No primeiro trimestre reportado pela nova gestão da empresa, a CVC disse que aumentou suas vendas B2C e seu ‘take rate’ — no que o CEO Fabio Godinho disse ser um “reflexo direto” das medidas adotadas nos últimos cinco meses.
Segundo a companhia, as reservas confirmadas do B2C subiram 10% no trimestre para R$ 1,3 bilhão, enquanto o take rate dessa vertical subiu de 11,1% para 14,7%.
No B2B, houve uma queda no volume de vendas, com as reservas confirmadas caindo 7%, mas o take rate também subiu, de 5,8% para 6,1%.
No consolidado da empresa, as reservas confirmadas caíram 4,3% na comparação anual, prejudicadas também por uma queda nas reservas da Argentina, mas o take rate foi de 8% para 9,6%.
Godinho disse ao Brazil Journal que a alta no B2C teve a ver com uma melhora do ‘same-store sales’ das lojas físicas, impulsionada por uma mudança de mix — com a venda de produtos mais competitivos e com margens maiores.
Já a retração no B2B foi um efeito do descontinuamento da venda de passagens para as empresas de milhas (como Maxmilhas e Hot Milhas), bem como do cancelamento de alguns contratos que tinham um take rate muito baixo.
“Na Rexturadvance tínhamos diversos clientes operando com take rate abaixo de 3%, 2%,” disse o CEO. “Sentamos com esses clientes para renegociar as condições. Quem não topou, cancelamos.”
Segundo ele, esse efeito — de queda de volume e melhora do take rate do B2B — deve continuar nos próximos trimestres.
A melhora do take rate da companhia levou a um aumento do EBITDA e uma melhora no bottom line.
O EBITDA ajustado — que exclui o impairment de um ágio da aquisição da Submarino — foi de R$ 96,7 milhões, uma alta de 36%. Esse impairment gerou despesas não-recorrentes e sem efeito-caixa de R$ 77 milhões no trimestre.
O lucro líquido ajustado — que além do impairment do ágio exclui a marcação a mercado dos bônus de subscrição que a empresa emitiu no follow-on, e a baixa de um imposto diferido — foi de R$ 36,3 milhões. Sem esses ajustes, a CVC teria dado um prejuízo líquido de R$ 87 milhões, 16% superior ao mesmo período do ano anterior.
Godinho disse que o resultado reflete as medidas que a nova gestão tomou desde que assumiu o comando há cinco meses. O CEO foi indicado ao cargo por Guilherme Paulus, o fundador da CVC que voltou ao cap table da companhia no follow-on de junho, quando a operadora de turismo levantou R$ 550 milhões, dos quais R$ 100 milhões vieram de Paulus.
O executivo — um veterano da CVC que já foi diretor de novos negócios e vp de produtos, marketing e operações — disse que focou em quatro ‘layers de ajuste’ nos últimos meses.
O primeiro é a governança. Na AGE de agosto, Paulus colocou no board seu filho Gustavo e Felipe Gomes, o CFO da Mar, seu family office. O Opportunity manteve seus dois representantes, e o Pátria, um. Há ainda dois membros independentes.
A CVC também mudou a estratégia, voltando a focar em produtos exclusivos como voos fretados, negociações exclusivas com hotéis, circuitos fechados, cruzeiros e roteiros na Europa — produtos nos quais a empresa apostou muito no passado, mas que deixaram de ser o foco a partir de 2020.
Para Godinho, esse mix de produtos garante uma margem maior e tem um diferencial competitivo, já que o consumidor só vai encontrar essas condições e pacotes na CVC.
A empresa também está apostando numa estratégia phygital, com marketing online e offline; novas formas de financiamento para o consumidor (para além do cartão de crédito); e no crescimento das lojas físicas.
Desde 2019, a CVC fechou mais de 350 lojas, em grande parte por conta da pandemia. O objetivo de Godinho é abrir esse mesmo número de lojas nos próximos anos, com foco em cidades do interior.
“Nas capitais já temos uma penetração grande, e é fora das capitais onde o PIB cresce,” disse o CEO. “Queremos buscar um cliente que o nosso fornecedor não consegue fazer na venda direta. Vamos buscar esse cliente em Sorriso, no Mato Grosso, em Niquelândia, em Goiás, cidades onde estamos abrindo lojas agora.”
Para turbinar esse crescimento, a CVC cortou pela metade o investimento mínimo de um franqueado para a abertura de uma loja, saindo de R$ 150 mil para R$ 75 mil. Segundo Godinho, isso foi feito apenas com a mudança de fornecedores, para empresas mais regionais, e dos materiais usados nas lojas, sem mudar o layout e a metragem.
O terceiro ‘layer de ajuste’ é o time. Além das mudanças no C-Level, com a entrada de Godinho e do CFO Carlos Wollenweber, a CVC mudou todos os dez diretores, trazendo de volta muitos nomes que já tinham trabalhado com Paulus no passado.
Outra mudança nessa frente foi voltar ao regime presencial. Desde a pandemia, 100% dos funcionários da CVC estavam em home office. A companhia manteve um terço do time nesse regime, mas obrigou os dois terços restantes a voltar a bater ponto no escritório.
“A CVC sempre foi uma máquina de execução, uma fábrica de férias, de viagens. E uma fábrica não tem como funcionar 100% home office,” disse ele.
Godinho também separou a gestão das três unidades do B2B — Visual, Rexturadvance e Trend — que tinham sido unificadas na gestão passada. A Visual é focada na venda de pacotes de luxo; a Rexturadvance, na venda de bilhetes aéreos para agências PMEs do segmento corporativo; e a Trend faz a mesma coisa que a Rextur, mas no segmento de hospedagem.
“O que esses três negócios vendem é muito diferente, então não dá para ter um front único. O backoffice sim, dá para unificar, mas o front não!” disse Godinho.
Para ele, esse foi o motivo da CVC ter perdido tanto market share nesses segmentos nos últimos anos. “O turismo é feito de especialistas. É isso que garante a qualidade no atendimento. Imagina se um agente de viagem está com dificuldade com um bilhete e vai ligar para um atendente generalista… ele não vai conseguir resolver o problema.”
Por fim, a quarta frente de ajustes foi nos custos. O CEO disse que já reduziu o SG&A da empresa em 22% no primeiro mês e que isso não gerou “impacto nenhum no operacional.”
Segundo ele, ainda há mais oportunidades de otimização de custos que podem ser capturadas no ano que vem. “Tinha tanto mato alto que esse primeiro corte foi fácil de fazer, mas tem outras coisas que necessitam de uma mudança nos sistemas e processos.”
Depois de uma pandemia que devastou o turismo mundial, a gestão anterior, do CEO Leonel Andrade, esteve mais focada na sobrevivência da companhia, direcionando seus esforços para a reestruturação da dívida, que era grande e tinha vencimentos próximos. Hoje, a dívida bruta está em cerca de R$ 750 milhões e a empresa tem mais de R$ 200 mi em caixa.
Godinho também deixou claro que a companhia não tem planos de investir mais no modelo de OTA (online travel agency), no qual entrou com a compra do Submarino em 2015.
O Submarino não vai deixar de existir, mas a plataforma vai ser redirecionada para vender os produtos exclusivos da CVC, e não mais para vender hotéis e passagens individuais, competindo com seus fornecedores.
“A companhia aérea e os hotéis enxergam muito overlap entre o consumidor que compra nessas OTAs e o que compra direto com eles. Não quero competir com o meu parceiro. Quero criar um cliente novo para eles,” disse Godinho.
O shift estratégico da CVC vem depois que a empresa melhorou sua estrutura de capital com a renegociação de dívidas e alguns follow-ons. Além disso, o mercado de turismo passa por um bom momento, com dois grandes competidores (a 123 Milhas e Hurb) passando por dificuldades.
“Tem muitos ventos a nosso favor, no macro e no micro,” disse o CEO.