RIAD, Arábia Saudita – Se tem uma coisa que o setor de mineração aprendeu após os desastres de Mariana e Brumadinho é que não dá para minerar sem o consentimento da sociedade.
“Ou geramos valor para a sociedade, ou a sociedade não nos permite atuar,” Shaun Usmar, o CEO da Vale Metais Básicos, disse ao Brazil Journal.
Conversei com Usmar depois de sua participação no Future Minerals Forum, aqui em Riad. Ele caminhava comigo em direção à saída do complexo de eventos e apontou para o celular em que eu gravava a conversa: “Está cheio de metal aí dentro.”
A importância da mineração para os dois grandes desafios econômicos atuais – as mudanças climáticas e a inteligência artificial – dominou os debates aqui.
As mineradoras fornecem matérias-primas essenciais para o desenvolvimento tecnológico e para a transição energética, a principal linha de batalha contra as mudanças climáticas. “O problema é que não sabemos contar nossas histórias,” disse Usmar.
Sem estabelecer um diálogo com a sociedade, o executivo teme ver revogada a chamada “licença social para operar,” um termo cunhado no mundo da sustentabilidade que representa um dos grandes riscos para o setor.
Em novembro, o Supremo Tribunal Federal validou o acordo firmado entre Vale e BHP com o governo brasileiro; as indenizações chegam a US$ 30 bilhões.
O acordo abre caminho para as empresas restabelecerem um diálogo franco com a sociedade e recuperarem sua reputação.
A seguir, os principais trechos da conversa:
A Vale e outras mineradoras estão sendo mais vocais em relação a suas estratégias de sustentabilidade, com foco relevante nas questões sociais. Como isso aconteceu?
Não é algo tão recente nas melhores empresas. Diferentemente de outras indústrias, na mineração é preciso ficar onde está, não dá para levar sua operação para outra cidade. Se a empresa não consegue demonstrar valor para a sociedade, além do produto em si, corre o risco de ser impedida de operar. E são horizontes de longo prazo. Você aloca capital, constrói capacidade e gera empregos anos antes de ver algum dinheiro.
Essa maior disposição em falar sobre o tema se deve à maturidade das estratégias de sustentabilidade?
Vivemos na era da informação. Se a empresa diz alguma coisa e não cumpre, será cobrada pela sociedade. Isso é um problema para o setor de mineração. Não fizemos um bom trabalho em mostrar a importância da mineração. Podemos impactar positivamente comunidades remotas, por exemplo, mas não fomos capazes de contar essas histórias.
Ao mesmo tempo, há um impacto intrínseco na mineração, uma vez que é preciso movimentar enormes quantidades de terra para extrair o produto. Como isso se dá, por exemplo, na Amazônia?
A Vale protege a Amazônia desde os anos 1980. É preciso considerar que os deslocamentos de pessoas são pequenos na mineração, em comparação a outros setores, o que reduz o impacto.
Outro aspecto que muitas vezes é negligenciado é a governança. Como garantir que as políticas de segurança e sustentabilidade estão funcionando?
Se você machuca as pessoas e não se preocupa com meio ambiente, não terá as bases para ter a sua licença social. Precisamos fazer parcerias com a sociedade e com os governos. Só assim vamos superar o desafio dos minerais críticos.