Donald Trump pode em breve ter um IOF para chamar de seu.

Trata-se de um novo tributo previsto no Orçamento que acaba de ser aprovado na Câmara e já vem sendo chamado de ‘revenge tax’ – o imposto da vingança.

O novo tributo marcaria o fim da isenção fiscal existente há anos para certas aplicações em renda fixa nos EUA, o que pode atingir os investimentos de brasileiros no mercado americano e até mesmo os títulos públicos carregados nas reservas internacionais administradas pelo Banco Central.

O projeto – festejado pela Casa Branca e que ganhou o nome de ‘One Big Beautiful Bill Act’ – vai aprofundar os déficits fiscais ao trazer mais despesas e reduções de alguns impostos. Agora tramita no Senado e deve ter aprovado no Congresso até 4 de julho.

O texto que saiu da Câmara dominada pelos republicanos traz na ‘Section 899’ ferramentas jurídicas para que os EUA possam tributar de maneira retaliatória os lucros e rendimentos que estrangeiros tenham no país. Seria uma cobrança punitiva contra países que cobram impostos ‘discriminatórios’ e ‘injustos’ sobre as operações de empresas americanas no exterior.

A alíquota prevista para a remessa de recursos para o exterior é de 3,5%. Essa tributação poderá ser cobrada de governos, empresas e pessoas físicas. Poderá cair, por exemplo, a isenção tributária para as compras de títulos públicos americanos pelos bancos centrais de todo o mundo que está em vigor desde o Governo Reagan.

Países que podem ser alvo da retaliação tributária são aqueles que passaram a cobrar impostos sobre o faturamento das Big Techs – as chamadas Digital Service Taxes (DST), criadas para que os gigantes digitais paguem mais tributos pelas vendas de seus serviços e evitem se proteger em paraísos fiscais.

Muitas nações europeias já começaram a cobrar a DST. Esse tributo está previsto dentro de um acordo patrocinado pela OCDE.

No Brasil, há um projeto que foi elaborado pela Fazenda e deverá chegar ao Congresso nos próximos meses, elevando a carga tributária das Big Techs – e sim, provavelmente a assinatura da Netflix e dos serviços do Google e da Microsoft ficarão mais caros no País.

Grandes bancos americanos estão mobilizados para que a ‘Section 899’ seja derrubada – ou, ao menos, ajustada para não ficar da maneira como foi redigida na Câmara. O texto dá margem a diversas aplicações e pode criar uma enorme judicialização. Se aprovado, o tributo passará a ser cobrado a partir de 2026.

O Morgan Stanley disse que espera alterações “significativas” no Senado, porque o projeto “potencialmente desincentiva o fluxo de capitais para os EUA em vez de retê-los.”

A Goldman Sachs disse que os dividendos também poderão ser atingidos, “afetando o apetite dos investidores estrangeiros, que hoje possuem 18% do mercado americano de ações.”  

Para Filippe Santa Fé, o head de multimercados do ASA, esse é mais um indicativo de que os EUA entraram em um período em que serão institucionalmente percebidos de maneira diferente, com uma maior grau de desconfiança, por causa da postura de Trump.

“A ideia não é muito diferente do que o Brasil quer fazer com o IOF,” Santa Fé disse ao Brazil Journal. “Isso implode a disposição das pessoas de financiar o déficit público – e o preço dos Treasuries será muito diferente.”

A função é tanto de controle de capitais como arrecadatória. Também como no caso do IOF, esse novo tributo americano seria uma das fontes de recursos para deixar o Orçamento minimamente de pé – mas a consequência prática pode ser o aprofundamento do desarranjo fiscal.

“Para os investidores estrangeiros, fica a dúvida se vale a pena concentrar tanto em um mercado que era considerado livre de risco e agora tem riscos institucionais crescentes,” disse o gestor.

 O Deutsche Bank estimou que o yield ‘de facto’ dos Treasuries poderá cair 100 bps – ou seja, seria como uma elevação de 100 basis points nos prêmios de risco, o que encareceria o custo da dívida federal.

Os investidores e gestores brasileiros precisam acompanhar com atenção os desdobramentos da legislação, disse o advogado Pierre Moreau, sócio-fundador do Moreau Advogados.

“Será preciso avaliar o efeito líquido dessa tributação sobre os portfólios e fazer ajustes caso o dispositivo entre em vigor,” disse Moureau. “Um exemplo é que as emissões das empresas brasileiras no exterior feitas fora dos EUA poderão se tornar mais vantajosas.”