Na sexta-feira, 12 de julho, a Anheuser-Busch InBev (ABI) tinha uma má notícia para compartilhar.

O mercado de capitais não havia topado pagar o que a companhia queria por um pedaço de seu negócio na Ásia — uma subsidiária chamada Budweiser Brewing Company APAC, que comercializa as marcas da ABI na China, Índia, Austrália, Coréia do Sul e Vietnã.  

10089 ffa15928 519b 0039 1e5a f9640c8b3feaCom uma dívida de US$ 100 bilhões nas costas, a ABI queria levantar US$ 10 bilhões com o IPO da Ásia— acelerando a redução de sua dívida e podendo usar a ação da nova empresa listada como moeda para novas aquisições na própria Ásia.

Na sua seção de opinião, a Bloomberg chegou a manchetar: “Without an Asian IPO, it’s hard to get very excited about AB InBev.”   Reagindo ao fracasso do IPO, o papel da ABI caiu 3,5%.

Colocado em córner pelo mercado, o CEO Carlos Brito tirou um coelho da cartola.  Um coelho gordo.

Em apenas sete dias, a ABI virou o tabuleiro:  tirou a Austrália do pacote da Ásia e vendeu a operação naquele país para um investidor estratégico (a Asahi, do Japão) por US$ 11,3 bilhões.  

A Asahi sempre foi o plano B da companhia, e a existência da oferta explica porque a ABI estava confiante ao cancelar o IPO. (O chefe de M&A da companhia, Lucas Lira, está praticamente morando em Hong Kong há meses, preparando o IPO e, sabe-se agora, o Plano B.)

O mercado aplaudiu de pé — a ação subiu 5,5%— e alguns shorts cobriram sua posição. 

Num tempo em que a 3G é assolada por problemas de todos os lados, o feito da semana passada não foi nada pequeno — e mostra que a ABI pode estar deslocada pelas craft beer, mas não perdeu o ‘mojo’ no M&A, o principal vetor da própria história da empresa.

A Austrália foi vendida por 14,9 vezes o EVBITDA de 2018, mais do que o múltiplo de 13x que a SAB Miller pagou quando comprou o ativo em 2011.

O negócio australiano era o maior gerador de caixa dentro da Budweiser APAC, era a operação com maior margem (43%) mas também o negócio mais maduro.

A transação reduz a dívida líquida da ABI — que estava em 4,6 vezes sua geração de caixa ao fim de 2018 — para 3,8 vezes, diluindo o lucro por ação em apenas 2%. (A meta da empresa era chegar a 4x só no final do ano que vem.)

“Considerando que a ação da ABI negocia com um desconto de 20% em relação a seus pares [no múltiplo preço/lucro], acreditamos que o impacto da desalavancagem no múltiplo mais do que compensa esse nível de diluição, particularmente considerando que atingir uma alavancagem menor que 4x EBITDA é um divisor de águas para muitos investidores,”  disseram analistas do Credit Suisse.

Agora, a ABI pode voltar ao mercado com o IPO, mas a partir de uma posição negocial mais forte.  Se antes ela era vista como um ‘vendedor desesperado’,  agora Brito é o cara que já levantou US$ 11 bi e não está com pressa.

A ABI queria vender a Budweiser a um múltiplo entre 18 e 22 vezes o EBITDA de 2020.  Assumindo o meio da faixa (20x) e excluindo a Australia, a APAC valeria US$ 47 bilhões, segundo cálculos do Credit Suisse.

Para o banco, assumindo que a ABI venda 10% da empresa no IPO, isso desalavancaria seu balanço em mais 0,2x e faria o múltiplo dívida líquida/EBITDA do ano encostar em 3x no final de 2020. 

O problema é que o múltiplo almejado pela Budweiser APAC ainda parece alto.  Um múltiplo de 20x EBITDA implicaria um múltiplo preço-lucro de 35, o dobro do múltiplo da ABI — ainda que o negócio asiático, agora sem a Austrália e com um maior componente de China, seja a própria definição de ‘growth stock’. Caberá ao mercado dizer  se topa pagar por esse crescimento.

PS: Para o bem ou para o mal, a ABI vai ser notícia outra vez essa semana, quando reportar seus resultados do segundo trimestre na quinta-feira.