Na Eldorado, a empresa de celulose da família Batista, dona da Friboi, o que mais reluz hoje é uma dívida monstruosa.
No primeiro trimestre, a J&F, holding dos Batista, injetou cerca de 500 milhões de reais na empresa, que tem que amortizar dívidas de 1,4 bilhão de reais este ano.
Joesley Batista recentemente bateu às portas de fundos de pensão estatais, alguns dos quais são seus sócios na Eldorado, para tentar convencê-los a injetar mais capital na empresa. Não conseguiu.
A J&F tem 81% da Eldorado, enquanto os fundos de pensão Petros e Funcef são acionistas minoritários.
O principal problema da Eldorado é sua dívida líquida, equivalente a 14 vezes sua geração de caixa. Esse número vai cair na medida em que a empresa aumentar sua produção mas, como regra geral, é um nível de endividamento que faz qualquer CEO ou CFO ter sérias palpitações.
A planta da Eldorado, uma das maiores e mais modernas fábricas de celulose do mundo, tem capacidade para produzir até 1,5 milhão de toneladas por ano e começou a funcionar em setembro. Ainda no chamado “ramp-up”, ela hoje produz cerca de 400 mil toneladas/ano.
“O problema da Eldorado é que é um projeto feito com muito pouco capital próprio”, diz uma fonte do setor. “A família Batista tinha as terras e acesso a financiamento barato do BNDES. Fizeram a típica arbitragem de juros: pegaram dinheiro mais barato do que o mercado cobraria, botaram suas terras e fizeram um negócio para depois vender para alguém.”
Dos 6,7 bilhões de reais que a empresa deve, o BNDES é credor de 3,1 bilhões de reais, e a Caixa de outro bilhão. “Nunca vi uma empresa nascer com tanta dívida,” diz um executivo financeiro que conhece o setor. “Não existe financiamento de projetos de longo prazo com quase 100% de dívida, mas é isso que fizeram na prática.”
A família Batista foi uma das maiores beneficiárias da estratégia do Governo Lula de incentivar a criação dos chamados “campeões nacionais”, empresas que só precisariam de um empurrãozinho — e muito dinheiro público — para concorrer no mercado global. Essas empresas e seus acionistas tiveram acesso a crédito barato e um tapinha do governo nas costas. Além da Friboi e da Eldorado, fazem parte dessa lista a Marfrig, a Oi, e subsidiárias da Odebrecht, entre outras. (Sem falar nas que quebraram, como o frigorífico Bertin.)
Só na Friboi, a principal empresa dos Batista, o BNDES investiu mais de 8 bilhões de reais. Juntos, BNDES e Caixa são donos de 35% da empresa. A história recente mostra que todo esse financiamento barato levou a uma menor disciplina nos investimentos, retornos baixos e dívidas altas, como é o caso da Eldorado.
Agravando o problema da Eldorado, o cenário para os preços da celulose piorou muito de um ano para cá.
A celulose de fibra curta, que negociava a 815 dólares/tonelada há um ano, agora sai a 735 dólares/tonelada. A oferta de celulose no mercado internacional está acima da demanda, e a situação tende a piorar com a entrada em operação de novas fábricas da Suzano, da Arauco/Stora Enso e da própria planta dos Batista.
Com a Eldorado sangrando caixa, o mercado especula que a Fibria, a maior empresa de celulose do mundo, poderia comprar a concorrente novata.
Uma fusão entre a Fibria e a Eldorado faria sentido porque a Fibria já tem uma planta em Três Lagoas, a mesma cidade onde os Batista fincaram a Eldorado. “Há muita sinergia em se juntar as duas florestas pois diminuiria o raio médio — a distância entre a floresta e a planta — das duas empresas,” diz um analista de mercado.
O problema é que o valor patrimonial da Eldorado tende a negativo. Uma planta de celulose nova, com a mesma escala da Eldorado, custaria cerca de 6 bilhões de reais. Assumindo que as florestas da Eldorado valem outro bilhão de reais, a soma — 7 bilhões — é do mesmo tamanho da dívida da empresa, ou seja, um comprador ficaria incentivado a, no máximo, assumir a dívida. Obviamente, os Batista discordam dessa conta e, nas conversas com fundos de pensões, estimam que a empresa vale (muitos) bilhões.
Analistas dizem que a Fibria poderia pagar “alguma coisa” além da dívida, dadas as sinergias de uma fusão. Joesley Batista e Raul Calfat, do Grupo Votorantim, dono de 30% da Fibria, tiveram conversas informais sobre uma fusão há alguns meses, mas nada aconteceu até agora.
As eleições de outubro também trabalham contra a J&F. “Não faz sentido a Fibria decidir uma coisa dessas antes de saber se o governo muda ou não”, diz um banqueiro.