“Não tenho moral para falar contra greve, nasci das greves,” disse recentemente o Presidente Lula em referências a paralisações de servidores. As greves “são um direito democrático dos trabalhadores.”
A fala do Presidente ecoou pelos corredores da burocracia federal praticamente como um incentivo às paralisações do funcionalismo.
As mobilizações sindicais ganharam força nos últimos meses e vão pipocando em diversas áreas, atingindo institutos de ensino, Banco Central e órgãos de fiscalização ambiental. Mais de 10 categorias estão hoje em greve ou ‘estado de greve.’
Lula não dá sinais de que irá se desgastar em negociações salariais, muito menos numa necessária reestruturação da carreira do funcionalismo. Alguém de seu Governo, entretanto, precisa enfrentar a questão – ainda mais quando servidores de braços cruzados sabotam atividades essenciais para o funcionamento da economia.
Talvez o caso mais preocupante hoje seja a “operação padrão” do Ibama, que tem causado prejuízos em cascata tanto para as empresas que precisam de licenças quanto para o próprio Tesouro.
Nos portos – onde os carros importados precisam de um carimbo do Ibama e de outros órgãos – a redução no ritmo de trabalho dos fiscais tem afetado a movimentação de carga internacional, acarretando custos adicionais para as empresas. No final de fevereiro, a Firjan – que representa a indústria do Rio de Janeiro – entrou com um mandado de segurança na Justiça Federal solicitando a normalização dos serviços. Não houve resposta até agora.
No setor de petróleo, um dos mais diretamente atingidos pelos grevistas, nenhuma licença ambiental saiu desde o início do ano. Isto é péssimo para uma economia já claudicante – e trágico para as contas públicas.
Segundo estimativa do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), municípios, estados e o Governo Federal deixaram de arrecadar mais de R$ 1 bilhão nos quase quatro meses de paralisação. A queda de faturamento de todo o setor teria sido de R$ 3,4 bilhões, enquanto R$ 650 milhões de novos investimentos estão parados por falta de licenciamento.
Esses números – sem falar nos empregos que deixam de ser gerados – já deveriam ser suficientes para acender um sinal amarelo no Planalto.
No setor de energia elétrica, dezenas de projetos estão prontos para sair do papel, dependendo apenas da assinatura dos fiscais do Ibama. Entre as maiores obras, há 4 termelétricas, 3 parques eólicos, 10 linhas de transmissão.
Boa parte desses investimentos faz parte do Plano de Aceleração de Crescimento (PAC) – e nem assim o Governo demonstra senso de urgência para superar o impasse.
O Planalto está disfuncional?
A mobilização agravou o que já funcionava bem. Qualquer investidor de infraestrutura sabe que o processo de licenciamento ambiental no País é um pesadelo. Para se construir um gasoduto, o licenciamento demora – no mínimo – inacreditáveis cinco anos, segundo executivos do setor.
O Brasil se orgulha de ter uma regulação ambiental que seria uma das melhores do mundo, mas o custo à economia e aos empregos já desequilibrou a equação. Mais do que apenas contratar mais quadros, como pedem os sindicatos, é preciso reformar os processos, conciliando a agenda verde e o PIB.
O impacto da greve já é sentido em outra área crítica: o combate ao desmatamento.
Nos dois primeiros meses do ano, os autos de infração de crimes ambientais caíram quase 70% em relação ao ano passado. Na Amazônia Legal, a redução supera os 80%, e praticamente não houve pagamento de multas neste ano.
Os servidores pedem a reestruturação da carreira e dos salários. Também se queixam do aumento do volume de trabalho, com o aumento no número de processos de licenciamento e a diminuição do quadro de funcionários.
A negociação entre os servidores e o Governo pouco avançou.
Inexplicavelmente, a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, não se envolve com o problema no maior órgão de sua pasta.
As conversas são lideradas pela Ministra de Gestão e Inovação, Esther Dweck. Segundo pessoas que acompanham as conversas, Esther informou Marina que não será possível ir além do que já foi apresentado aos servidores. A última oferta foi um reajuste médio de 35%, efetivado de maneira parcelada em 2025 e 2026.
A proposta está sendo analisada pelos funcionários.
Executivos de setores afetados pela paralisação reconhecem que há falta de estrutura adequada para o Ibama. O que preocupa é a falta de coordenação dentro do Governo e a incapacidade de superar o impasse.
Com o apoio tácito de Lula, os servidores ficam à vontade para ampliar os movimentos grevistas, enquanto a ministra Esther fica “fervilhando em problemas,” como disse o próprio Presidente.
Mas onde está Marina Silva? A ministra sempre foi uma figura respeitada e um símbolo do ambientalismo brasileiro. Mas o cargo de ministro demanda mais e é mais penoso do que o de uma “embaixadora do meio ambiente”.
A greve do Ibama demonstra isso. Este governo precisa resolvê-la rápido de forma a não dar (mais) um tiro no próprio pé.