Depois de enfurecer os taxistas, o Uber pode logo entrar na lista negra dos motoboys – ou, quem sabe, abrir um novo mercado para eles.

O gigante das caronas se prepara para lançar no Brasil seu aplicativo de entrega de comida, o UberEATS, e já está contratando executivos para estruturar o negócio por aqui.

A empresa planeja iniciar o serviço em São Paulo ainda este ano e está em busca de um gerente-geral para ‘literalmente desenvolver e desenrolar o ecossistema de entrega de comidas para o Uber’, de acordo com uma descrição publicada há alguns dias no LinkedIn.

Estão abertas ainda outras quatro vagas: marketing, operações e logística, novas parcerias e parcerias existentes.  Nestes dois últimos casos, os executivos serão responsáveis, respectivamente, por prospectar restaurantes que oferecerão o serviço e fazer a interface com eles depois que a parceria for fechada.

O UberEATS é o primeiro serviço do Uber a contar com seu aplicativo próprio, fora da plataforma de transporte de passageiros. Após alguns pilotos em cidades como Toronto, o serviço de delivery foi relançado oficialmente em dezembro de 2015 como um app completamente separado.

O delivery pode ser feito pelos motoristas do Uber, que também fazem transporte de passageiros e se cadastram para o serviço adicional, ou por entregadores de bicicleta, uma opção que vem ganhando adeptos em cidades dos Estados Unidos e Europa.

A dúvida é se o UberEATS vai ser apenas ‘mais um app’ ou se vai conseguir dominar o mercado. 

Ao contrário do transporte de passageiros, onde ‘deslocou’ o modelo arcaico dos taxis, no delivery de comida o Uber enfrenta concorrentes que também possuem base tecnológica: os aplicativos já existentes.  E o mundo está cheio deles.  

De acordo com a consultoria CB Insights, nos EUA 39 startups de delivery já levantaram pelo menos US$ 5 milhões de funding, cada uma, de 2011 até hoje.  O ranking das maiores valuations: Blue Apron (US$ 2 bi), DoorDash (US$ 700m), Postmates (US$ 500m), e Munchery (US$ 300m).  (Algumas startups, como a Munchery e a Sprig, não se limitam a entregar:  ela também fazem a própria comida.)

A ‘delivery mania’ começou no fim de 2012 e durou o ano seguinte inteiro. Em seguida, houve um período de calmaria no primeiro semestre de 2014, seguido por outra onda de financiamento.  Até agora, poucas empresas morreram, e o movimento de consolidação entre elas ainda foi tímido.

No Brasil, ainda que sua marca seja muito forte, o Uber não possui vantagem competitiva em relação à frota de motoboys usada pelos apps já existentes.  No trânsito tartaruga de São Paulo, particularmente, o carro chega a ser uma desvantagem em relação à moto.  Não está claro se o Uber vai adaptar seu modelo de negócios às circunstâncias locais, passando a ter, além dos motoristas, os ‘motoboys do Uber’.  O Uber não comenta sobre sua estratégia — se é que já existe uma — mas uma possibilidade é de que ele tente atender apenas o nicho de restaurantes mais sofisticados, que nunca tiveram um serviço de entrega.

O líder do delivery no País é o iFood, com 80% de market share (segundo a própria empresa), 2 milhões de usuários e mais de 10 mil restaurantes cadastrados na plataforma. Uma fonte da empresa disse ao Brazil Journal que o iFood tem um tíquete médio de cerca de R$ 80.  Considerando que o app atende a 2,1 milhões de pedidos/mês e cobra uma comissão de 12%, estima-se um faturamento de R$20 milhões/mês.

O iFood, que até agora levantou cerca de US$ 62 milhões dos sócios Movile e Just Eat (empresa de delivery inglesa), já fez 15 aquisições nos últimos três anos, incluindo os concorrentes Central do Delivery, Papa Rango, Alakarte, Resaturante Web e HelloFood. (A Just Eat entrou no capital do iFood quando ele se fundiu com o Restaurante Web, no qual era investidora. Ela tem 30% do iFood; os outros 70% pertencem à Movile, holding que controla outros apps, como o PlayKids e o TruckPad.)

A empresa já está se mexendo para não perder share. No mês passado, lançou em São Paulo o SpoonRocket, um aplicativo voltado para consumidores de alta renda e com uma base de restaurantes mais refinados, que normalmente não oferecem o serviço de delivery. (O iFood comprou a tecnologia da SpoonRocket no começo deste ano, quando a startup americana fechou as portas.)

A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) estima que o mercado de delivery de comida tenha movimentado R$ 9 bilhões em 2015, R$ 1 bilhão a mais que no ano anterior.