A MP 1304 propõe a maior mudança no setor elétrico dos últimos 20 anos — com medidas que buscam gerar modicidade tarifária, segurança energética e baratear o gás —, e o parecer do relator Eduardo Braga, publicado hoje, fez preço nas empresas listadas na Bolsa.
O relatório gerou preocupação principalmente entre as distribuidoras listadas — com os investidores calculando um impacto negativo relevante no valor das companhias se a redação for mantida como está.
Na página 18 do relatório, Braga incluiu um trecho que diz que os benefícios fiscais da Sudam e Sudene passarão a ser incluídos no cálculo do capital regulatório das distribuidoras.
Isso é relevante porque é com base no capital regulatório que se definem os reajustes tarifários. Ao se incluir os benefícios fiscais nesse cálculo, o resultado prático é que as distribuidoras terão direito a reajustes menores.
A ação da Equatorial liderou as quedas entre as distribuidoras hoje, dado que ela é uma das companhias que mais se beneficia desses benefícios fiscais. O papel caiu 3,2%. A Neoenergia deslizou 2%, e a Energisa perdeu outros 2,6%.

No Bradesco, o analista Francisco Navarrete estima que o impacto dessa medida no net present value (NPV) das empresas seria de -10% para a Equatorial, -11% para a Energisa e -11% para a Neoenergia.
Como os papéis caíram menos do que isso, a leitura é de que o mercado está assumindo uma baixa probabilidade de que o texto continue da forma como está.
O relatório de Braga é apenas o primeiro passo para a aprovação da MP, que ainda pode sofrer diversas mudanças no caminho.
Amanhã, o relatório será avaliado por uma Comissão Mista de senadores e deputados, que já pode fazer mudanças. Na semana que vem, será enviado aos plenários da Câmara e do Senado — que também podem alterar trechos do texto.
Depois que a MP for aprovada no Congresso, o presidente Lula também pode sancionar, vetar trechos ou a MP inteira.
Apesar do impacto negativo para as distribuidoras, a leitura de executivos do setor é que, de modo geral, a MP é positiva tanto para o setor elétrico quanto para o de gás.
“A MP ataca alguns dos principais problemas do setor elétrico, como a modicidade tarifária e a segurança energética,” Adriano Pires, o fundador do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), disse ao Brazil Journal. “Ela também traz medidas para reduzir o preço do gás natural.”
Na modicidade tarifária, o relatório propõe colocar um teto na CDE, a conta de desenvolvimento energético, o encargo cobrado na conta de luz para financiar programas sociais e subsídios. O que ultrapassar esse teto não será automaticamente dividido entre todos os consumidores, mas sim cobrado prioritariamente de quem recebe subsídios por meio de um Encargo Complementar de Recursos.
Para reduzir a CDE, que já está batendo em R$ 50 bilhões por ano e representa entre 15% e 17% da conta do consumidor final, a MP cria mecanismos como financiar parcialmente a CDE com a outorga das renovações das concessões das geradoras. Esse uso da outorga, porém, não é integral nem automático, e depende do desenho final do decreto e da regulamentação.
A MP também propõe repartir de forma mais equitativa os subsídios entre o mercado livre e regulado.
Na segurança energética, a MP está criando a atividade de armazenamento de energia elétrica com o uso de baterias, tecnologia conhecida como BESS, que permite armazenar energia nos momentos de sobra e entregar quando há risco de apagão ou preço elevado.
Ela também está liberando as hidrelétricas com reservatórios, que hoje são proibidas por lei.
As hidrelétricas de fio d’água, o modelo atual, só geram energia quando chove, enquanto as com reservatórios permitem guardar energia, dando mais segurança ao sistema.
O texto também permite a realização de leilões para grandes hidrelétricas reversíveis e PCHs reversíveis, modelos em que a usina pode bombear água de volta para o reservatório superior para guardar energia, algo comum em países como Japão e Alemanha.
Também volta ao radar a contratação dos 4,25 gigawatts de térmicas que eram da AXIA Energia (o novo nome da Eletrobras) que já estavam contratadas antes da MP e foram preservados por razões de segurança jurídica — mas qualquer expansão futura além desse volume deixa de ser automática e dependerá de estudo técnico do planejamento do setor.
No setor de gás, a principal mudança é que a PPSA poderá contratar diretamente o escoamento, o processamento, o transporte e a comercialização do gás da União, em nome do Estado. O CNPE passará a definir o valor cobrado por essa infraestrutura.
“Hoje, a Petrobras e as empresas donas do escoamento cobram o que acham que tem que cobrar. E isso é uma caixa preta. O que a MP está propondo é abrir essa caixa preta,” disse um executivo do setor.
Sobre o curtailment, que tem gerado prejuízos para as geradoras, a MP estabelece que as geradoras que estão ligadas ao SIN (o sistema integrado) terão a receita garantida, com ressarcimento do que está sendo cortado. Esse benefício, no entanto, não será estendido às empresas que operam no mercado livre.
Outra alteração importante tem a ver com o preço de referência do petróleo. O relatório aumenta esse preço de referência, que é usado para calcular os royalties que as petroleiras pagam ao Estado.
A medida vai aumentar a arrecadação do Governo, mas vai gerar um impacto negativo para as empresas do setor.











