Há uma bolha nas ações de tecnologia?
Essa é a questão que Howard Marks, o respeitado fundador da Oaktree Capital, procura responder em seu mais recente memorando, cujo título já entrega o que vem pela frente: On bubble watch.
Os paralelos óbvios são com a bolha da internet, e Marks foi um dos que anteviu acertadamente que aquela estava prestes a estourar.
Há exatos 25 anos, escreve Marks, ele publicou um memo chamado bubble.com – “e o assunto era o comportamento irracional que na minha opinião havia nas ações de tech, internet e ecommerce.”
Como lembra Marks, um velho adágio de mercado diz que “estar muito à frente no tempo é o mesmo que estar errado,” mas o seu memo de 2000 acabou sendo certeiro e teve timing perfeito.
Fazendo a ressalva de que não investe em ações – sua especialidade é crédito – e também não se considera especialista em companhias de tecnologia, o investidor faz uma longa análise sobre os possíveis sinais de que há uma nova bolha tech na praça.
(Marks não afirma com todas as letras, mas enumera uma série de argumentos que indicam que sim, há uma bolha no mercado). Ele não se prende a indicadores numéricos, muito pelo contrário.
“Para mim, uma bolha ou um crash são mais um estado de espírito do que um cálculo quantitativo,” afirma ele.
Mas como aferir esse “estado de espírito”?
Para Marks, algumas evidências são a “exuberância irracional” e a adoração de alguns papéis, o sentimento de FOMO – fear of missing out – e a convicção de que, para certas ações, nenhum preço é “alto demais.”
A avaliação, portanto, passa para o departamento da psicologia financeira, saindo do de análise fundamentalista.
Segundo Marks, fica difícil aceitar que existe um limite para o preço quando as pessoas se convencem de que não há nenhuma falha na tese de investimento e ficam aterrorizadas com a possibilidade de que os colegas de escritório ou parceiros de golfe terão aquela ação na carteira, e elas, não.
“Para identificar uma bolha, é possível olhar para os parâmetros de valuation, mas acredito há tempos que um diagnóstico psicológico seja mais efetivo,” escreve Marks.
“Sempre que ouço alguém dizer que ‘nenhum preço é alto demais’ e algumas de suas variantes – um investidor mais disciplinado poderá dizer, ‘é claro que existe um preço alto demais, mas não chegamos lá ainda’ – eu considero como um sinal certeiro de que uma olha está se formando.”
As bolhas são marcadas por ‘pensamento de bolha,’ segundo Marks, quando as pessoas perdem a objetividade e veem o mundo de maneira enviesada – e isso vale para euforias e crashes.
Ele recorda ter visto nos anos 1970, no começo da carreira, o estouro da bolha das Nifty Fifty, o grupo de ações large cap que eram consideradas sólidas e deviam fazer parte de todas as carteiras. Do episódio, extraiu três lições básicas:
“O que importa não é o que você compra, mas a que preço.”
“Investir bem não é investir em coisas boas, mas saber comprar.”
“Não existe nenhum ativo que seja tão bom a ponto de não ser caro – e portanto, perigoso – e são poucos os ativos tão ruins que nunca serão baratos o suficiente para serem uma pechincha.”
Segundo Marks, sempre haverá um grão de verdade nas teses subjacentes às manias e bolhas – e quando algo está no pedestal da popularidade, o risco de queda é enorme.
As favoritas do momento são as Magnificent Seven, as sete grandes da tecnologia, que, sozinhas, já respondem por um terço da capitalização do S&P 500 – uma concentração jamais vista.
O investidor diz que, entre as Mag Seven, a mais sexy é a Nvidia, a líder no desenvolvimento de chips de inteligência artificial, cujo múltiplo está acima de 30x.
Embora não se concentre em análises quantitativas, Marks lembra que o múltiplo histórico do S&P500 no pós-Segunda Guerra é de 16x o lucro projetado – o que quer dizer que você está pagando por 16 anos de lucros, e na realidade é mais do que isso, observa o investidor, por causa da taxa de desconto.
O que um múltiplo de 30x indica? Três coisas, argumenta Marks: os investidores acreditam que a Nvidia estará no negócio por décadas; os lucros dela vão crescer nessas décadas; ela não será superada pelos competidores.
“Em outras palavras, os investidores estão assumindo que a Nvidia vai demonstrar persistência,” diz Marks. “Mas persistência não é algo fácil de ser atingido, especialmente em high-tech.”
O investidor observa que apenas metade das Nifty Fifty continuam no S&P500 até hoje, e algumas hoje são uma sombra do que já foram: Xerox, Kodak, Polaroid e Avon.
“Nas bolhas, investidores tratam as companhias líderes como se elas fossem continuar na liderança para sempre,” escreve Marks.
A psicologia de manada também amplifica os tombos.
Depois do estouro da bolha da internet, o S&P caiu em 2000, 2001 e 2002 – a primeira sequência de três anos seguidos de recuo desde a Grande Depressão.
“Como consequência, os investidores desertaram em massa, e o S&P500 teve um retorno acumulado de zero entre 2000 e 2011,” diz Marks.
Desta vez será diferente?
O investidor nota que é raríssimo o S&P500 subir mais de 20% em dois anos seguidos, como foi na alta de 26% em 2023 e de 25% em 2024. Historicamente, comprar um papel com múltiplo esticado significa quase sempre retornos baixos adiante.
“Não deveria ser surpresa que o retorno de um investimento é em grande parte uma função do preço pago por ele,” diz Marks. “Por essa razão, os investidores claramente não deveriam ficar indiferentes ao atual valuation do mercado.”
Sobre o Bitcoin, Marks faz um breve comentário: embora não seja uma ação – e a despeito de seus méritos – a valorização de 456% em dois anos “não sugere excesso de cautela.”
O investidor conclui dizendo que não pode afirmar categoricamente se estamos em uma bolha ou não.
“Apenas gostaria de expor os fatos como os vejo e sugerir como vocês deveriam pensar a respeito,” escreve Marks. “Da mesma maneira que fiz 25 anos atrás.”