Enquanto o ESG enfrenta questionamentos sobre a eficácia de suas métricas e um backlash político ao redor do mundo, a Fundação Dom Cabral está dobrando a aposta: incluiu o “capitalismo consciente” como disciplina obrigatória em sua primeira graduação.

A tradicional escola de negócios, que forma executivos há cinco décadas, decidiu educar seus jovens sobre foco nos stakeholders e longo prazo justamente quando o tema vive um momento de tensão.

A contradição é parte do plano de ensino. “Apesar dos avanços do capitalismo, uma parcela da população ainda não usufrui de seus benefícios, e o sistema não é perfeito,” Adriano Pimenta, pesquisador do núcleo de sustentabilidade da FDC e docente da disciplina, disse ao Brazil Journal.

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O curso foi desenvolvido em parceria com o Instituto Capitalismo Consciente Brasil (ICCB), uma organização inspirada no movimento homônimo criado por John Mackey, o cofundador da rede de supermercados Whole Foods, e Raj Sisodia, autor e professor de marketing.

Mackey e Sisodia popularizaram o conceito em 2013 com o livro Capitalismo Consciente: Liberando o Espírito Heroico dos Negócios. Eles defendem a ideia de que as empresas devem operar de forma ética e com um propósito maior, além da busca pelo lucro.

“A intenção do curso é inocular e inspirar aqueles que estão iniciando sua jornada profissional, para que não seja necessário realizar todo o trabalho de conscientização apenas na ponta, com executivos já formados,” disse Daniela Garcia, a CEO do ICCB. 

Pimenta estruturou o curso em torno dos quatro pilares do capitalismo consciente: propósito maior, orientação para stakeholders, liderança consciente e cultura consciente.

A matéria integra conceitos de ESG, sustentabilidade e responsabilidade social, utilizando casos práticos de empresas como Zero Carbon Logistics, Nu Alimentos, Intermédica e Tia Sônia.

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A disciplina opera em meio à polarização que vincula o ESG a movimentos políticos. Pimenta busca blindar as discussões focando no aspecto empresarial, evitando debates ideológicos que podem comprometer o aprendizado.

O professor destaca que externalidades impactam diretamente os negócios, citando enchentes e quebras de safra como exemplos concretos. Para ilustrar gestão não consciente, utiliza contra-exemplos como os acidentes de Mariana e Brumadinho.

A aposta do ICCB em avançar a pauta por meio da educação executiva está ligada à crença de que a sustentabilidade é um diferencial competitivo. O Brasil, por exemplo, possui muita biodiversidade e uma matriz energética renovável, atributos valorizados em mercados que exigem práticas sustentáveis, principalmente a Europa. 

O instituto construiu um arsenal de conteúdo que viabiliza essa expansão educacional. Em nove anos, a organização desenvolveu mais de 20 minicursos, 11 livros traduzidos para o português, 80 revistas digitais mensais e mais de 400 ativos de blog. A plataforma educacional já estabeleceu parcerias com escolas como FGV, FIA, Senac e Ibmec, mas a inclusão como disciplina obrigatória na graduação da FDC representa um reconhecimento inédito para o movimento.

Na FDC, a aposta é de atrair uma geração que já está interessada no assunto. Segundo Pimenta, há alunos em sua primeira turma cujos pais são fundadores de negócios de impacto social. A turma atual, no quarto período da graduação, também cursa disciplinas complementares como desenvolvimento sustentável e diversidade, equidade e inclusão, formando base abrangente para futuras lideranças empresariais.