Ao longo de boa parte do ano passado, a ação do Grupo Pão de Açúcar ficou largada na Bolsa.

Depois de um quarto trimestre de 2019 que os próprios executivos do grupo chamaram de “catastrófico”, muitos investidores jogaram a toalha — e a companhia teve que assistir a um player regional como o Grupo Mateus precificar seu IPO a mais de 22x o lucro.

Agora, com a ação negociando a 12x o lucro estimado para este ano, o mercado está voltando a botar o GPA no carrinho de compras.

A grande aposta: a geração de valor que virá do spinoff e listagem do Assaí, o negócio que mais cresce no grupo, e que dará a cada acionista do GPA ações do Assaí na proporção de sua participação. 

A conta é simples. Se o mercado aplicar ao Assaí o mesmo múltiplo de preço/lucro do Mateus, isso significaria que o Assaí estrearia na Bolsa valendo cerca de R$ 22 bilhões — o mesmo valor de mercado que o GPA inteiro tem hoje. 

Em outras palavras, tudo no GPA que não é Assaí estaria “de graça” com os investidores atribuindo valor zero às 873 lojas do Extra, Pão de Açúcar e CompreBem, (incluindo 103 drogarias e 70 postos de combustível) — sem falar no Exito, a rede de supermercados na Colômbia, Argentina e Uruguai pela qual o GPA pagou R$ 10 bilhões há apenas dois anos. 

A cisão — que deve estar finalizada até meados de março — deve acelerar a expansão do Assaí e do próprio GPA, que já tem planos de retomar a abertura de lojas do Pão de Açúcar, sua bandeira premium.

Depois de abrir em média 18 lojas/ano nos últimos cinco anos, o CEO Belmiro Gomes tem dito a investidores que a meta do Assaí são 28 novas lojas este ano, e outras 25 por ano até 2023. 

A estrutura de capital parece redonda. O Assaí tem alavancagem de 1,7x o EBITDA, exige um capex baixo por metro quadrado e, quanto mais cresce, mais gera caixa — sem precisar do capital de terceiros. O top line cresce 30% ao ano.

Mas enquanto o mercado não consegue achar defeitos no Assaí, o GPA ainda sofre com a reputação do passado.

As coisas, no entanto, estão mudando.  

Um mamute que faturou cerca de R$ 48 bilhões nos últimos 12 meses (já excluindo o atacarejo), ao longo do último ano o GPA conseguiu recuperar aquele que é considerado seu pior negócio: os hipermercados.

Depois que a margem EBITDA dos hipermercados bateu 2,6% no quarto tri de 2019, o trabalho de recuperação feito por Jorge Faiçal, o presidente do Multivarejo do GPA, conseguiu margens de 7% no último tri reportado. (Para efeito de comparação, o Multivarejo como um todo faz 7,7%, e o Exito, 8%.)

Já a bandeira Pão de Açúcar, o maior negócio do GPA em número de lojas, tem margem de dois dígitos e pretende voltar a crescer depois de cinco anos sem abrir lojas. O Pão deve abrir 5 lojas este ano e escalar para 15-20 por ano a partir de 2022, o CFO Christophe Hidalgo disse a investidores semana passada.

Pós-cisão, o GPA ficará com uma alavancagem quase nula, de cerca de 0,1x. A companhia tem dívida líquida de apenas R$ 500 milhões e faz um EBITDA de mais de R$ 4 bi.

A dívida bruta, no entanto, gira em torno de R$ 6,5 bilhões e ainda é uma preocupação do mercado. No roadshow com investidores, o management indicou que vai reduzir a dívida com a geração de caixa própria e os dividendos pagos pelo Exito (que distribui 75% do lucro, o que dá cerca de US$ 60 milhões/ano para o GPA).

O GPA está avaliando, por exemplo, o que fazer com suas operações na Argentina e no Uruguai. Outra opcionalidade: a participação de 34% na CDiscount, o negócio de ecommerce do Casino que é líder de mercado na França.  

Nas vendas online — um jogo que o GPA começou a jogar ainda nos anos 90 com o pioneiro site Amelia.com.br, mas que nunca foi foco da companhia — a companhia acha que finalmente está pronta para deslanchar.

Com 36 CDs e 1.000 lojas espalhadas pelo Brasil, o GPA diz ter a tecnologia e a logística para capturar o crescimento das vendas online de alimentos, que devem se multiplicar por sete nos próximos cinco anos. 

Hoje, o GPA vende R$ 1 bilhões online — sem considerar o Exito, que vende outros R$ 2 bi nos países onde atua — com EBITDA igual ao das lojas físicas. Esse faturamento faz do GPA o maior player do nicho alimentar online — o dobro do que faz o Carrefour, o segundo colocado.

Com a cisão, as duas companhias terão governanças próprias. As únicas sobreposições nos conselhos serão Jean-Charles Naouri, o controlador do Casino; Ronaldo Iabrudi, que hoje é co-vice presidente do conselho do GPA, e Christophe Hidalgo, o CFO do GPA. 

O conselho do Assaí terá Geraldo Luciano, o ex-CFO da M Dias Branco; José Flávio Ramos, chairman da BSM, a Bolsa Supervisão de Mercados, da B3; Nelson Carvalho, que foi chairman da Petrobras durante o Governo Temer; Josseline de Clausade, uma diplomata francesa que é especialista em sustentabilidade; e David Lubec, o CFO do Casino na França.