Navegando um mercado pavoroso para o minério de ferro, a Vale está tentando ser criativa para rentabilizar seu negócio, incluindo lançar mão de uma velha ideia: sentar-se à mesa com os concorrentes.
Na segunda-feira à noite, a empresa anunciou que vai buscar oportunidades conjuntas com a australiana Fortescue, a novata num mercado dominado pela BHP, a Rio Tinto e a própria Vale.
A ideia da Vale é formar “uma ou mais joint ventures” com a Fortescue na mistura (‘blending‘) e distribuição de minérios, realizar projetos de mineração em conjunto na Austrália. O acordo também dá à Vale a opção de adquirir uma participação de até 15% na empresa controladora da Fortescue.
O ‘blending‘ faz parte do dia-a-dia da indústria do minério de ferro. As siderúrgicas chinesas geralmente compram o minério da Vale (conteúdo de ferro de 65%) e o misturam com o australiano, de mais baixa qualidade (58% de ferro). Ao criar uma JV com a Fortescue para o ‘blending’, “em vez de vender apenas uma fatia do bolo, a Vale poderá vender o bolo todo,” diz um executivo do setor.
No passado, antes do preço do minério de ferro se esfarelar, a Vale já havia considerado uma fusão com a Fortescue. A união das duas empresas tem um apelo logístico óbvio: enquanto a Vale está a 45 dias de viagem da China, o oeste da Austrália, onde ficam as minas da Fortescue, fica a apenas 12 dias dos portos chineses. Apesar disto, a ideia nunca foi adiante pelo temor de que os órgãos antitruste — em várias jurisdições — vetariam uma fusão, dado o oligopólio que existe no mercado de minério de ferro.
A Fortescue — uma empresa que, assim como a MMX de Eike Batista, saiu do PowerPoint para a realidade por volta de 2008 — é hoje a quarta mineradora de ferro do mundo, com uma capacidade de produção de 155 milhões de toneladas/ano — e, claro, um enorme endividamento.
O minério de ferro, que chegou a negociar a 190 dólares por tonelada em fevereiro de 2011, implodiu para níveis de 40 dólares no início do ano. De lá para cá, os preços começaram a se recuperar lentamente, até que, nesta segunda-feira, sinais de que a China vai estimular a economia (de novo) injetaram pânico entre os ‘vendidos’ e colocaram o minério de novo acima de 60 dólares.
Em meio a este cenário, o CEO da Vale, Murilo Ferreira, está tentando a todo custo evitar a queima de caixa. Na virada do ano, a Vale não pagou bônus a seus executivos, não deu reajuste salarial a seus funcionários, e anunciou que não deve pagar dividendos em 2016.
Num sintoma da restrição de crédito enfrentada pelas empresas de commodities em todo o mundo, em janeiro deste ano a Vale se viu forçada a sacar 3 bilhões de dólares de uma linha de crédito de 5 bilhões. A linha — conhecida como ‘revólver’ — estava disponível há pelo menos oito anos, mas nunca havia sido usada pela mineradora.
“Se a Vale fosse ao mercado captar, o custo de emitir um título agora teria sido muito maior que o custo de usar esta linha,” diz uma fonte do mercado.