crescimento da Tupy.
“Não conheço o Rafael e não consigo avaliar se o nome dele é bom ou não porque não sei os critérios utilizados para escolhê-lo,” disse Maia, acrescentando que o fato de o mandato da diretoria acabar em abril é uma “mera formalidade.”
“Quando o CEO está desempenhando um bom papel, ele é reconduzido, assim como conselheiros e diretores. Queremos entender por que tirar uma pessoa que está performando bem. Quais foram os critérios e processos utilizados para se chegar a essa indicação? Foram analisados outros nomes ou mesmo pessoas de dentro da Tupy? Qual o perfil se está buscando?” questiona o gestor.
Giuliano Dedini, sócio da 4UM Investimentos, disse que Rizzo vem investindo em tecnologia e inovação na Tupy e está no meio de um ciclo muito importante, de integração, captura de sinergias, “e não há porque tirá-lo do posto agora”.
“Mas dado o histórico de indicações de conselheiros pelos acionistas, esse nome vai passar e pode ser prejudicial para o negócio,” disse.
Na última eleição de conselho, em abril de 2023, foi eleita a chapa indicada pela Previ, BNDESPar e Trígono Capital, uma gestora que tem 10% da Tupy. Cada um indicou três nomes.
A notícia da troca do comando na Tupy veio na mesma semana em que o Estadão informou que a CVM abriu processo para apurar a nomeação – na eleição de 2023 – dos ministros Carlos Lupi (Previdência), Anielle Franco (Igualdade Racial) e Vinicius Marques de Carvalho (CGU) para o conselho da Tupy sem consulta prévia de conflito de interesses à Comissão de Ética.
Os três foram indicados pela BNDESPar.
“O impacto negativo da indicação de conselheiros que não têm a expertise no setor da companhia foi naquela época apaziguado pelo fato de o corpo executivo da Tupy ter se mantido independente e técnico. Agora parece que não será mais assim, uma sinalização muito ruim,” disse Dedini, da 4UM.
Em outra reportagem, o Estadão informou que a Previ afrouxou suas regras e, agora, os novos critérios de indicação para cargos executivos em conselhos facilitam a indicação de representantes de sindicatos, associações e até de pessoas sem experiência.
Werner Roger, sócio da Trígono, disse que vê um total desconhecimento de muitos de como funciona ou deveria funcionar um conselho de administração.
“O BNDES, maior acionista da companhia, fez a indicação de um nome de seu quadro para CEO e o conselho vai avaliar o assunto. A decisão será de todos os conselheiros, que trabalham para a companhia, não para um ou outro acionista. Eles votam segundo as próprias avaliações,” disse Roger.
O mercado vem questionando a independência da Trígono porque, em junho de 2023, a BB Asset comprou uma fatia na gestora, que buscava acesso aos clientes private e de varejo do banco, bem como a abertura de portas com fundos de pensão.
“Me assusta este tipo de associação com BB. O que tem a ver BB com isso? Quem indicou um nome para possível eleição pelo CA foi a BNDESPar,” disse Roger.
Para ele, o mercado ainda precisa aguardar mais informações, como a ata da reunião de conselho que vai avaliar a indicação de Lucchesi e também os planos para a companhia na proposta da administração.
“Lucchesi não tem currículo executivo, mas é uma pessoa ligada à indústria e à inovação. Está ocorrendo o rito normal de indicação. Vamos aguardar os acontecimentos. Os principais acionistas estão há muito tempo na empresa e não me lembro de qualquer ato deles contrário aos interesses dos acionistas minoritários ou que a companhia tenha sido prejudicada pela ação de acionistas ou conselheiros,” disse.
O grupo de minoritários descontentes com a governança da Tupy pretende escolher um nome para indicar ao conselho – e aguarda também uma decisão formal sobre a mudança de comando e o posicionamento dos conselheiros para avaliar possíveis medidas.
“Os conselheiros são da empresa e têm o dever fiduciário de agir no melhor interesse dela. Eles têm de escolher o melhor presidente e, sendo assim, precisam ter a capacidade de responder à pergunta de por que esta é a melhor escolha para a Tupy,” disse Camilo, da Charles River.
O mandato do atual conselho também termina em abril, e a troca do CEO pode ser uma das últimas decisões deste colegiado na Tupy.
UPDATE: O BNDES enviou o seguinte nota ao Brazil Journal.
Seguindo as regras de governança da Tupy, o BNDES encaminhou para avaliação do Conselho de Administração da empresa o nome do economista, professor universitário e executivo Rafael Lucchesi para o cargo de diretor presidente da companhia. A indicação ocorre em razão do fim do mandato da atual gestão, conforme preconiza o estatuto da própria Tupy.