Este texto contém spoilers.

NOVA YORK — Quando Albert Einstein morreu, seu cérebro foi roubado. O cientista alemão estava internado no hospital da Universidade de Princeton, onde lecionava, e faleceu em 18 de abril de 1955, aos 76 anos, após uma hemorragia abdominal interna.

Sem pestanejar, o patologista Thomas Harvey serrou-lhe a cabeça, retirou a massa cinzenta, despejou-a em formol e dissecou cada milímetro na tentativa de desvendar a genialidade de Einstein.

A idéia, grotesca, não é lenda urbana. 

Está em um dos dez episódios de “Genius”, série imperdível lançada em 2018 pela National Geographic e hoje disponível na Amazon Prime. 

A série é repleta de equações sobre luz, gravidade, átomos, e a fórmula mais famosa do mundo — E = mc2.  Não importa.  Você não se sentirá intimidado.

“Genius” mostra que, por trás do senhor descabelado de língua de fora, havia um homem curioso, ético, persistente, transgressor, que peitava e irritava professores, tocava violino, era péssimo em francês e avesso à política. Amou fervorosamente, traiu esposas e foi pai ausente. Judeu não-religioso, sofreu antissemitismo dentro do mundo científico em seu país natal e chegou a levar uma cuspida na cara de um soldado de Hitler, mesmo já sendo mundialmente famoso. 

Baseada na biografia “Einstein: His Life and Universe”, de Walter Isaacson, a série tem Geoffrey Rush no papel do Einstein adulto e o britânico Johnny Flynn como o Einstein mais jovem. Ambos o interpretam com sotaque alemão e recriam sua vida com detalhes preciosos nos países onde ele viveu: Alemanha, Suíça, Itália, República Checa e Estados Unidos. 

Em uma cena, um de seus alunos diz: “Herr Einstein, tenho uma pergunta.” Ao que ele responde: “Só uma? Eu tenho mais de mil!”

O roteiro começa na adolescência e vai e volta entre a juventude e a velhice, traçando sua trajetória familiar, acadêmica e social, por onde circularam nomes como Carl Jung, Pierre e Marie Curie, Franz Kafka, diplomatas e até mesmo o Presidente Franklin Roosevelt, a quem Einstein escreveu uma carta alertando sobre a bomba atômica – posteriormente despejada sobre o Japão. 

Einstein passou a infância sem se adaptar à escola, e aos 15 anos já desafiava os professores.  Tentou convencer seu pai que o método de memorização nas salas de aula não servia para nada, e chegou a buscar um médico da família para escrever um atestado que o liberasse de vez daquela tortura.  (O médico tentou convencê-lo a ficar, porque só restavam dois anos para o jovem se formar. “Eu sei que para o senhor dois anos passam num piscar de olhos, mas para mim é uma eternidade. Bem, todos sabem que o tempo se movimenta em duas velocidades diferentes,” respondeu o adolescente.) 
 
Einstein casou-se com a sérvia Mileva Marić, vivida na série por Samantha Colley. Mileva, uma estudante à frente de seu tempo, aventurou-se a estudar física no Instituto Politécnico de Zurique, onde o casal se conheceu.  A relação borbulhava de paixão, e Mileva provou que por trás de um cientista célebre há uma mulher igualmente brilhante. Ela o ajudava a elaborar os artigos científicos, mas Einstein nunca deu-lhe os devidos créditos, ao contrário de Pierre Curie, que disse ao comitê do Nobel de Física, em 1903, que só receberia o prêmio se sua esposa, Marie, fosse incluída. 

Mileva e Einstein tiveram dois filhos, Hans e Eduard, (além de um bebê que morreu com poucos meses) e com o tempo ela desenvolveu um imenso ressentimento por ter dedicado sua vida científica mais ao marido do que a si, além de exercer a maternidade quase sozinha, enquanto ele se afogava nos estudos. As brigas eram tantas que Einstein saiu pela tangente e acabou se apaixonando por Elsa, uma prima de primeiro grau, com quem se casou pela segunda vez. 
 
Com a ascensão do nazismo, Einstein viu-se forçado a emigrar para os Estados Unidos. Ainda assim, teve de enfrentar uma entrevista com o cônsul americano Raymond Geist, pois os EUA suspeitavam que o cientista tinha inclinações comunistas. Ele só teria o visto aceito caso assinasse uma carta prometendo que não se filiaria a nenhum partido do gênero. 

Em uma cena memorável de “Genius”, Einstein recusou a assiná-la. Mesmo assim, o cônsul deu-lhe o visto, pondo em risco sua própria carreira diplomática. Ao ver seu passaporte carimbado, o alemão resolveu assinar a carta, mas pediu um único favor ao cônsul: que liberasse o máximo de judeus possível da Alemanha. Entre 1933 e 1939, Geist concedeu vistos a milhares de famílias, salvando 50 mil vidas. Uma lição que ficou para a história. Afinal, como dizia o mestre, “a distinção entre o passado, o presente e o futuro nada mais é do que uma teimosa ilusão.”