A N5X — uma startup criada pela B3 junto com o grupo alemão EEX — está tentando criar uma clearing no setor de energia, dando mais segurança às operações e aumentando a liquidez do mercado.

Hoje, quando um grande consumidor de energia fecha um contrato de compra com uma comercializadora ou geradora, a negociação é bilateral — sem nenhuma contraparte central que garanta que o contrato vai ser cumprido. 

Isso gera uma série de riscos — e explica em parte os problemas que algumas comercializadoras tiveram nos últimos anos, como a Gold Energia, que sofreu um default relevante no ano passado, e a Vega Energy, que quebrou em 2019.

07 29 Adriana Barbosa ok

O plano da N5X é mudar isso com a criação de uma clearing, que deve entrar em operação em 2027.  Hoje, a N5X opera como uma Bolsa de balcão, intermediando as negociações bilaterais do setor no mesmo modelo da BBCE — o player dominante e que tem 42 comercializadoras e geradoras como sócios.

No ano passado, a BBCE movimentou R$ 90 bilhões em 100 mil contratos. Já a N5X movimentou pouco menos de R$ 600 milhões desde que começou a operar, no final de 2023. 

Mas o movimento de se tornar a clearing do mercado de energia não vai ser fácil.

“É um projeto de longo prazo e complexo. Mas nossos acionistas e toda a liderança estão confiantes de que temos um plano extremamente robusto e assertivo para endereçar as dores do mercado,” a CEO Adriana Barbosa disse ao Brazil Journal

“Nossos sócios já tem um acordo de expectativa de investimento e sabem o quanto precisa para criar uma Bolsa do zero,” disse a CEO, que estima que só o capital regulatório mínimo seria de cerca de R$ 100 milhões. 

Adriana disse que a N5X deve pedir as licenças para a CVM e o Banco Central ainda este ano. Depois disto, ela estima que demore mais 18 meses para a companhia começar a operar como clearing

A executiva disse que a criação de uma contraparte central é fundamental no setor elétrico, dado que a energia é um dos ativos mais voláteis que existem (“só não bate o bitcoin”). 

“Quando se tem qualquer volatilidade considerável você cria um potencial cenário de estresse que pode gerar um risco de contraparte,” disse ela. 

Com a contraparte central, este risco praticamente desaparece, porque há a exigência do depósito de garantias para as operações e porque a Bolsa vai fazendo pequenos ajustes nos contratos conforme os preços vão mudando – evitando um ajuste maior no fim do contrato.  

Apesar dos benefícios, há uma resistência de alguns players do setor em relação à criação de uma clearing, por conta do aumento de custos que ela geraria nas operações. 

Um executivo de uma comercializadora disse ao Brazil Journal que acredita que o custo seria “proibitivo”, inviabilizando as operações. “Dada a volatilidade do setor, as garantias exigidas teriam que ser muito grandes. Acho que poucos players teriam interesse de fazer, ainda mais num momento em que o custo do capital está muito alto e em que é tão importante ter dinheiro em caixa,” disse ele, notando que essa opinião não é um consenso no setor. 

Esse executivo disse que uma transação na BBCE, por exemplo, custa hoje na casa de centavos de reais por MW/h. “Acho que se tivesse garantias e chamadas de margem, uma transação com uma clearing poderia custar dezenas de reais por MW/h. É um aumento substancial,” disse ele. “Tudo bem que é garantia, então é um custo provisório e o dinheiro fica rendendo, mas ainda assim é uma diferença grande.”

A CEO da N5X diz que não é bem assim. 

Segundo ela, a companhia está desenhando um modelo condizente com o que a B3 usa hoje. “Sabemos que estamos no Brasil, onde o custo de capital é alto. E sabemos da importância das garantias serem adequadas ao custo de capital do mercado brasileiro,” disse ela. 

Ela diz ainda que os players globais que operam no Brasil já estão familiarizados com o custo de clearing e com as garantias – já que esse é o modelo padrão nos mercados desenvolvidos – e que esses players veem com ótimos olhos a evolução do Brasil para esse formato.

“A contraparte central vai trazer liquidez para o mercado, porque outros players institucionais, como gestoras, vão poder operar esse mercado futuro, operando comprado ou vendido em contratos de energia, o que não acontece hoje,” disse ela.

Hoje, quando acontece um evento de default, todos os players revisam seus contratos de crédito com as contrapartes e fecham a torneira, reduzindo a liquidez — o que não aconteceria se existisse uma clearing, disse Adriana. “É melhor operar um mercado ilíquido ou um mercado líquido?” 

A N5X é uma joint venture do L4, o fundo de corporate venture capital da B3, com o grupo alemão EEX (European Energy Exchange), um gigante que opera em 20 países da Europa e Ásia e nos Estados Unidos, onde entrou recentemente com a aquisição da Nodal. 

Cada sócio tem 50% do capital e faz aportes esporádicos para bancar a operação. 

O payback do investimento é longo. Adriana disse que a expectativa é que demore no mínimo sete anos e meio para que o projeto comece a ter relevância no mercado.

“Mas o potencial é enorme. O Brasil é o sexto maior mercado consumidor de energia do mundo e podemos entrar em outros ativos também, como gás e produtos ambientais,” disse ela. “Tem várias alavancas muito promissoras.”