Quando o assunto é introdução à economia, Gregory Mankiw é uma espécie de padrão-ouro.
O livro-texto do professor de Harvard é tão popular que já lhe rendeu US$ 42 milhões em royalties desde que foi escrito há 20 anos. E sua “Economics 101” é uma das aulas mais quentes entre os calouros da universidade — que até hoje se amontoam num gigantesco auditório para ouvir sobre curvas de oferta e demanda e o funcionamento dos mercados.
Mas agora, segundo uma reportagem do Vox, essa hegemonia pode estar perto do fim.
Raj Chetty, outro economista e professor de Harvard, acaba de lançar um curso de introdução à economia com um approach completamente diferente de Mankiw — e está quebrando o monopólio.
Um filho de indianos que concluiu seu PhD aos 23 anos e se tornou professor titular de Harvard aos 29, Chetty está deixando de lado as discussões teóricas sobre conceitos básicos da economia para apresentar a disciplina aos calouros com trabalhos práticos, estudos empíricos e (muita) análise de dados.
No curso — “Economics 1152: Using Big Data to Solve Economic and Social Problems” — os alunos usam análise de dados e estatística para estudar as desigualdades sociais em diversas esferas da sociedade, começando por seus próprios bairros. A ideia é entender suas raízes e consequências, e buscar formas de solucionar o problema.
Chetty vai do mais básico (explicando como usar as ferramentas de big data e em quais situações aplicar cada uma delas) até o mais complexo (ensinando a garimpar em extensas bases de dados análises sobre temas diversos).
“Cada vez mais eu sentia que o que estamos fazendo em nossos escritórios e nas nossas pesquisas estava completamente separado do que ensinamos nas aulas introdutórias,” Chetty disse ao Vox. “Eu acho que para muitos alunos era algo como, ‘Por que eu quero aprender sobre isso? Qual é o ponto?’”
“É muito diferente da área de ciências, onde desde criança você já tem uma intuição, mesmo que não muito precisa, de que as pessoas estão tentando curar o câncer.”
Para Chetty, o ensino de economia precisa incorporar essa ideia: mostrar que ela pode ser usada para curar as desigualdades e outros males sociais.
A aula, que praticamente não aborda conceitos básicos como oferta e demanda e excedente de produção, está em sua primeira turma e é oferecida aos calouros como um curso introdutório de economia, não exigindo nenhum pré-requisito.
Por enquanto, o curso tem, ao menos, chamado a atenção. A primeira classe atraiu 375 alunos — quase o mesmo número de inscritos na “Economics 101” de Mankiw, que teve 461.
Filho de um dos conselheiros de Indira Gandhi (a primeira ministra da Índia de 1966 a 1984), Chetty se tornou em pouco tempo um dos mais importantes economistas empíricos. Nos últimos anos, trabalhou com temas ligados às desigualdades sociais e raciais, estudando suas raízes e consequências para a sociedade.
Em 2014, ganhou fama quando publicou dois estudos que mapearam a mobilidade econômica — medida pela correlação entre a renda das pessoas e a de seus pais — em diversas regiões dos Estados Unidos, analisando até o nível dos bairros.
Foi um verdadeiro divisor de águas no debate sobre igualdade de oportunidades no país, ganhando repercussão mundial e se tornando referência para think tanks de diversos espectros políticos.
Segundo o The Harvard Crimson, quando voltou a Harvard no ano passado, depois de três lecionando em Stanford, Chetty ganhou um instituto de pesquisas para chamar de seu: o Opportunity Insights, uma organização que colabora com governos e municípios na busca de soluções para a desigualdade.
Seu novo curso reflete essa visão, muitas vezes controversa, sobre a economia. Chetty tem dito com frequência que enxerga a economia como uma disciplina empírica — e cada vez mais baseada em evidências.
Num raro artigo, publicado no The New York Times em 2013, ele diz que a economia é uma ciência exata e chega a comparar as divergências entre economistas com as discussões de médicos, por exemplo, sobre os efeitos nocivos do café.
O terreno para inovação no ensino da economia parece fértil. Segundo o Vox, desde a crise de 2008 muitos economistas têm colocado em xeque a maneira como se ensina economia nas aulas introdutórias, que, em tese, não estariam preparando os alunos para um mundo onde os mercados falham com frequência.
Foto: The Harvard Crimson