Com o novo Governo furando o teto de gastos em quase R$ 200 bilhões no ano que vem, uma das principais dúvidas no mercado é de onde Brasília vai tirar esse dinheiro.

Naturalmente, os holofotes têm recaído sobre os suspeitos de sempre: a taxação dos dividendos e o fim dos juros sobre capital próprio (JCP).

Para medir o impacto de uma medida como essa na Bolsa, o BTG Pactual fez um estudo com 140 empresas listadas em dois cenários distintos. 

O primeiro: 15% de imposto sobre dividendos, fim do JCP e nenhuma redução no imposto de renda das empresas. O segundo usa as mesmas premissas, mas com uma redução de 5 pontos percentuais no IR.

O BTG disse que fez a análise para 2023 e 2024, mas que acha “extremamente improvável” que uma medida dessas já tenha efeito em 2023 (já que para isso precisaria ser aprovada ainda este mês no Congresso). 

“As empresas que são grandes pagadoras de JCP, como os bancos e as companhias de  telecom, seriam as mais impactadas, com uma queda de 17% nos seus lucros de 2024 no pior cenário,” escreveu o analista Carlos Sequeira. 

No melhor cenário, com a redução de 5 pontos percentuais no IR, a queda no lucro dessas empresas seria de 10%. 

Outra empresa muito impactada, segundo o BTG, seria a Ambev, que também paga JCP com frequência para reduzir seu lucro tributável. 

“Assumindo que a companhia não mude sua estrutura de capital, o impacto negativo nos lucros de 2024 pode chegar a 23% no pior cenário e a 18% considerando a redução de 5 p.p. no IR.”

Outro setor que deve sofrer com as mudanças é o de utilities, um grande pagador de dividendos que, com a mudança, perderiam a atratividade frente à Selic. 

Por outro lado, as empresas que tipicamente não fazem uso do benefício fiscal do JCP – setores como varejo, alimentação e provedores regionais de internet – sairão ganhando se o JCP acabar e houver um corte na alíquota de IR. Nesse cenário, o BTG calcula que essas empresas poderão ter um aumento de 6% a 7% em seus lucros em 2024.

Outro efeito colateral do aumento na tributação seria as empresas começarem a priorizar mais os programas de recompra de ações em vez dos dividendos. 

“As ações adquiridas poderiam ser canceladas e o programa de recompra produziria virtualmente o mesmo efeito para os acionistas que os dividendos –  com a exceção de que alguns investidores, especialmente aquelas que buscam ‘bond-like stocks’, estão realmente atrás de distribuições em dinheiro,” escreveu Sequeira. 

As reduções de capital também poderiam ser uma opção, já que elas funcionam de forma semelhante aos dividendos mas sem taxação (ainda que o Governo possa começar a taxá-las também).

“Também podemos ver algumas companhias, que em alguns casos operam com o que pode ser considerado uma estrutura de capital ineficiente, alavancando mais seus balanços para se aproveitar de uma maior despesa financeira para reduzir seu lucro tributável.”

Para o Governo, o BTG calcula que a taxação dos dividendos e o fim do JCP pode gerar um aumento de receita de R$ 50 bilhões a R$ 65 bilhões em 2024, no cenário em que não há uma redução no IR. (O valor varia porque o montante distribuído pelas empresas provavelmente cairia com a tributação).

“É importante ressaltar que o aumento nas receitas não resolveria o descumprimento do teto de gastos e não abriria espaço para mais programas sociais, já que pela legislação atual isso só seria possível reduzindo despesas (pelo menos enquanto o teto de gastos estiver vigorando).”

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