As ações da Ambev estão negociando hoje a múltiplos de lucro bem menores do que anos atrás.
Em 2012, os investidores aceitavam pagar quase 25 vezes o lucro da empresa na hora de comprar a ação. Hoje, pagam “apenas” 19 vezes.
Há vários motivos para isso: a economia, que cresce cada vez menos, a perspectiva de aumento no imposto sobre bebidas e, agora, o medo dos investidores de que a empresa possa fazer um mau negócio em breve.
Tudo indica que a controladora da Ambev, a Anheuser-Busch InBev (ABI), está se preparando para comprar sua maior concorrente, a SABMiller, numa mega transação que pode chegar a 250 bilhões de reais.
Para viabilizar esta compra, os investidores temem que a ABI force a Ambev a comprar as operações da SABMiller na América Latina — que incluem a Colômbia, o Peru e outros mercados menores — e pagar caro por isso.
Como o preço das ações da Ambev hoje embute este medo, alguns investidores começaram a fazer as contas — e estão voltando a comprar a ação.
O que eles estão vendo que os outros não estão?
De acordo com um destes investidores, se a Ambev pagasse pela SAB-América Latina 15 vezes a geração de caixa da empresa na região (EBITDA) — um múltiplo comum em transações gigantes com ágio — a Ambev teria que desembolsar 80 bilhões de reais. Isso equivaleria a mais ou menos um terço do valor de mercado atual da Ambev (250 bilhões de reais).
A Ambev teria que tomar dívida para pagar esta aquisição, mas mesmo 80 bilhões sendo um número gigantesco, a dívida total da Ambev ficaria em apenas 2,66 vezes sua geração de caixa, uma dívida perfeitamente administrável para uma empresa que gera quase 14 bilhões de reais em caixa livre por ano.
“Seria um preço justo, e a Ambev estaria crescendo quase 30% de uma só tacada,” diz um investidor que começou a comprar a ação. Caso a aquisição ocorra neste preço, ele acredita que as ações da Ambev poderiam facilmente subir 30% a partir dos níveis atuais.
Se, no entanto, o preço for mais salgado, o investidor estima que as ações da Ambev ainda podem cair mais 10% a partir dos níveis atuais. Obviamente, prever como o mercado reagiria num cenário desses é mais uma arte do que uma ciência, e há a possibilidade do mercado punir a empresa pela transação ‘injusta’ com uma queda maior.
Mas como na conta destes investidores o potencial de ganho com a compra da SAB-América Latina é três vezes maior do que o de perda, eles estão fazendo uma aposta (por enquanto pequena) para poder comprar mais quando a transação for anunciada.
“É possível que este medo ‘pré-anúncio’ acabe se provando uma oportunidade rara de comprar Ambev a preços modestos, mas muita gente não quer nem olhar o papel até ter todos os detalhes,” diz um outro gestor.
O mercado tem motivos para estar escaldado. Na fusão com a cervejaria belga Interbrew, a operação que criou a InBev em 2004, a Ambev teve que comprar (caro) a Labatt — a operação da Interbrew no Canadá — e a ação da Ambev despencou logo após o anúncio. Muitos investidores temem que algo parecido aconteça agora, enquanto outros acham que os controladores da ABI — Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, hoje aclamados por Warren Buffett como os melhores gestores do capitalismo global — jamais repetiriam a manobra.
Um analista com muita experiência de mercado diz que a ABI vai cobrar “o maior preço justificável possível” pela SAB-América Latina.
“A lição que os investidores deveriam tirar da experiência com a Labatt é a seguinte: tudo parece horrível e injusto no primeiro dia, mas depois a Ambev faz recompras de ação, paga dividendos, e os investidores ficam com amnésia. Tudo volta ao normal. E sabe por quê? Porque os maiores ganhadores de dinheiro de toda a ABI estão dentro da Ambev e a compensação deles é toda em cima das ações da empresa, então você não pode frustrar os seus melhores jogadores.”
“O preço vai parecer alto, mas no fim das contas, todo mundo vai ganhar, e qualquer investidor que achar a operação ruim e vender a ação a qualquer preço vai estar do lado errado desse negócio,” diz o analista.
Desde 2004, quando foi forçada a comprar a Labatt por um preço “injusto”, as ações da Ambev já se multiplicaram por sete, em dólar.