A concorrência trazida pelas operadoras verticalizadas acaba de produzir um movimento tectônico no setor saúde, alinhando os interesses da maior operadora de hospitais do País, a Rede D’Or, com os da maior vendedora e administradora de planos coletivos, a Qualicorp.
 
10329 e169d8f2 9872 0000 0002 f10892766a69Ontem à noite, depois de uma dança do acasalamento que já dura três anos, a Rede D’Or anunciou um acordo para ficar com 10% da Qualicorp, comprando metade da posição do fundador da empresa, José Seripieri Filho, o Júnior.
 

Quando a transação for concluída, Júnior vai deixar o cargo de CEO, mas continuará um acionista importante: além de ter 9,98% do capital, o empresário vai assinar um acordo de acionistas com a Rede D’Or, alinhando ainda mais seus interesses.

 
O movimento que uniu as duas empresas começou a ser desenhado há anos, mas foi acelerado mais recentemente com o impacto que as operadoras verticalizadas — como Notre Dame Intermédica e Hapvida — estão tendo no mercado.
 
Ao conseguir controlar custos por meio de suas redes próprias, estas operadoras começaram a oferecer planos com preço de entrada baixo — R$ 180-200 — e ainda assim rentáveis.
 
Nos últimos anos, a regulação disfuncional do setor de saúde causou uma distorção no setor.  Ao permitir apenas reajustes abaixo da inflação médica nos planos individuais, a ANS aos poucos tornou estes planos profundamente deficitários, o que fez grandes operadoras como Bradesco Seguros e Sul América praticamente abandonarem o segmento.  Com reajustes livres, os planos empresariais, por outro lado, tornaram-se cada vez mais caros.
 
A saída de muitos consumidores foi correr para o plano coletivo por adesão, um produto que foi praticamente inventado pela Qualicorp e que responde pela quase totalidade de suas vendas.
 
Ao representar entidades de classe nas negociações com as operadoras, a Qualicorp consegue economias de escala, tornando o plano por adesão acessível a uma parte da população sem acesso aos planos empresarial ou individual.  Com a exceção dos anos de crise, a empresa cresceu consistentemente, e hoje atende cerca de 2,4 milhões de vidas em planos de afinidades e corporativos.
 
Mais recentemente, no entanto, a alta inflação médica e a incapacidade das grandes operadoras não-verticalizadas de controlar seus custos começou a tornar até mesmo os planos por adesão proibitivos.  Enquanto isso, as operadoras verticalizadas começaram a mostrar que seu modelo de negócios entrega planos mais baratos e ainda assim rentáveis.
 
A mesma dinâmica de preços que começou a incomodar a Qualicorp também bateu na Rede D’Or.  
 
Com uma rede de atendimento premium (e cara), a Rede D’Or sempre foi a rede que muitos usuários exigiam ter no seu plano de saúde — e por muito tempo, a família Moll exerceu seu poder de preço e monetizou esta posição.
 
Mas os reajustes exorbitantes dos planos de saúde começaram a obrigar usuários a abandonar o mercado premium e se contentar com planos mais modestos.  A Rede D’Or começou a perder tráfego.
 
“O número de vidas no plano empresarial — o grande pagador do sistema — está encolhendo, e os planos começaram a ficar indiferentes à marca,” diz um investidor do setor. “Os hospitais mais caros estão com um problema de ociosidade hoje.”
 
Agravando o quadro, em abril, a Amil descredenciou sete hospitais da Rede D’Or no Rio após uma queda de braço sobre o modelo de remuneração. Ao todo, 17 hospitais da rede foram descredenciados, entre eles o Bandeirantes e o HCor em São Paulo. 
 
Esse ‘pushback’ forçou a Rede D’Or a começar a aceitar parcerias no modelo de pacote fechado, em que a operadora paga um preço pré-estabelecido por procedimento e tende a controlar melhor os custos.
 
Mas uma saída mais estrutural ainda precisava ser construída.  
 
Agora, a Rede D’Or poderá estruturar, junto com as operadoras, produtos que aumentem a taxa de utilização da sua rede, tendo à mão o maior canal de distribuição de varejo no Brasil.