Para descobrir se tem câncer de mama, as mulheres têm que passar por um rito padrão.
Primeiro, no exame clínico, o médico faz a palpação, avalia o aspecto físico da mama, cruza com informações da paciente (se é tabagista ou sedentária, por exemplo) e gera uma hipótese.
Quando há dúvida, ele pede uma mamografia – um exame ‘padrão ouro’ que é o pesadelo de dez entre dez mulheres (no exame de imagem, a máquina literalmente espreme a mama.)
Finalmente, quando o exame indica alguma suspeita, a paciente vai para a biópsia, o único exame que vai dizer com 100% de certeza se há câncer ou não.
“O grande problema é no exame clínico, porque o médico não tem nenhuma ferramenta para ajudar na tomada de decisão e, na dúvida, ele manda para a mamografia, muitas vezes sem necessidade,” Luis Renato Lui, o fundador da Linda Lifetech, disse ao Brazil Journal.
Segundo ele, cerca de 80% das mamografias dão negativo, e 80% das cidades não têm sequer um mamógrafo.
“Quando eu mando um paciente errado para a mamografia eu só pioro a situação, porque criamos um gargalo no sistema público que faz com que muitas mulheres que realmente têm câncer morram nas filas do exame.”
Para auxiliar os médicos na primeira triagem, a Linda desenvolveu um sensor infravermelho que captura a imagem da mama e a envia para um servidor na nuvem.
Com inteligência artificial, a startup faz uma análise dessa imagem que leva em conta mais de 5 milhões de informações para dar uma indicação ao médico se a imagem é suspeita ou não.
“Pegamos milhares de mamografias já feitas para entender qual o aspecto de uma mama suspeita e uma saudável. Estamos criando esse dataset há três anos e ensinando a nossa rede neural a buscar esses aspectos,” disse Rubens Mendrone, o outro fundador. “Por exemplo, antes do tumor se formar, geralmente há uma hipervascularização no local: precisa ter mais veias para alimentar o tumor, o que faz com que tenha mais sangue no local. Isso emite calor, que nosso sensor consegue capturar.”
A Linda já atende 14 clientes, majoritariamente do setor público, como por exemplo as redes de saúde das prefeituras de São Caetano do Sul, São Luís (MA) e Goiana, no interior de Pernambuco. No setor privado, ela atende o Hospital Gastroprocto, em Natal.
A startup entrega o sensor em comodato, e os clientes pagam uma assinatura mensal para ter acesso à plataforma, num modelo de software as a service (SaaS). Há ainda um fee adicional por cada exame feito.
A Linda é o projeto da vida de Rubens, um programador que trabalhou mais de 10 anos na IBM. A ideia surgiu de sua experiência pessoal – um parente próximo com câncer de mama – e tomou forma pela primeira vez num hackathon da própria Big Blue.
Mas o negócio só começou de fato há dois anos, quando seus três sócios – Luis, Rodrigo Victorio e Raquele Rebello – investiram na empresa e entraram como executivos. (Luis era um dos sócios da agência Tribal, vendida ao Grupo ABC; já Rodrigo e Raquele foram executivos de diversas agências de publicidade.)
O trio transformou a ideia de Rubens num MVP, e fez a primeira venda em janeiro de 2021, um mês depois de conseguir o registro da Anvisa.
Desde que foi fundada, a startup levantou R$ 8 milhões com family and friends e já fez 10.000 exames. Agora, está se preparando para uma nova rodada que deve girar em torno de R$ 20 milhões.
“A gente quer deixar um legado. Nenhum de nós é startupeiro, moleque que saiu da faculdade. Todo mundo está numa fase da vida em que queremos deixar algo melhor para esse mundo, e todos tivemos exemplos de câncer de mama na família,” disse Luis. “Esse é o câncer que mais mata mulheres no mundo e a verdade é que o nosso sistema de saúde está falido.”