Comentários da Cielo sobre um Natal ‘bastante fraco’ e um crescimento de EBITDA perto de zero em 2017 derrubaram a ação da credenciadora de cartões ontem, em meio a um volume de negociação quase três vezes acima da média.
 
Os comentários — descritos num email de um analista do BTG Pactual para clientes do banco — mostram que a empresa está cautelosa com sua performance operacional este ano.
 
“No geral, eles estão mais ‘desanimados’ com o operacional para 2017 dado que o Natal foi bastante fraco, o que pode ser um indicativo de que o varejo pode levar um tempo maior para se recuperar,” o analista, Eduardo Rosman, escreveu para clientes.
 
Segundo gestores, o email começou a circular entre alguns clientes do banco na segunda-feira à tarde, sem aparente impacto no preço da ação.  Mas na terça-feira, quando o papel abriu em queda e com volume forte, o BTG disseminou o email mais amplamente.  No final do dia, a Cielo fechou em queda de 3,3% com 16,4 milhões de ações negociadas, comparado a uma média de 6,2 milhões num dia normal.
 
Com o Governo pressionando pela redução dos juros no cartão de crédito — e o Banco Central estudando reduzir o prazo de 30 dias que as administradoras de cartão levam para pagar os lojistas — a Cielo tem sido o tipo de ação que investidores cardíacos devem evitar.
 
Ontem, gestores passaram o dia procurando informação sobre alguma novidade iminente na regulação do setor, mas, no final do pregão, parecia claro que a explicação mais plausível para a queda estava no ‘guidance‘ informal descrito no email do BTG.

 
No email, escrito logo depois de uma conversa com a companhia, Rosman disse que a Cielo estava com a ‘cabeça marginalmente mais negativa pra 2017,’ estimando um crescimento de EBITDA este ano ‘mais para zero do que 5%’, além de projetar um crescimento de lucro entre 5% e 7%.  A companhia também disse ao analista que o Natal foi ‘muito ruim’ e estima que perdeu participação de mercado no quatro trimestre.  O crescimento da receita no último trimestre do ano teria ficado ao redor de 3,5%, abaixo das expectativas.
 
Na parte mais construtiva do ‘guidance‘, a empresa disse que a redução do prazo de pagamento de 30 dias — objeto de estudo pelo BC — ‘voltou a ficar na geladeira’ e que, agora, ‘o foco de mudanças é a queda de juros no rotativo’.  Para a Cielo, se esta mudança não vier em 3-4 meses, a redução do prazo ‘poderia voltar a ser assunto’.
 
Como se sabe, o Banco Central e os bancos emissores de cartões chegaram a um acordo que muda a taxa de juros cobrada sobre o saldo não pago dos cartões.  Em vez de cobrar a taxa (mais punitiva) do crédito rotativo — que em alguns casos chega a 600% ao ano — os bancos passarão a aplicar a taxa de juros do crédito parcelado, diminuindo o comprometimento de renda das famílias.
 
Relatórios do Itaú e da Goldman — cujos analistas também falaram com a empresa — ajudaram a maximizar o volume do papel na queda. A Goldman notou que a Cielo hoje é a única empresa que processa transações da bandeira Elo, mas que isto está prestes a mudar. “Na medida em que outros acquirers passem a processar as transações da Elo, acreditamos que a Cielo vai perder market share gradualmente dentro da Elo, caindo do seu nível ‘natural’ de 40%.  Neste cenário, acreditamos que o faturamento líquido da Cielo caia de 6% a 8%.”
 
Finalmente, numa prova de que o market share tem que ser defendido todos os dias, a Rede, arquirrival da Cielo, anunciou esta manhã um acordo com a Linx ‘para o desenvolvimento de aplicativos relacionados a soluções de meio de pagamento, bem como o esforço [conjunto] para promover, juntos aos seus respectivos clientes, as soluções de pagamento da Rede e as soluções de gestão da Linx.
 
O estranho aqui é que não pensaram nisso antes.  Em outros países, é comum empresas de software distribuírem os produtos das credenciadoras.