Principal líder do Republicanos – partido que acaba de eleger Hugo Motta como presidente da Câmara –, o deputado federal Marcos Pereira acredita que o governo Lula chega a seu terceiro ano precisando mudar a postura.
A narrativa de que a economia está robusta já não cabe mais, ele afirma, e seria necessário adotar uma condução mais pragmática. “É preciso saber a realidade, que as coisas não estão tão bem assim quanto se diz que está, quanto já se dizia até o final do ano passado,” Pereira disse ao Brazil Journal.
Bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, o deputado por São Paulo preside há 14 anos o Republicanos, um partido que se apresenta como liberal na economia e conversador nos costumes, e é controlado pela igreja de Edir Macedo, uma instituição que desde a primeira eleição de Lula, em 2002, tem buscado manter uma relação próxima de todos os governos. Não por acaso, a sigla já teve ministros nas gestões Dilma, Temer e Bolsonaro. O próprio Pereira chefiou o MDIC no Governo Temer.
No Lula 3, o partido da Universal segue no mesmo estilo “lá e cá”. Oficialmente se diz independente, mas tem um filiado entre os ministros da gestão petista, o pernambucano Silvio Costa Filho, titular da pasta de Portos e Aeroportos desde 2023 – uma flexibilidade que também ajudou a eleger Hugo Motta como presidente da Câmara no sábado.
Já sobre Tarcísio de Freitas, outro quadro de seu partido, Pereira afirma que dificilmente ele vai disputar o Planalto.
“Para ele ser candidato a presidente, Bolsonaro teria que sinalizar isso, para ele poder renunciar ao mandato de governador e se preparar para ser candidato,” disse o deputado. “Mas Bolsonaro a todo momento tem dito que o candidato é ele, para depois ser substituído. Nesse contexto, é complicado. Como ele vai renunciar e ficar esperando Bolsonaro decidir?”
A seguir, os principais trechos da entrevista:
O Republicanos anunciou no início do mandato de Lula que não seria nem base do governo nem oposição. O partido seguirá independente neste início de ano legislativo?
Sim. Apesar de termos um filiado do partido como ministro, o Silvio Costa Filho, vamos continuar atuando de forma independente, mas com independência colaborativa. É como a gente tem atuado há pouco mais de um ano, desde que ele chegou ao cargo de ministro. É óbvio que, nas pautas de costumes, não. O presidente não tem enviado nada de pauta de costumes para o Congresso, mas ele sabe que, se enviar, não terá o apoio do Republicanos. Já a pauta econômica a gente debate caso a caso, mas na média temos apoiado e colaborado, porque são pautas alinhadas ao que defendemos no nosso manifesto político.
Como avalia o governo Lula nesse terceiro ano de mandato?
O início do ano não foi bom para o governo, e eles também estão cientes disso. Sabem que não foi bom não só no caso do PIX, mas tem também o aumento do preço dos alimentos, o preço do gás, do combustível. E eles precisam agir rápido para que essas coisas não tomem um volume maior. Eles têm que sair um pouco da narrativa e ir para a prática, um pragmatismo talvez maior.
A que narrativa se refere exatamente?
A narrativa de que a economia está bem, de que as coisas estão indo bem. Não está bem, é preciso saber a realidade, que as coisas não estão tão bem assim quanto se diz que está, quanto já se dizia até o final do ano passado.
Com os juros subindo, existe um temor entre os deputados de que haja uma recessão e isso contamine o cenário para 2026?
A preocupação de que haja recessão é de qualquer brasileiro que compreenda o assunto. Recessão não é bom para ninguém, não é bom para o País, não é bom para a empresa, não é bom para os trabalhadores. E, obviamente, havendo recessão, isso contamina o cenário político. Para quem é governo, isso é mais preocupante. Mas para quem é oposição e quer voltar ao poder, é mais interessante no debate político.
A crise do Pix mudou o jogo ou foi só uma marolinha?
A questão do Pix demonstrou uma falta de capacidade de diálogo do governo com a população, porque mesmo o governo dizendo que não ia ter taxação do Pix, mesmo os veículos de comunicação dizendo que não haveria, o povo não acreditou, e o governo teve que voltar atrás. É mais uma questão de narrativa do que prática, até porque não haveria mesmo taxação. E o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), que é muito jovem, tem a idade do meu filho, também não disse no seu vídeo que haveria taxação, mas insinuou. Então acho que falta capacidade de dialogar com a população.
E como tem sido a relação do Congresso com o presidente?
Com o presidente diretamente, eu entendo que o diálogo tem sido pouco, tem sido aquém do que deveria, e muito aquém do que foi Lula 1 e Lula 2, por exemplo. Talvez porque o presidente esteja mais cansado. Ele teve problemas de saúde, que atrapalharam a agenda dele.
Há uma sensação de que a eleição de 2026 já foi antecipada?
Infelizmente, as pessoas são muito aceleradas. Acho que em certa medida sim. Não é o ideal. O ideal é governar, cuidar das pessoas, ver o que pode ser feito, administrar, fazer gestão. Mas mesmo a eleição para a presidência da Câmara também foi muito antecipada. No dia seguinte à reeleição de Arthur Lira (Progressistas-AL) já se falava em sucessão. Não é bom. Com as redes sociais, as pessoas andam mais aceleradas.
O governador Tarcísio, do seu partido, tem sido cotado para presidente em 2026. Ele será candidato?
Eu acho muito difícil o Tarcísio ser candidato a presidente, porque ele precisaria da sinalização do Bolsonaro de que ele é o candidato, para ele poder renunciar ao mandato de governador e se preparar para ser candidato. Mas o Bolsonaro, em todo momento, tem dito que Bolsonaro é o candidato, para depois ser substituído. Esse contexto é complicado. Como é que Tarcísio vai renunciar ao mandato e ficar esperando o Bolsonaro decidir?
Faz mais sentido ele buscar a reeleição em São Paulo?
Não tenha dúvida.
Há também especulações de que Bolsonaro quer levá-lo para o PL. Tarcísio fica no Republicanos até o fim do mandato de governador?
Se ele, quando era ministro, não foi para o PL, e o Bolsonaro queria que ele fosse, por que agora ele teria que ir?
Sem Bolsonaro ou Tarcísio, quem seriam os nomes para enfrentar Lula em 2026?
Há outros nomes, como Ronaldo Caiado (União Brasil) e o Ratinho Júnior (PSD). Tem ainda tempo para surgir um novo nome.
A população evangélica tende a ser novamente decisiva nas eleições de 2026?
Os evangélicos foram, em 2022, 32% da população, são hoje 34% e a projeção é que serão 36% da população em 2026 – mais do que um terço da população, com pautas e valores que são caros a eles, e isso tem influência em qualquer processo eleitoral.
O governo deveria dar mais atenção a esse eleitorado?
Até onde eu sei, a informação que eu tenho é que eles estão tentando, mas estão encontrando dificuldades. O povo evangélico é muito pragmático. Não importa dizer que não vai fazer ou o que vai fazer, tem que demonstrar que está fazendo realmente. E a pauta dos costumes é a pauta dos evangélicos. Não é que o governo diga que não está fazendo, é que o povo sabe que se eles tiverem oportunidade, eles farão. Então, me parece que está tendo aí uma dificuldade do governo em saber como dialogar com esse público.
Mas o senhor disse que o governo não tem se engajado na pauta de costumes.
Não no Poder Legislativo, mas tem as portarias do dia a dia do Ministério da Saúde, do Ministério da Justiça. Toda hora tem uma portariazinha aí que acaba envolvendo essa pauta.
Que poderiam gerar uma nova crise como a do Pix?
Talvez não na mesma proporção, mas sempre gera. A Pix, do jeito que foi colocada, impactava diretamente no bolso do cidadão.
Com a vitória de Hugo Motta na Câmara, que pautas devem ser prioridade para o Congresso em 2025?
Não tenha dúvida que qualquer tema que envolva economia sempre terá prioridade. Temos que continuar com a regulamentação da reforma tributária, que ainda não foi totalmente concluída. Além disso, se o governo quisesse, e acho que esse governo não quer, mas se quisesse, uma reforma administrativa seria bem-vinda, mas não é a pauta de um governo de esquerda. E também acho que precisa acompanhar essa questão da inflação, ver o que o Congresso pode fazer, já que a inflação é sobretudo do preço dos alimentos.
O que o Congresso poderia fazer para ajudar com a inflação?
A iniciativa é do Poder Executivo. Se houver alguma iniciativa que dependa de aprovação legislativa, é óbvio que o Congresso vai estar pronto para fazer com agilidade, com rapidez. Outro tempo importante é o controle dos gastos. O que for preciso e o que depender do Congresso, seremos colaborativos, porque é uma pauta essencial, é importantíssima, o avanço fiscal.
Um tema que deve ser debatido é a isenção do IR até R$ 5 mil. O que espera para essa pauta no Congresso?
Da forma que foi apresentado pelo governo, é um tema sensível. É preciso saber como vai suprir esse recurso. Porque se você vai dar uma isenção, tem que buscar a origem do recurso que vai cobrir. É um tema que já foi encaminhado, e, quando foi encaminhado, não foi bem recebido, porque a fórmula não foi boa. Vai ter que ser endereçado.
A anistia dos presos políticos do 8 de janeiro deve entrar na pauta do Congresso?
Isso é um pedido da oposição, do PL. Eu não sei se o Hugo Motta assumiu algum compromisso de, ao menos, pautar. Eu não posso dizer porque eu não acompanhei os compromissos dele sobre esse tema. Mas acho que é um tema de menos importância agora. É um tema técnico. Você só pode fazer anistia se houver processo concluído. E o processo não está concluído ainda. Portanto, como é que você vai fazer uma anistia para depois ser questionado, e o STF dizer que é inconstitucional porque foi feita no tempo errado? Após os processos concluídos, você pode falar em anistia. Enquanto o processo estiver em andamento, que é o que está acontecendo hoje, tecnicamente, e eu falo como advogado, como jurista, não se pode fazer anistia.