A ação da Natura&Co chegou a subir 8% hoje com o mercado aplaudindo a venda da Aesop — que vai praticamente zerar a dívida bruta da companhia e colocá-la numa posição de caixa líquido.
Mas nem todo mundo está satisfeito. Alguns gestores comprados no papel acham que a transação foi um erro estratégico.
“Eles venderam o que estava indo bem, o melhor ativo da companhia,” disse um dos gestores. “O que sobra agora é um negócio bem mais maduro, com potencial de crescimento limitado, e que vai deixar a empresa presa naquela visão de venda direta.”
Para esse gestor, o movimento lembra — guardadas as devidas proporções — o que a Saraiva fez em 2015, vendendo sua editora para levantar recursos, e ficando com a rede de livrarias.
“Eles podiam ter vendido a The Body Shop ou separado a parte ruim da Avon e tentado vender. Ia levantar menos dinheiro, mas conseguiria reduzir um pouco a alavancagem e ficava ainda com um negócio bom, de alto crescimento.”
Outro gestor disse que acha que a transação mostra que “o curto prazo venceu o longo prazo, infelizmente.”
“A Aesop era um ativo maravilhoso e a empresa não precisava vender,” disse ele. “O mercado estava erradamente nervoso e ficou colocando uma pressão desnecessária. A alavancagem estava um pouco alta mas era perfeitamente administrável.”
No final do ano passado, a alavancagem da Natura estava em 3,5x o EBITDA, com uma dívida líquida de R$ 7,7 bilhões. Mas esse número cresceu basicamente porque a empresa teve uma queda relevante do EBITDA nos trimestres anteriores.
A grande dúvida no mercado é se o EBITDA vai voltar ao que era antes, ou se o patamar atual é a nova realidade da companhia.
“Pode ser que ele estivesse mesmo inflado na época da pandemia porque a empresa fez muito mais vendas diretas, que são mais rentáveis,” disse um dos gestores.
Com a venda da Aesop, a Natura&Co vai passar a uma posição de R$ 1,6 bilhão de caixa líquido, considerando que não haja nenhum imposto sobre o ganho de capital.
A expectativa do mercado é que a empresa use boa parte dos recursos para pré-pagar dívidas caras em seu balanço — incluindo um sustainability bond de R$ 5,1 bilhões com um custo de CDI + 3,3%.
Ao pré-pagar essas dívidas, a companhia vai reduzir drasticamente suas despesas financeiras, o que vai impactar positivamente o bottom line.
Para um gestor, o X da questão é o que a Natura&Co vai fazer com esse dinheiro no caixa, já que as últimas aquisições que ela fez se provaram ruins.
Após a venda, a Natura&Co vai operar três negócios: a operação da Natura na América Latina, que foi integrada com os ativos da Avon na região; a The Body Shop; e a Avon Internacional, que tem operações em regiões como África, Reino Unido, Ucrânia e Rússia.
“A Avon Internacional é gelo derretendo no calor… a receita não para de desabar. Já a The Body Shop era uma marca declinante da L’Oreal que eles compraram em 2017 e que nunca conseguiram fazer o turnaround,” disse o gestor. “O ativo bom que sobra é a Natura na América Latina, mas que é um negócio já maduro e com um crescimento limitado.”
Para esse gestor, a Natura&Co deve passar por uma reprecificação após a venda da Aesop, mas em sua nova configuração o negócio vai negociar com múltiplos baixos.
Nas contas do sellside, a Natura&Co (sem a Aesop) negocia hoje a um múltiplo de cerca de 4,5x o EBITDA estimado para o ano que vem — um desconto relevante em relação aos peers globais e à média histórica da companhia, de 11x.
Empresas como L’Oréal, Beierdorf, Estée Lauder e P&G negociam a uma média de 14x o EBITDA estimado para 2024.
Depois de subir 8% no início do pregão, a ação da Natura devolveu os ganhos e opera próximo a estabilidade no início da tarde.