LYON, França – Em 1986, Joseph Cesbron, o então presidente do escritório de turismo de Beauvoir-sur-Mer, na costa oeste da França, estava em busca de ideias para impulsionar o turismo na região.
A solução foi aproveitar um capricho da natureza e criar as Foulées du Gois – corridas anuais sobre as águas do Oceano Atlântico.
Desde então, esta corrida – “foulée” em francês – desafia participantes do mundo a cruzarem a Passage du Gois, uma estrada singular que liga a cidadezinha de Beauvoir-sur-Mer à ilha de Noirmoutier, antes que ela seja engolida pelo mar.
Mais que uma simples corrida, as Foulées du Gois se tornaram uma tradição local e um evento internacional. A peculiaridade da prova reside na própria Passage du Gois, que durante uma ou duas horas é coberta pela maré alta, criando um verdadeiro desafio para os atletas.
A altura da água varia entre 1,30 metro e 4 metros, dependendo do coeficiente da maré, exigindo preparações físicas e mentais dos participantes.
Com mais de 2.000 inscritos a cada ano, as Foulées du Gois atraem corredores experientes e amadores de todas as idades.
A prova oferece diversas categorias, desde a prova mais famosa, a Course des As – uma corrida profissional de 4 km contra o relógio – até percursos adaptados para crianças e jovens, além de uma corrida especial para atletas com deficiência física.
Este ano, o evento entra em sua 36ª edição e está marcado para o sábado que vem. As inscrições custam de € 10-15 para adultos e € 5-8 para crianças.
A Course des As aceita apenas 36 atletas de elite, homens e mulheres, que atravessam a Passage du Gois a um ritmo alucinante antes que a estrada desapareça sob o mar. O sinal de partida é dado quando a maré começa a subir. O recorde atual é de 12 minutos e oito segundos, estabelecido pelo francês Dominique Chauvelier em 1990.
O Tour de France já incluiu a Passage du Gois em quatro ocasiões – 1993, 1999, 2005 e 2011 – e a etapa foi palco de quedas memoráveis.
Em 1999, a passagem estava úmida e escorregadia devido à maré alta, dificultando o controle das bicicletas para muitos ciclistas. Um dos momentos mais dramáticos aconteceu quando o alemão Jens Voigt caiu na frente do pelotão, causando uma queda em massa que envolveu muitos dos principais corredores, incluindo o então líder da corrida, Lance Armstrong. (A queda prejudicou as chances de vitória de alguns potenciais vencedores.)
Mais do que apenas uma estrada, a Passage du Gois é filha da força da natureza com a engenhosidade humana.
Criada ao longo de milhares de anos pelo encontro de correntes marítimas na Baía de Bourgneuf, a passagem foi reforçada no século XVIII para permitir a travessia segura durante a maré baixa.
Acredita-se que o nome Gois é derivado da antiga palavra francesa “goiser”, que significa “ter os sapatos molhados,” uma referência à necessidade de os transeuntes erguerem os pés para evitar a água durante a maré alta.
A região ao redor de Beauvoir-sur-Mer também é conhecida pela pesca e a produção de ostras. A área é preservada, cercada por pântanos e reservas naturais, e um chamariz para os amantes da natureza.
Devido à sua importância histórica, cultural e natural, o governo francês pediu à UNESCO para reconhecer a Passage du Gois como patrimônio mundial.