Praticamente toda a valorização do mercado acionário dos EUA no primeiro semestre foi concentrada num pequeno grupo de dez empresas – quase todas Big Techs turbinadas pela inteligência artificial.

A espetacular valorização dessas companhias fez com que elas alcançassem, sozinhas, mais de 30% do market cap do S&P 500. Há dez anos, a participação das dez maiores no valuation do índice era metade disso.

Mas quanto mais o mercado atinge novos highs, mais parece ter chegado a hora das outras 490 companhias no principal índice da Bolsa americana.

A rotação de growth para value iniciada semana passada, cujo gatilho foi a perspectiva do início do ciclo de cortes de juros pelo Fed, levou a uma reprecificação de empresas que vinham performando mal na Bolsa, entre elas bancos e small caps.

O movimento está aumentando o interesse pelo S&P 500 Equal-Weight, o índice que atribui o mesmo peso às 500 ações do S&P – em vez de ponderar o peso pelo valor de mercado – e está atraindo cada vez mais gestores.

No Equal-Weight, cada uma das 500 ações tem 0,2% na composição do índice – seja uma mega cap de US$ 3 trilhões ou uma empresa mais modesta cujo valor de mercado mal passa dos US$ 20 bi.

Uma forma de investir no Equal-Weight é comprar o ETF RSP, da Invesco, que replica o índice. Segundo a Barron’s, as citações ao índice nos relatórios dos analistas explodiram nas últimas semanas, e o ETF recebeu um forte fluxo, chegando a US$ 54 bilhões.

“No primeiro semestre, o mercado havia se afunilado para algumas grandes empresas,” disse Andrew Reider, o CIO da WHG. “Foram premiadas as que conseguem ir bem mesmo com os juros mais altos.”

Saíram ganhando basicamente as gigantes de tecnologia, que conseguem repassar preços e são favorecidas pelo advento (e a narrativa) da inteligência artificial, além de empresas beneficiadas por teses específicas, como as farmacêuticas que produzem as novas drogas contra a obesidade.

Agora, a rotação ocorre porque os investidores estão arbitrando o upside potencial que resta nas Big Techs – ponderando os valuations esticados e dúvidas sobre quem serão os ‘real winners’ na corrida da IA – contra o upside de empresas que têm ficado atrás do índice.

Ao mesmo tempo, os juros mais baixos à frente devem favorecer as companhias que estão com múltiplos amassados por causa da alta taxa de desconto – entre elas empresas do setor imobiliário e utilities, além de papéis do setor financeiro.

Segundo Reider, o mercado agora lembra o quadro visto no final do ano passado, precificando queda dos juros. “É uma conjuntura favorável para ações de value e small caps.”

O múltiplo do S&P Equal-Weight está em 17x o lucro estimado para os 12 meses à frente. Enquanto isso, o múltiplo do S&P 500 é de 22x, e o do índice Nasdaq 100 é de 27x.

“Não acho que haja uma bolha nas ações das Big Techs, mas há exageros,” disse Roque Sut, o CIO da Setta Gestão e Governança Patrimonial. “Faz sentido rotacionar. A rotation precisa ir de growth para value.”

Para Roque, a conjuntura adiante deverá continuar favorecendo a saída de recursos das Magnificent Seven e a diversificação para papéis mais ‘boring.’ “O mercado estava muito leniente com as grandes empresas de tecnologia.”

Na sequência de um rali nos últimos dias, o S&P Equal-Weight acumula alta de mais de 4% nos últimos 30 dias e de 8,3% no ano. Os números do ETF RSP são praticamente os mesmos.

O índice Russell 2000, de small caps, também vem se recuperando. Depois de ficar no 0 a 0 no primeiro semestre, disparou 8% nos últimos cinco dias e registra alta de 11,3% no ano.

Já o Nasdaq devolveu 4% nos últimos cinco pregões. Ainda assim, a valorização no ano está em quase 20%. O S&P 500 ‘tradicional’ subiu 18% no ano.

“Havia ocorrido um deslocamento muito intenso no mercado, de value para growth e de small cap para big cap,” disse Fernando Donnay, gestor de portfólios da G5 Partners. “Nos ciclos mais longos, seja por preço ou risco os preços tendem a reverter a média.”

Ou seja, havia uma assimetria a ser capturada – e foi isso que o mercado passou a fazer desde a semana passada, quando se abriu novamente a janela do ciclo de corte de juros.

Hoje foi um dia particularmente ruim para as ações de tecnologia, sobretudo para as companhias de chips – culpa das ‘questões geopolíticas’ e ameaças vindas tanto de Joe Biden quanto de Donald Trump.

Biden sinalizou que poderá impor novas sanções contra a exportação de processadores para a China. Já Trump disse à Bloomberg Businessweek que Taiwan terá que pagar pela defesa militar de seu território feita pelos EUA.

As ações da Nvidia caíram quase 7% – levando junto outras empresas do setor, como a AMD, Arm e Qualcomm.