Anderson Birman, o gênio empresarial que transformou uma fabriqueta de garagem num império de marcas aspiracionais, está passando seu legado aos filhos numa das sucessões mais suaves e planejadas do Brasil corporativo.
A Arezzo&Co anunciou hoje que Anderson está doando a maior parte de suas ações aos filhos: Alexandre, Patricia, Allan, André e Augusto.
Alexandre, que foi preparado para assumir a liderança desde a adolescência e há 10 anos é o CEO da empresa, está recebendo 9,7 milhões de ações; seus irmãos (três deles do segundo casamento de Anderson) estão recebendo 4,11 milhões de ações cada.
Somado ao equity que Alexandre já possui na companhia, o CEO passa a ter 24 milhões de ações, ou 22% do capital da holding dona das marcas Anacapri, Schutz, Reserva, Fiever, Alexandre Birman, Carol Bassi e Arezzo.
Anderson está mantendo o usufruto e os direitos políticos sobre a maior parte das ações doadas, bem como 4,5 milhões de ações que ficaram fora da doação.
Conjuntamente, os Birman têm cerca de 41% do capital da companhia, que vale R$ 7,2 bilhões na Bolsa.
Os irmãos Birman já assinaram um acordo regulando seu relacionamento como acionistas e o exercício do voto quando o usufruto acabar.
A decisão de efetivar a transição patrimonial em vida – delicada para qualquer família – é consistente com o histórico de Anderson, cuja obsessão com a perenidade da Arezzo&Co se materializou no lema “Rumo a 2154”, uma alusão tanto ao olhar de longo prazo quanto ao ano de seu nascimento.
Hoje com 69 anos, Anderson nasceu em Manhuaçu, no interior de Minas, e se mudou para Belo Horizonte aos 14 anos quando o pai, um funcionário do DNER, foi transferido para a capital.
O menino não tinha medo do trabalho.
No interior, ainda com 10 anos já vendia ovos na rua; aos 14, era representante comercial de uma empresa de dedetização; em seguida, ganhou dinheiro como sacoleiro. (Seu tio, que morava no Rio, lhe apresentou uma loja de moda, e Anderson passou a comprar e revender roupas para os amigos de BH.)
Aos 18, junto com seu irmão Jefferson, o adolescente montou a Arezzo na garagem da casa de seu pai – a mesma onde mais tarde nasceu Alexandre.
A história do filho mostra que o bichinho do empreendedorismo talvez seja genético.
Depois de fazer cursos no exterior – incluindo um curso técnico de modelagem de calçados na Itália – Alexandre começou a bater ponto na fábrica da família aos 16 anos.
Em 1993, depois de dois anos trabalhando ao lado do filho, Anderson contratou o consultor João Bosco Lodi, à época um papa em empresas familiares, para encaminhar o rapaz na vida, mas declarou a um jornal: “Não se fabrica uma sucessão. Estou preparando meu filho para a vida. Não existe trono para a incompetência.”
Depois de alguns meses avaliando Alexandre, Lodi sugeriu que o moleque canalizasse seu espírito empreendedor para começar seu próprio negócio. Pouco tempo depois, em meados de 1995, Alexandre criou a marca Schutz com o apoio e a mentoria do pai. Tinha 18 anos.
A empresa permaneceu independente até 2007, quando, por sugestão de outro especialista – José Ernesto Bolonha, amigo de Anderson e hoje vice chairman da companhia – a Schutz se fundiu com a Arezzo dando origem à Arezzo&Co.
Em 2012, um ano após o IPO, Anderson começou a pensar na passagem do bastão e trouxe John Davis, do Cambridge Family Enterprise Group, que assessora famílias buscando perpetuar seu legado e profissionalizar suas empresas.
Anderson foi chairman da Arezzo&Co do IPO até 2016, quando cedeu o posto a Alessandro Carlucci, o ex-CEO da Natura&Co.
O BMA Advogados assessorou os Birman no acordo de acionistas. Alessandra Rugai Bastos, do Guimarães Bastos, e Luiz Octávio Lopes, do Lefosse, também trabalharam com a família.
Na foto no topo da página, a primeira fábrica dos Birman em Belo Horizonte.
Na foto ao pé, Anderson fala a um jornal sobre o início da sucessão familiar, em 1993.