Desde o closing da fusão entre a Arezzo&Co e o Grupo Soma há um ano, o dia a dia da empresa resultante, a Azzas 2154, foi tomado por desentendimentos entre os dois maiores acionistas — Alexandre Birman e Roberto Jatahy — que não conseguiam entrar em acordo sobre diversos pontos da gestão do negócio.
A guerrilha cobrou seu preço, colocando em banho maria a integração das operações e dificultando a captura das sinergias da fusão. Entre agosto do ano passado e março deste ano, a ação da Azzas chegou a cair mais de 60%, causando enorme prejuízo pessoal aos próprios controladores.
Mas na manhã de hoje, Birman e Jatahy estão botando uma pedra sobre o assunto e anunciando que recuperaram a confiança um no outro – um acordo que devolve a funcionalidade à empresa e lhe permite voltar a capturar as sinergias.
“Chegamos num nível de confiança entre nós, e a partir disso vamos flexibilizar várias coisas informalmente. Não tem mais blindagens. O que tem agora é um grupo de pessoas competentes com muita vontade,” Birman disse ao Brazil Journal.
Jatahy disse que a “briga” foi na verdade uma série de discordâncias entre os dois sobre a maneira de atingir objetivos comuns.
Por exemplo, os dois tinham visões diferentes sobre o nível do estoque da companhia e o ROIC desejado, bem como sobre a estratégia para a expansão da Hering (essencialmente, se as megastores seriam próprias ou franquias).
Outro ponto de discórdia, natural numa fusão: quais talentos reter, e quais perder. Os executivos podem ser medidos por sua competência — ou pela relação de confiança que o empreendedor tem com eles.
“Tivemos essa discussão se quem ficaria seria escolhido pela relação ou pela entrega,” disse Jatahy. “Quando eu fazia M&As na Soma, eu continuava no comando. Agora, pela primeira vez eu tinha uma outra pessoa — o Alexandre, que é um cara sofisticado e inteligente — fazendo contraponto às minhas visões e decisões de poder. Não foi fácil pra mim dividir essas decisões e no início até ter que acatar o direcionamento do Alexandre. Mas percebemos que não dá para fazer um omelete sem quebrar os ovos.”
No fundo, segundo os dois empresários, as discordâncias tinham origem nos modelos de negócio diferentes da Soma e da Arezzo.
Enquanto o Grupo Soma era um negócio eminentemente B2C – com receita e margem bruta maiores mas um capital empregado também superior – a Arezzo vendia mais para as franquias, um modelo asset light e altamente gerador de caixa.
“São crenças diferentes, mas não tem um certo e errado,” disse Jatahy.
Birman e Jatahy creditaram o acordo a Pedro Parente, o chairman da companhia, que os fez focar no que eles tinham em comum, e não no que os separava.
Parente – cuja experiência inclui a Casa Civil do Governo Fernando Henrique e a presidência da Petrobras e da BRF – ajudou os dois lados a baixar a guarda.
Pelos termos do acordo de acionistas celebrado na fusão, Jatahy “tinha uma certa proteção, uma blindagem se ele não quisesse integrar muito o backoffice da BU de vestuário feminino com as outras áreas. Ele tinha esse direito, mas ele sabe que isso é ‘anti-sinergia’. Trava valor.”
Parente mostrou aos dois que era importante deixar as proteções do acordo de acionistas de lado. “Acordo de acionistas é um combinado para o caso de litígio, não é para ficar seguindo no dia a dia. Uma empresa não funciona assim,” Jatahy disse ao Brazil Journal.
Além de pacificar os pontos de conflito, os dois sócios concordaram em montar um board mais atuante no dia a dia da empresa.
Parente, cujo contrato previa a possibilidade de uma saída antecipada, será substituído como chairman por Nicola Calicchio, o ex-CEO da McKinsey no Brasil e hoje chairman da Cimed, vice chairman da MRV&Co e conselheiro da Hapvida.
O board da Azzas 2154 também será reduzido de 9 para 7. Anna Chaia, que presidia o comitê de estratégia; e José Bologna, que liderava o comitê de pessoas, estão deixando o conselho, mas continuarão como consultores da companhia.
Outra conselheira, Sylvia Leão – conhecida por sua expertise em recursos humanos – passará a liderar o comitê de pessoas; Nicola, o de estratégia.
Na entrevista, o novo chairman refletiu sobre o turbilhão que acaba de terminar – e o futuro da companhia.
“Nessa nova fase, a governança vai deixar de ser o principal elemento e vamos voltar nossa energia para o mercado,” disse Nicola. “Acompanhei inúmeras fusões e o problema sempre é esse. As pessoas se voltam pra dentro, deixam de focar a energia no negócio e focam no ‘o que vai acontecer comigo?’, uma guerra de poder. É normal… É a natureza humana. Isso demora um tempo mesmo. Mas graças a Deus, em um ano [a Azzas] já passou por essa fase.”