“Nós temos 53 deputados em Minas. Vocês enrolam com essa história da Cemig e nós não aprovamos o ajuste fiscal.”
Foi assim, segundo o relato sempre bem informado do Poder 360, que o deputado Fábio Ramalho ameaçou o Ministro do Planejamento, Dyogo de Oliveira, para que o BNDES libere rapidinho os bilhões de que a Cemig precisa para comprar de volta quatro usinas hidrelétricas.
Ramalho, do PMDB de Minas Gerais, não é qualquer deputado. O ex-prefeito de Malacacheta sempre foi visto em Brasília como um deputado assertivo. Mas hoje, como o primeiro vice-presidente da Câmara, parece que a expectativa de Poder subiu-lhe descomunalmente à cabeça. Pessoas que estiveram com o deputado nas últimas 48 horas descrevem um homem arrotando atitude, imbuído de uma postura ‘prendo e arrebento’ no assalto ao cofre do BNDES.
Fábio Ramalho não é o único deputado mineiro a brandir ideias do passado como se fossem bilhetes de loteria. Seu colega Marcus Pestana, do PSDB, disse outro dia que é a favor de privatizar a Eletrobras, desde que Furnas fique fora da jogada. “Furnas é um símbolo de Minas Gerais,” Pestana disse ao Valor.
E os dois deputados não estão sozinhos. O Senador Aécio Neves, que anda mais discreto que peito de freira, jogou o poder que ainda lhe resta para pedir a Temer a ‘ajuda’ do BNDES à Cemig.
Pobres estatais. Nunca andam com as próprias pernas, sempre no lombo do eleitor.
Furnas, que Aécio e Pestana defendem como ‘patrimônio do povo mineiro’, é um símbolo sim, mas de outras jogadas patrimoniais.
Até o queijo da serra da canastra sabe que a estatal é um playground dos políticos do Estado. Teve aquele lance do Aécio com o Dimas Toledo que o Lula narrou ao Delcídio… Teve aquele outro lance mês passado, quando o CEO de Furnas quase rodou para o Planalto satisfazer o presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), Rodrigo Pacheco — por pura coincidência, outro mineiro do PMDB. E — capo di tutti cappi? — a Lava Jato descobriu que Eduardo Cunha era o ‘detentor do feudo Furnas’.
Como se vê, a empresa é ‘do povo’, mas quem empreende são os outros.
Já a farinha política provem toda do mesmo saco.
Minas Gerais é governada por Fernando Pimentel, um petista, mas a preocupação caridosa com a Cemig aglutina um consórcio pluripartidário, quase ecumênico. Chega a ser comovente ver os políticos deixando se lado as diferenças partidárias para cuidar só do interesse do estado. Como se diz lá em Minas, ‘ô buniteza, sô!’
A gangue do pão de queijo quer a grana do BNDES — neste momento dramático do País, em que se corta do FIES à farmácia popular — para manter gorda e suculenta uma teta que só dá alegria a seus membros.
A Cemig quer recomprar quatro hidrelétricas cujo prazo de concessão expirou. A empresa escolheu não renovar aquelas concessões anteriormente para não ter que aceitar os termos da famigerada MP 579, editada pela ex-Presidente Dilma. Desde então, a Cemig tenta na Justiça manter as usinas, mas tem sofrido derrota atrás de derrota.
Se depender do mercado financeiro, onde o dinheiro (aí sim) tem dono, ninguém colocaria um tostão na Cemig, uma estatal que deve 4 vezes sua geração de caixa. Se tomar esse empréstimo do BNDES, o endividamento dobra.
Pelos últimos relatos, o BNDES está pensando em duas alternativas: uma é um empréstimo de R$ 8,7 bilhões (a juros camaradas, que ninguém é de ferro: só o traseiro do contribuinte). A outra é uma injeção de capital: o BNDES entraria como sócio da Cemig, que teria o dinheiro para comprar as usinas.
Ironicamente, o Governo precisa dos R$ 11 bilhões que o leilão deve gerar para cumprir sua meta de déficit de R$ 159 bilhões. Ou seja: o Tesouro recebe com uma mão, o BNDES empresta com a outra.
Michel Temer fará o que tem que fazer. Emprestar a grana para salvar o resto de sua agenda econômica — e de seu mandato.
O presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, também fará o que tem que fazer: atender o Presidente da República e continuar na plataforma que lhe mantem em evidência, ou renunciar e ser coerente com suas ideias liberais.
Já Aécio Neves, Fábio Ramalho e Marcus Pestana continuarão fazendo o que a maioria dos políticos sempre fez com você.