Casos recentes de disputas entre acionistas minoritários e grupos controladores de empresas — como no IRB, Linx, Smiles, AES Tietê, Tecnisa e Klabin — mostram que a governança ainda tem muito a avançar no Brasil.

O presidente da Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec), Fábio Coelho, reconheceu o risco de episódios como estes para a reputação do ambiente de negócios no Brasil e defendeu que a CVM aumente a exigência das informações prestadas pelas empresas em relação às práticas de ESG, o que possibilitaria um maior engajamento dos investidores.
 
Algumas iniciativas já estão sendo tomadas nesta direção. Em junho, a CVM publicou a Instrução nº 627, que facilita o acesso dos minoritários às informações. O percentual mínimo de ações necessário para solicitação de informações era de 5%. Agora os percentuais de participação exigida diminuem conforme o porte da empresa, chegando a 1% para companhias com capital social acima de R$ 10 bilhões.
 
E no início de setembro, a B3 e o S&P Dow Jones também lançaram um novo índice ESG, com critérios baseados em práticas ambientais, sociais e de governança para selecionar empresas brasileiras para sua carteira. A Bolsa brasileira também conta com o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) e o Índice de Carbono Eficiente (ICO2).
  
No entanto, zelar pela melhor governança corporativa é papel do conselho de administração. Por isso, é importante que este seja diversificado e conte com membros genuinamente independentes e dispostos a defender o que for melhor para a empresa, sempre observando o interesse de todos os stakeholders.
 
Uma atuação forte e vigilante dos investidores pode levar a empresa a promover mudanças necessárias em seu comando. Porém, o que se vê atualmente é que muitas companhias ainda demoram a tomar esse tipo de decisão, podendo comprometer o futuro do negócio. E isso geralmente ocorre quando o conselho não tem força suficiente para controlar os rumos – muitas vezes por falta de acionistas ativos. 
 
Este risco é ainda mais delicado quando o presidente da empresa e/ou presidente do conselho também é seu fundador ou quando há conselheiros muito alinhados com os controladores. 
 
Porém, com o crescimento do mercado de ações no Brasil – que hoje já tem mais de 3 milhões de pessoas físicas como investidores – a tendência é que os investidores fortaleçam sua atuação. Afinal, não se deve esperar o leite derramado para então procurar uma aproximação de sua empresa investida. 
  
Os investidores também precisam ter coragem para exigir mudanças nos conselhos, se estas forem necessárias para o futuro do negócio.
 
Um estudo recente da Russell Reynolds sobre os efeitos da pandemia na gestão das empresas aponta que os conselhos precisarão ter mais experiência em reestruturações e recuperações, contar com membros mais atualizados, inclusive digitalmente, e ser menos dependentes dos executivos de maior risco de deixar suas funções. 
 
A consultoria lembra ainda que os investidores também devem pressionar os conselhos a melhorar sua composição e a eficácia, com foco cada vez maior na diversidade — lembrando que esta não se restringe a questões de gênero e étnicas, mas inclui habilidades, conhecimentos, competências e até visões de vida.
  
Diante disso, algumas recomendações aos investidores são:
 
• Acompanhar mais de perto empresas que priorizam o pagamento dos executivos e/ou retornos de curto prazo para os acionistas.
• Pesquisar em suas investidas danos que possam estar ocultos.
• Avaliar se a empresa está usando a crise para evitar o escrutínio.
• Participar das apresentações trimestrais de resultados e de Assembleias Gerais Ordinárias, para supervisionar as investidas. 
 
Já as recomendações aos conselheiros são:
 
• Interagir e aprender com outros conselheiros.
• Ficar por dentro dos novos desafios e demandas dos conselhos. 
• Aumentar sua eficácia na supervisão de riscos.
• Estudar as oportunidades que o novo ambiente global pode criar para sua empresa.
 
Em suma: investidores e gestores institucionais devem ter a coragem de ser ativos, de buscar o engajamento responsável, exercendo seus deveres fiduciários, na defesa da sustentabilidade do mercado e, consequentemente, de seus negócios e investimentos.

A governança corporativa não deve ser implementada apenas para atender regras que possibilitem a busca por uma fonte barata de financiamento, mas sim por um desejo sincero de evolução e perpetuação do negócio, preparado para receber os bônus e também arcar com os ônus dos novos tempos.

Geraldo Affonso Ferreira é conselheiro independente e atuou por mais de 30 anos como executivo no setor de papel e celulose.