De um lado, estão os céticos e vendidos, apostando que as ações da Nvidia em breve terão uma correção brutal como outras empresas de tecnologia no passado.
De outro, estão os entusiastas e os comprados, que acreditam que a escalada na Nvidia rumo ao topo está apenas no começo. Alguns projetam até mesmo que ela poderá superar a Apple em valor de mercado.
Até o momento, os short sellers estão sangrando. O prejuízo apenas na última quinta-feira, com a marcação a mercado das posições vendidas, foi de US$ 826 milhões; no ano, passa de US$ 11 bilhões.
Em janeiro, o market cap da Nvidia era de “apenas” US$ 370 bilhões. Em sete meses, o valor mais que triplicou, com o mundo começando a compreender o impacto da inteligência artificial e o papel da Nvidia no jogo.
Agora a empresa já vale US$ 1,14 trilhão, quase uma Amazon (US$ 1,37 trilhão) e não muito distante da Alphabet (US$ 1,64 trilhão). A Apple permanece afastada no topo, com US$ 2,8 trilhões de market cap.
Segundo a Barron’s, a média do preço-alvo para a ação da Nvidia entre os analistas pesquisados pela FactSet é de US$ 574 – um upside potencial de 25% que colocaria seu market cap acima de US$ 1,4 trilhão.
Um dos analistas mais agressivos sobre o potencial da empresa é Chaim Siegel, da Elazar Advisors, uma firma de research especializada em tech que trabalha para hedge funds e family offices.
Siegel tem um preço-alvo de US$ 1.606, o que faria a Nvidia valer US$ 4 trilhões, algo nunca atingido por nenhuma empresa.
A Nvidia tem acumulado vendas e lucros surpreendentes por causa de seu domínio absoluto no fornecimento dos chips usados nos sistemas de inteligência artificial generativa, como o ChatGPT e o Bard.
A receita em sua divisão de data centers, na qual estão incluídas as vendas dos processadores, bateu em US$ 10,3 bilhões no segundo trimestre, mais que o dobro do trimestre anterior. Foi o destaque na apresentação de resultados na última semana, quando a empresa californiana reportou um faturamento de US$ 13,5 bilhões.
Depois de a Nvidia bater o consenso (de longe), a grande maioria dos analistas elevou o preço-alvo da ação. A companhia tem hoje as melhores soluções de hardware e de software para municiar os desenvolvedores de inteligência artificial dos modelos de linguagem de grande escala (LLMs), os sistemas capazes de interpretar dados e criar conteúdo original a partir deles.
“Uma nova era da computação começou,” o CEO e cofundador da Nvidia, Jensen Huang, disse na apresentação de resultados trimestrais, na quarta-feira. “As companhias de todo o mundo estão fazendo a transição de uma computação de uso geral para a computação acelerada e inteligência artificial generativa.”
A Nvidia se prepara há uma década para esse momento e mantém, pelo menos até agora, uma dianteira isolada nesse novo mercado.
Um marco na história da companhia foi o lançamento de seu inovador chip GeForce 256, em 1999, tido com a primeira unidade de processamento gráfico (GPU). O processador trouxe grande impacto na renderização de imagens. Mais tarde, as GPUs foram reconfiguradas para rodar sistemas de inteligência artificial. Sua arquitetura permite realizar atividades em paralelo, acelerando a capacidade computacional.
Os analistas da Goldman Sachs dizem que, embora existam alguns competidores emergindo, a Nvidia deve “manter seu status de padrão na indústria de computação acelerada no futuro próximo, levando em consideração sua barreira competitiva e a urgência com a qual os clientes estão desenvolvendo e entregando os modelos complexos de IA.”
A Goldman elevou seu preço-alvo para a ação de US$ 495 para US$ 605. O Itaú BBA foi de US$ 500 para US$ 600.
Para Thiago Kapulskis, o head de análise de global tech do Itaú, os processadores tradicionais não possuem poder computacional suficiente para atender às demandas de IA.
As GPUs da Nvidia têm sido a melhor resposta até agora, mas explorar o potencial delas depende do software necessário para o treinamento dos modelos – e aí a CUDA (Compute Unified Device Architecture), uma plataforma de desenvolvimento e treinamento de softwares, é um outro diferencial da Nvidia, interconectando programadores e desenvolvedores.
A Nvidia está no centro da transformação da IA, diz Kapulskis e o time do Itaú, com uma gama ampla de serviços e produtos. “Isso nos dá confiança para elevar as estimativas não apenas para este ano, mas para além de 2024.”
Kapulskis estima que a receita com data centers poderá chegar a US$ 78 bilhões até 2025.
O Bank of America ajustou o preço-alvo de US$ 450 para US$ 550, dizendo que vê muita dificuldade para a Nvidia ser alcançada pela concorrência. O maior risco neste momento, diz o BofA, são possíveis restrições de venda no mercado da China.
Outros analistas enxergam possíveis percalços adiante para a escala da Nvidia e a expansão da inteligência artificial.
Em primeiro lugar, existe um gargalo no acesso aos processadores, sobretudo das GPUs de última geração, as H100. O ChatGPT usa cerca de 10.000 dessas placas para rodar os seus modelos.
A Nvidia e a TSMC – que cuida da produção física dos processadores – estão trabalhando para resolver o gargalo, mas o acesso permanece restrito. Quando houver equilíbrio entre oferta e demanda, os recursos de inteligência artificial devem avançar mais rapidamente, porque hoje muitas startups e empresas menores não conseguem comprar os H100, cujo preço de tabela é US$ 10 mil.
Outro possível gargalo para o avanço da IA é a disponibilidade de energia elétrica.
Segundo a International Energy Agency, os data centers e sistemas de transmissão de dados perfazem algo entre 2% e 3% de toda a demanda por eletricidade – e o número deverá crescer no ritmo da expansão da IA.
Segundo a Bloomberg, só o processamento dos sistemas de IA do Google usa eletricidade suficiente para o consumo residencial de Atlanta, uma cidade de 500 mil habitantes.
Nada disso deverá impedir a marcha inexorável da inovação tecnológica – e a IA generativa é a revolução da vez.
Beth Kindig, CEO e analista de tech da gestora I/O Fund, foi uma das primeiras a antever, há cinco anos, o potencial de ascensão da Nvidia em razão dos avanços em IA.
Até então a empresa era reconhecida apenas pela qualidade de suas placas na renderização de imagens para games e animações em razão do desenvolvimento da inteligência artificial.
Beth cobre a empresa desde 2018. Naquele ano, ela publicou um relatório em que dizia que a “Nvidia já é a plataforma universal para o desenvolvimento de inteligência artificial, mas isso não ficará óbvio até que essa inovação se torne madura.”
Segundo ela, os desenvolvedores estavam programando os futuros aplicativos de inteligência artificial com a Nvidia porque ela oferecia soluções melhores, mais simples e flexíveis do que os outros fornecedores.
“Quando a inteligência artificial se tornar madura, vocês podem esperar que a receita com data center será o principal segmento no faturamento da Nvidia,” escreveu.
Anos depois, num artigo publicado na Forbes em agosto de 2021, Beth voltou à carga: “Aqui está a razão pela qual o valuation da Nvidia vai superar o da Apple em 5 anos.”
Na lógica de Beth, a Nvidia estaria próxima a ganhar “com a economia da inteligência artificial” que, segundo números apresentados por ela, será um mercado muito maior do que o da economia da internet móvel.
Naquela data, a Nvidia valia US$ 550 bilhões na Bolsa, contra US$ 2,5 trilhões da Apple.
Para Beth, os short sellers erram ao catalogar a Nvidia como uma bolha passageira do boom da inteligência artificial.
“A companhia tem o virtual monopólio (95% de participação) no mercado de data center de GPUs, que deverá ter um crescimento de 23% CAGR até 2030,” ela disse à Fox Business essa semana.