Desde a crise nos anos finais da ditadura, a produtividade da economia brasileira registra um desempenho instável, alternando períodos transitórios de avanço com fases de retração.

Como resultado, há 40 anos o País não sai do lugar. 

Entre os principais setores da economia, só a agropecuária vem obtendo ganhos mais significativos. Entre 1991 e 2022, o crescimento médio anual da produtividade dos trabalhadores da agropecuária foi de 5,4%. Já na indústria e nos serviços, praticamente não houve avanço: um aumento tímido de apenas 0,4% ao ano.

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Agora, com o bônus demográfico perto do fim, o aumento do PIB e do bem-estar da população dependerá ainda mais dos ganhos de produtividade. Se isso não acontecer, o Brasil continuará com desempenho medíocre, perdendo para outros países em desenvolvimento. 

Para iluminar este dilema, o livro O desafio da produtividade – Como tirar o Brasil da armadilha da renda média  (Lux; 356 páginas) traz análises abrangentes do desempenho recente, destrincha os números, analisa comparações internacionais e aponta possíveis caminhos para destravar o crescimento da economia brasileira.

O livro teve a contribuição de três dezenas de especialistas, e foi organizado pelos economistas José Ronaldo de Castro Souza Jr., professor do Ibmec, e Fabio Giambiagi, economista do BNDES. 

Segundo a chamada ‘teoria da convergência,’ os países em desenvolvimento deveriam crescer mais rapidamente que os países ricos. Isso porque eles poderiam se beneficiar do conhecimento e das tecnologias das nações avançadas, reduzindo a disparidade. 

Mas na prática, as coisas acabam não ocorrendo dessa maneira. Muitos países em desenvolvimento acabaram esbarrando em obstáculos que os aprisionam na ‘armadilha da renda média’ – e o Brasil é um exemplo clássico desse fenômeno. 

“Apesar de existir convergência global na adoção de novas tecnologias, há divergências na intensidade de uso delas, o que prejudica a dinâmica de difusão tecnológica nos países de renda média e renda baixa, sendo um importante canal condutor para as divergências de renda per capita entre as nações no longo prazo,” escrevem José Ronaldo Souza e Cristiano da Costa Silva. 

De acordo com os economistas, “problemas associados a questões regulatórias, bem como baixo nível de competitividade e força de trabalho menos escolarizada, são entraves comuns a economias em desenvolvimento, o que também contribui para a disparidade produtiva no ambiente global.” 

Nos trechos abaixo, de um dos capítulos do livro, João Maria de Oliveira e Marco Antônio Cavalcanti comentam como o nosso sistema tributário restringe o avanço da produtividade, debilitando investimentos e o crescimento potencial do País. 

É uma situação que poderá ser revertida, ao menos em parte, pela reforma que acaba de ser aprovada. 

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Os efeitos negativos da tributação sobre a produtividade, especialmente quando ela perde a sua caraterística de neutralidade [ou seja, cria distorções alocativas], se refletem em uma elevada sensibilidade do PIB à carga tributária. A perpetuação de uma elevada carga tributária numa economia em crescimento tende a prejudicar a eficiência alocativa, porque os recursos gerados pelas receitas tributárias são geralmente destinados ao consumo do governo e a gastos de natureza assistencial, em vez de investimentos produtivos. Nesse sentido, alguns estudos sugerem que o aumento da carga tributária de forma não-neutra em décadas recentes impactou negativamente o desempenho da economia brasileira.

Contudo, tão ou mais importante do que o nível da tributação é sua estrutura, pois diferentes tipos de tributos tendem a impactar de formas distintas a produtividade agregada e o crescimento econômico. A esse respeito, cabe notar que, em teoria, uma estrutura tributária baseada em impostos sobre consumo poderia ser benéfica em termos de crescimento, por ser neutra em relação à alocação intertemporal dos recursos (dado que não taxa a renda de juros, diferentemente do imposto sobre a renda).

Uma das distorções do sistema tributário brasileiro se refere à sua elevada complexidade, associada tanto à fragmentação do sistema, no qual diferentes tributos incidem sobre bases comuns, como à quantidade e à frequência de mudança das regras tributárias. A extensão desses problemas pode ser inferida a partir do número de normas tributárias editadas entre 1988 e 2018: 31.937 normas federais, 123.620 normas estaduais e 253.169 normas municipais – resultando em 1,29 novas normas por hora.

A complexidade do sistema tributário brasileiro se destaca em nível internacional. De acordo com o “Índice de complexidade dos negócios globais” (Global Business Complexity Index, elaborado pelo TMF Group), o Brasil é uma das três jurisdições do mundo mais complexas para a realização de negócios em uma amostra de 78 países, e um dos determinantes chave dessa elevada complexidade está associado justamente aos processos tributários. Segundo dados do Global MNC Tax Complexity Project, que mede a complexidade das regulações tributárias incidentes sobre empresas multinacionais, o sistema tributário brasileiro era, em 2016, o mais complexo do mundo em uma amostra de 100 países e, em 2020, continuava entre os 10 mais complexos de uma amostra de 60 países. 

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 Como consequência dessa complexidade, verifica-se custo elevado de conformidade com as obrigações tributárias para as empresas e famílias, bem como de controle para a administração tributária. Isso se traduz em alto grau de litigiosidade judicial. As ações judiciais de natureza tributária no Supremo Tribunal Federal (STF) com impacto fiscal possível para a União chegam a um valor total de R$ 812,4 bilhões, ao passo que as ações em trâmite no Supremo Tribunal de Justiça (STJ) representam um risco fiscal possível de R$ 80,4 bilhões.

Análises mais abrangentes, abarcando processos nas vias judicial e administrativa nos três níveis federativos, indicam valores de contencioso tributário total no país ainda mais significativos, atingindo mais de 70% do PIB, segundo estimativa referente a 2018. A insegurança jurídica associada a essa elevada litigiosidade gera significativo desincentivo às atividades produtivas e ao investimento, comprometendo o aumento da produtividade e o crescimento econômico em geral. 

 […] 

 A reforma tributária sobre o consumo promulgada vai ao encontro da diminuição das más alocações setoriais e regionais existentes, e as simulações mostram que, por conta disso, essa reforma deve gerar aumento do produto agregado no longo prazo. (…) A Emenda Constitucional 132/23 promove mudança estrutural em favor de setores com cadeia produtiva mais longa, com maior efeito multiplicador e maior produtividade.

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Autores dos artigos: Ana Sofia Signorelli, Antônio Marcos Guimarães, Antonio Marcos Ambrózio,  Bráulio Borges, Carlos Henrique Corseuil, Cristiano Da Costa Silva, Danielle  Machado; Fabiano  Pompermayer, Fernanda De Negri, Fernando De Holanda Barbosa, Fernando Camacho, Gabriel Fiuza de Bragança, João André Pereira, João Maria Oliveira, Luis Felipe de Oliveira, Marcelo Dolabella, Marco Antônio Cavalcanti; Maria Cristina Pinotti, Mauricio Reis; Mauricio Moreira; Miguel Foguel, Otávio Damaso, Paulo Henrique Vaz; Rafael Vasconcelos, Ricardo Martini, Ricardo Barboza, Sergio Margulis, Sergio Koyama e Tássia Cruz.