Duas estratégias e R$ 1 bilhão em jogo
Sempre que dois gigantes se sentam à mesa para discutir um negócio de R$ 1 bilhão, a pergunta que se impõe é: qual dos dois está fazendo um mau negócio?
De um lado, o vendedor: a BR Properties, a maior companhia aberta de investimento em imóveis comerciais do Brasil, com um time de executivos com um histórico de criar riqueza para os acionistas comprando e vendendo imóveis.
De outro, o comprador: o empresário Michael Klein, cuja família é sinônimo de saber comprar e vender bem desde que o pai, Samuel, fugiu com bravura de um campo de concentração e fundou um dos maiores impérios de varejo do Brasil, as Casas Bahia.
No centro da conversa: 28 lojas alugadas à C&A, a um preço estimado em R$1 bilhão pela revista Dinheiro, que noticiou as conversas com exclusividade.
Sem conhecer os detalhes da operação, é impossível saber se alguém está fazendo um mau negócio, mas considerando que os dois lados partem de visões estratégicas diferentes, com motivações e horizontes de tempo distintos, é possível que ambos saiam ganhando do negócio.
Para a BR Properties, a transação mostra uma companhia interessada em focar ainda mais na sua principal atividade — prédios de escritórios — e fortalecer sua liquidez num momento em que o mercado imobiliário continua a dar sinais de exaustão.
Para Michael Klein, trocar parte de sua liquidez por ativos imobiliários pode ser uma forma de travar uma taxa de retorno com baixo risco comercial (dada a qualidade do locatário), e esperar a valorização dos imóveis num horizonte mais longo.
Klein, cujo patrimônio pessoal é avaliado conservadoramente em cerca de R$ 10 bilhões, já é dono de uma das maiores holdings de propriedades imobiliárias do Brasil. Sua última transação relevante foi a compra da sede do Banco Santander em Nova Iorque, um prédio de 20 andares na Rua 53, pelo qual, estima-se, pagou R$ 200 milhões. Ele também tem comprado imóveis em cidades como Miami e Berlim, entre outras.
A negociação envolvendo as lojas fez as ações da BR Properties subirem esta semana.
A Dinheiro disse que as lojas têm uma receita de aluguel de R$ 100 milhões por ano. No entanto, VEJA Mercados apurou que o número parece superestimado.
“Lojas como C&A e Americanas geralmente pagam 2,5% de seu faturamento como custo de ocupação, e uma loja C&A vende de 700 a 800 reais por metro quadrado por mês”, diz Rubens Damiani, da PGC4, uma empresa de planejamento de shopping centers. Como as lojas alugadas à C&A totalizam 99 mil metros quadrados, o aluguel daria R$ 24 milhões/ano, um quarto do que foi reportado pela revista.
No mercado imobiliário, a percepção de risco de vacância é maior para prédios de escritórios do que para lojas. Por causa disso, no mundo todo, como regra geral, os imóveis alugados para o varejo conseguem um prêmio em relação a escritórios na hora da venda. Assim, faz todo sentido para a BR Properties vender as lojas e realocar o capital em prédios de escritórios, seu foco e área de expertise.
“A forma como eles vão recompor a carteira pode aumentar o valor da empresa”, diz uma fonte do setor.
No momento, o mais provável é que a empresa use os recursos para reduzir endividamento, recomprar ações e/ou pagar dividendos. Qualquer dos cenários deve ajudar o preço da ação e será comemorado por seus maiores acionistas: o BTG Pactual, com 24,5%, a Petros, com 10%, o fundo soberano GIC, com 6,5%. O BTG, em particular, tem pressionado a empresa a se desfazer de ativos para aumentar os pagamentos aos acionistas. Entre os vários investimentos do banco, a BR Properties parece ser o que mais tem dado certo.
As tratativas vem meses depois da BR Properties vender 34 galpões industriais e de logística por R$ 3,18 bilhões. O CADE aprovou a transação em 7 de maio, mas o negócio ainda não foi concluído.
“Em termos de preço, na margem, tudo depende de qual dos dois lados tem mais ansiedade, mas do ponto de vista estratégico, ambos podem sair ganhadores,” diz um empresário.
A família Klein teve dois grandes momentos em que monetizou o valor das Casas Bahia. O primeiro foi na venda do controle da empresa para o Grupo Pão de Açúcar. No ano passado, a família levantou mais de R$ 2 bilhões ao vender uma participação na Via Varejo, a holding que controla Casas Bahia e o Ponto Frio. Coletivamente, membros da família Klein ainda são donos de 27% da Via Varejo — uma posição societária avaliada em R$ 3 bilhões e que deve ser vendida ao longo do tempo — e de vários imóveis alugados para as Casas Bahia, incluindo centros de distribuição.