A recém anunciada criação de uma diretoria de governança na Petrobras segue à risca a fórmula de ineficiência do setor público: quando identificar um problema, crie uma nova ferramenta — e um novo custo — em vez de botar para funcionar o que já existe.
Em maio deste ano, a Petrobras retirou (a fórceps) de seu comitê de auditoria — cujo dever é analisar as demonstrações financeiras da estatal e garantir o funcionamento dos controles internos — dois integrantes: Francisco Roberto de Albuquerque e Mauro Cunha, este último representante dos acionistas minoritários.
Além de conselheiro da Petrobras, Cunha também é presidente da AMEC, entidade que representa dezenas de gestoras acionistas da Petrobras, portanto as partes mais interessadas em fiscalizar a empresa.
À época, a CEO da Petrobras, Graça Foster, justificou a saída de Cunha como parte de um “rodízio”. Em carta ao Estadão publicada à época, Cunha reagiu. Disse que o rodízio, aplicado pelo presidente do conselho, o ministro da Fazenda Guido Mantega, foi “seletivo” — haja vista que o presidente do comitê de auditoria é o mesmo há seis anos.
Cunha disse mais: “O rodízio foi coincidentemente imposto após solicitações de informações importantes sobre processos de apuração de irregularidades amplamente divulgadas na mídia. Como fui impedido de continuar no Comitê, não recebi tais informações.”
Do ponto de vista da governança e da fiscalização, a substituição de Cunha no “rodízio” não foi como trocar ‘carne do Wagyu’ por ‘Kobe Beef’, coisas sinônimas. Foi a troca do filé mignon pelo coxão mole.
No lugar de Albuquerque e Cunha, entraram Miriam Belchior, ministra do Planejamento, e Luciano Coutinho, presidente do BNDES. No comitê, o terceiro membro é Sergio Franklin Quintella, um dos vice-presidentes da Fundação Getúlio Vargas.
Os três são conselheiros da Petrobras indicados pelo governo, o acionista controlador.
Em abril, a Petrobras declarou à Securities & Exchange Commission (em seu formulário 20-F) que todos os membros do comitê de auditoria atendiam os requisitos de independência previstos nas regras da SEC. Essas regras estabelecem que os membros do comitê não podem ser “pessoas ligadas” à companhia ou qualquer de suas subsidiárias”.
Uma pessoa “ligada” (“affiliate”) é aquela que direta ou indiretamente controla ou está sob controle compartilhado com a Petrobras.
A Petrobras deve ter algum parecer (caro) de advogados defendendo que Belchior e Coutinho, apesar de terem sido nomeados para seus cargos pelo Presidente da República, não estão sob o mesmo controle da Petrobras.
E, obviamente, a SEC deve estar se interessando pelo assunto agora que a Lava-Jato colocou a fragilidade dos controles da Petrobras no radar.
Mas voltando à recém-criada diretoria de governança, o conselho da Petrobras deveria entender que fica feio acenar para o futuro sem romper com os velhos hábitos do passado. Corre o risco de parecer insincero.