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A importância crescente da flexibilidade não é por acaso.
O modelo de trabalho afeta não apenas a vida profissional, mas também a qualidade das relações fora do trabalho. Todas as gerações concordam que uma política 100% presencial tem um impacto negativo na felicidade e satisfação.
Esse é o diagnóstico da pesquisa inédita Tendências e Perspectivas do Trabalho – Report WeWork LatAm 2023, realizada pela WeWork— a líder global de espaços de trabalho flexíveis — em parceria com a Page Outsourcing e apoio de Reconnect e Exboss.
Os dados da pesquisa — elaborada com mais de 3.000 entrevistados no Brasil — revelam que 64% dos profissionais adotam um esquema híbrido, enquanto 18% trabalham presencialmente e outros 18%, remotamente.
Essa distribuição mostra uma mudança em relação aos dados da pesquisa anterior: o modelo 100% presencial aumentou de 10% em 2022 para 18% em 2023, assim como o número de profissionais 100% remotos, de 12% para 18%. Já no modelo híbrido, houve uma redução de 78% para 64%.
A quantidade de dias presenciais que compõem o modelo híbrido varia de acordo com a política de cada empresa, sendo que 64% das pessoas vão ao escritório de duas a três vezes por semana. Em seguida, vêm aqueles que trabalham presencialmente uma vez por semana (21%), quatro vezes (10%) e apenas 3% vão ao escritório cinco vezes na semana. Porém, os dados mostram que a grande maioria dos entrevistados gostariam de ir de um a dois dias, no máximo (63%).
“Embora pesquisas com colaboradores sejam comuns, a decisão sobre o modelo de trabalho, a quantidade de idas ao escritório e os dias específicos, no caso de esquemas híbridos, permanecem predominantemente nas mãos das empresas e líderes, que são responsáveis por 60% das determinações,” disse Bruna Neves, diretora-geral da WeWork Brasil. Cerca de 27% dos profissionais têm autonomia para decidir — o que é mais do que a média latino-americana de 18%.
Diante disso, as empresas seguem em busca do híbrido ideal, sem saber qual é.
Cerca de 55% dos entrevistados no modelo híbrido relataram ter experimentado mudanças nos requisitos de presença no escritório nos últimos seis meses. As empresas seguem promovendo experiências e tentando atender os conflitos entre as expectativas da corporação e dos colaboradores.
Epidemia de insatisfação
A pesquisa mostra ainda que existe uma epidemia de frustração corporativa, tanto no nível macro latino-americano como no recorte brasileiro.
A principal fonte do descontentamento é a falta de flexibilidade nas políticas de trabalho impostas pelas organizações. Pela primeira vez no contexto empresarial, a flexibilidade não é mais apenas um modelo híbrido (combinado de dias de trabalho presencial e remoto), mas também envolve jornadas flexíveis e participação na definição das políticas de trabalho.
A insatisfação com o trabalho é uma realidade para 55% dos profissionais brasileiros. Entre os três principais motivos identificados por eles estão:
- Falta de flexibilidade (25%);
- Salário (14%);
- Falta de processos (11%).
Na hora de avaliar uma proposta de emprego, 87% das pessoas consideram a modalidade de trabalho e 88% a flexibilidade de horários. O salário continua sendo o fator de maior relevância na tomada de decisão (94%), mas muito próximo do segundo fator. Em uma visão geral, o salário é o item mais relevante para as pessoas, mas os outros critérios têm mudado nos últimos anos.
Qualidade de vida
“Após a pandemia, as nossas prioridades se deslocaram e o trabalho deixou de ser o único, ou o principal, foco de nossas existências. Para 68% dos entrevistados, a pandemia fez com que eles valorizem mais o bem-estar e a qualidade de vida,” disse Bruna Neves, diretora-geral Brasil.
O professor e pesquisador Alexandre Pellaes, especialista em novos modelos de gestão e estudos sobre o significado do trabalho alerta: “Isso não quer dizer que as pessoas não querem mais trabalhar, como ouvimos por aí. Isso significa que as pessoas não querem trabalhar mais — e essa é uma outra conversa. É sobre trabalhar melhor.”
Nas entrevistas qualitativas, quando questionados sobre quais benefícios são inegociáveis, a grande maioria dos entrevistados respondeu flexibilidade/modelo de trabalho híbrido ou remoto (46%), muito à frente de plano de saúde (24%) e vale-alimentação ou refeição (19%). Bruna complementa: “é incrível observar que a flexibilidade já é mais lembrada que o plano de saúde para o trabalhador do mundo contemporâneo a tal ponto que 81% das pessoas gostariam de ter ou já possuem um um benefício destinado à flexibilidade.”
Desafios do RH
Para atender as necessidades das empresas e as expectativas das lideranças e dos subordinados, os profissionais de Recursos Humanos enfrentam diversos desafios. Segundo eles, os maiores são:
- 48% insatisfação em relação ao modelo de trabalho imposto pela empresa;
- 48% disseminação da cultura;
- 31% aumento nos gastos com retenção e lealdade das equipes nos últimos dois anos.
“Um desafio inédito é atender as políticas de trabalho exigidas pelos profissionais já no processo de candidatura, uma vez que eles chegam buscando modelos de trabalho específicos,” diz Bruna Neves. “A tensão entre expectativa e realidade se torna cada vez mais forte, já que a base da pirâmide ganhou força e não aceita mais decisões unilaterais das empresas. No final do dia, são os profissionais de RH que fazem o trabalho diplomático de conciliar expectativas não apenas dos candidatos perante as empresas, como vice-versa.”
“Ao perceberem que muitos profissionais estão abertos a oportunidades mesmo estando empregados, as empresas vêm tomando medidas para se adaptar e ter sucesso, como investir no desenvolvimento e na progressão de carreira de seus colaboradores atuais,” diz Lucas Toledo, diretor-executivo do PageGroup. “Um diferencial para a área de RH é estar preparada para atuar em temas concretos e, principalmente, desenvolver a escuta ativa, a fim de entender o que mais importa para as lideranças e funcionários, e se adequar conforme a realidade de cada empresa.”
O pesquisador Alexandre Pellaes também reforça a importância da comunicação e busca por alinhamento em um momento no qual as pessoas tendem a converter suas preferências individuais em exigências organizacionais, colocando o RH no meio de um cabo de guerra: “É importante o RH não se fixar na ilusão de atender a todas as demandas individuais de líderes e liderados. No convívio social, é necessário negociar limites e parâmetros para o bem comum e cuidar dos excessos. Tem gente por aí defendendo apenas a sua fatia do bolo.”
Produtividade não está somente no escritório
Desde a pesquisa anterior da WeWork, já era observado a transformação na percepção dos profissionais, que agora enxergam os escritórios como espaços de conexão.
Entre os principais objetivos para ir ao escritório citados na pesquisa atual, estão integração de equipes e relacionamentos interpessoais (48%); obrigatoriedade (29%); aumento na produtividade (12%) e 7% pela infraestrutura. Além desses tópicos, outros foram citados nas entrevistas de aprofundamento, são eles: resolução ágil de problemas, eficiência na tomada de decisões, comunicação e contato pessoal e networking.
Diversidade geográfica e de perfis
Quase 63% dos entrevistados consideram que a flexibilidade é altamente favorável para promover a diversidade nas equipes de trabalho. Se antes os candidatos ficavam restritos a grandes centros urbanos ou às cidades onde a empresa se localiza, hoje a fronteira geográfica já não é mais fator que elimine os candidatos em caso da possibilidade de estarem remotos.
Pessoas com filhos também declaram o impacto positivo do modelo híbrido: 58% dos respondentes com filhos preferem esse esquema de trabalho e 54% gostariam de ir ao escritório, no máximo, duas vezes por semana. A satisfação e felicidade no trabalho desses pais e cuidadores é de 72% e o efeito positivo na saúde mental é de 70%.
“O híbrido gera mais oportunidades para pessoas que são mães e para quem mora em outras regiões fora das grandes capitais,” diz Bruna Neves.
Saúde mental e o burnout
Outro ponto importante que afeta diretamente a produtividade é a saúde mental do colaborador. Com o tema no centro das conversas hoje, com índices de absenteísmo por conta de síndrome de burnout aumentando e níveis de depressão alarmantes, falar em felicidade é muito mais estratégico do que parece.
Dentre os entrevistados, 77% consideram que o modelo de trabalho impacta a saúde mental. Nesse recorte, 85% das pessoas que trabalham no modelo remoto avaliam o impacto como positivo, 66% consideram positivo o efeito do esquema híbrido, e 37% avaliam positivamente o impacto do presencial.
Semana de quatro dias
Projetos-pilotos recentes para estudar a semana de quatro dias de trabalho em diferentes países, incluindo o Brasil, continuam sendo temas de destaque no mercado de trabalho.
Frente a 83% dos colaboradores que gostariam de trabalhar quatro dias na semana, há 17% que têm preocupações, como a dependência da presença física em algumas posições, como as comerciais, e a distribuição da carga de trabalho.
Aproximadamente, 77% das pessoas acreditam que seriam mais produtivas em um esquema de quatro dias de trabalho. Quando questionados sobre o que fariam com um dia extra, as principais respostas foram organizar a casa, descansar e relaxar, estudar/se capacitar, realizar atividades com a família, viajar e fazer trâmites burocráticos e pessoais.
“A semana de quatro dias se apresenta como uma das tendências mais discutidas atualmente, mas ainda está sendo testada a nível global. Trata-se, sobretudo, de mudança de mentalidade, com melhora de eficiência e em processos. Estamos vivendo um período com transformações em uma velocidade sem precedentes, o que tem causado muito temor aos gestores. Essa insegurança é natural, uma vez que estamos em contato com mudanças de comportamento para as quais não fomos preparados. Com base em dados, como os das nossas pesquisas, é possível tomar decisões mais acertadas em direção a um equilíbrio sustentável entre as necessidades por colaboração, produtividade e lucro de uma empresa e a busca por qualidade de vida, bem-estar e a reordenação de prioridades na vida dos colaboradores,” conclui Bruna Neves.