Nos últimos anos, diversas startups têm criado carnes e produtos de origem animal com tecnologias como o plant-based (que usa vegetais para simular o gosto da proteína) e o cell-based, que extrai uma única célula de um animal e a replica diversas vezes.
A Future Cow está apostando num terceiro caminho: a fermentação de precisão.
A startup brasileira pega o DNA da vaca, encontra a sequência genética com instruções de como fazer o leite, insere esses genes num hospedeiro (uma levedura ou fungo, por exemplo), e depois leva tudo para um tanque de fermentação. Voilá: o leite está pronto — segundo a startup, com uma estrutura molecular exatamente igual à do leite de vaca tradicional.
A Future Cow já passou da fase de P&D e está produzindo seu leite num pequeno laboratório com um tanque de fermentação de 15 litros. “Estamos treinando e otimizando as células. A próxima etapa é escalar a produção e começar a testar o produto com fabricantes do setor,” Leonardo Vieira, o cofundador, disse ao Brazil Journal.
Em paralelo, a startup está trabalhando com o Pinheiro Neto para conseguir as aprovações regulatórias na Anvisa para começar a vender seu produto no Brasil. (Nos EUA, por exemplo, o FDA já aprovou esse tipo de produto).
A expectativa de Leonardo é que esses dois processos sejam finalizados em até doze meses, quando a Future Cow pretende construir uma fábrica para escalar sua produção. A ideia da startup é ser apenas um fornecedor para a indústria, e não uma empresa de marca.
Para bancar o negócio até lá, a Future Cow acaba de levantar uma rodada de seed money com a Big Idea Ventures (BIV), uma gestora de Singapura especializada em proteínas alternativas.
A BIV já investiu em mais de 160 startups desse segmento e está aportando na Future Cow por meio de seu segundo fundo, o New Proteins II, captado este ano. No Brasil, a Future Cow será o primeiro investimento da gestora, que tem cerca de US$ 100 milhões em ativos.
A Future Cow é o ‘first mover’ na América Latina. Mas no resto do mundo, já há startups consolidadas no segmento de fermentação de precisão.
Nos EUA, a Perfect Day é o ‘case’ mais emblemático. Fundada em 2019, a startup já levantou mais de US$ 750 milhões — e virou um unicórnio — justamente com a produção de leite usando a fermentação de precisão. A startup atraiu fundos como o Temasek e o CPPIB, além do CEO da Disney Bob Iger.
A Turtle Tree, de Singapura, também tem ganhado escala e levantou US$ 40 milhões desde sua fundação.
Leonardo disse que o maior diferencial da Future Cow em relação a essas outras startups é que ela desenvolveu uma técnica que permite que os hospedeiros (a levedura ou fungo) sejam alimentados com resíduos da agroindústria em vez da glicose, que é usada pelos concorrentes.
“Isso reduz muito o custo unitário de produção, que é um dos grandes gargalos dessa indústria,” disse o cofundador. “No nosso modelo, a redução foi de mais de 200%.”
Leonardo criou a Future Cow junto com Rosana Goldbeck, uma PhD em engenharia de alimentos que foi o cérebro por trás da tecnologia. Os dois se conheceram durante o programa da Antler, um fundo global de VC que também investiu na startup.
Segundo Leonardo, o modelo de viabilidade econômica da Future Cow aponta para um preço de venda para a indústria de R$ 2,95 por litro — um valor que ainda deve ser revisado com o tempo.
Esse preço, no entanto, já permitiria que a startup competisse de igual para igual com o leite tradicional da vaca — vendido para a indústria por entre R$ 1,60 a R$ 3,10 o litro, dependendo da qualidade.
O leite da Future Cow também tem outro benefício, segundo Leonardo.
“O nosso leite é molecularmente idêntico ao leite da vaca, mas eu consigo tirar tudo de ruim que o leite da vaca tem: a lactose, os hormônios, a pesticida, o antibiótico,” disse ele.
“O leite de vaca é um produto muito bom, mas não é sustentável. O plant based é mais sustentável, mas não tem as mesmas funcionalidades e o mesmo sabor. A gente está criando um produto com as mesmas funcionalidades, o mesmo sabor e que é sustentável.”