O setor privado chega à COP30 com uma cobrança direta: o financiamento climático ainda não acompanha o ritmo das metas globais de descarbonização.
Empresas e instituições esperam que a conferência de Belém produza um acordo capaz de destravar capital, reduzir riscos e dar previsibilidade aos investimentos da transição verde.
Às vésperas da conferência, lideranças empresariais e organizações como a International Chamber of Commerce (ICC Brasil) defendem que esta seja a “COP da implementação”: menos retórica diplomática e mais execução prática.

“Nas COPs, o setor privado costuma ser espectador. Desta vez, queremos participar da discussão e mostrar, pelo exemplo, o que dá para fazer,” disse Ricardo Mussa, presidente da SB COP30, uma iniciativa de advocacy criada pela Confederação Nacional da Indústria.
O documento Como impulsionar uma nova era de ação climática, elaborado pela International Chamber of Commerce do Brasil e entregue ao governo federal, pede que a conferência priorize condições propícias ao investimento privado, tornando as metas climáticas “implementáveis e investíveis”.
Entre as propostas estão a revisão das regras de Basileia III, que hoje punem bancos que financiam projetos sustentáveis em países emergentes; a harmonização das taxonomias verdes entre países para reduzir custos e facilitar o fluxo de capital; a expansão dos mecanismos de blended finance e dos instrumentos de proteção cambial, como o programa Eco Invest Brasil; e o apoio à criação do Fundo Tropical das Florestas, que remuneraria países pela área preservada.
“É preciso definir o que é financiamento verde e criar os incentivos certos,” disse Gabriella Dorlhiac, a diretora executiva da ICC Brasil. “A COP30 precisa ser um momento de soluções práticas, não apenas de novas promessas.”
O policy paper da ICC Brasil toma como ponto de partida o acordo firmado na COP29, no Azerbaijão, que estabeleceu a Nova Meta Quantificada Coletiva sobre Financiamento Climático (NCQG). Aquele pacto prevê triplicar o volume anual destinado aos países em desenvolvimento, de US$ 100 bilhões para US$ 300 bilhões até 2035, e avançar na implementação do chamado Roteiro de Baku a Belém, que busca mobilizar US$ 1,3 trilhão por ano no mesmo período.
Os números evidenciam o descompasso entre metas e recursos disponíveis. Segundo o mesmo documento, as economias emergentes e em desenvolvimento — que representam 25% do PIB global — recebem apenas 14% do financiamento climático.

Hoje o volume de financiamento privado externo para esses países não passa de US$ 30 bilhões por ano, quando seriam necessários US$ 450-550 bilhões adicionais anuais até 2030 para manter o mundo na rota da descarbonização.
A ICC Brasil também chama atenção para a assimetria entre mitigação das emissões e adaptação das infraestruturas para suportar eventos climáticos extremos. O financiamento global para reduzir emissões atingiu US$ 1,3 trilhão em 2022, enquanto a adaptação da infra recebeu míseros US$ 76 bilhões — dos quais somente 8% vieram do setor privado.
Mesmo que se cumpra a meta de dobrar os aportes públicos à adaptação até 2025, o déficit global continuará elevado, entre US$ 208 bilhões e US$ 388 bilhões por ano.
O diagnóstico é claro: há capital disponível, mas faltam regras que reduzam risco e deem previsibilidade. “Se o empresário sabe qual é a regra do jogo, ele investe. Se não sabe, ele para,” disse Mussa.
No Brasil, há uma expectativa de que a conferência consolide instrumentos já em curso — como a Taxonomia Sustentável Brasileira e o Eco Invest Brasil — e sirva de plataforma para escalar modelos de financiamento de longo prazo com risco reduzido.

O empresariado também espera avanços no mercado de carbono, tanto na regulação do Artigo 6 do Acordo de Paris, que trata da criação de um mercado global de carbono, quanto na implementação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE). A definição de metodologias e critérios de verificação é vista como essencial para destravar novos investimentos e dar segurança jurídica às empresas que apostam em soluções baseadas na natureza.
Para Daniel Feffer, o presidente da ICC Brasil e vice-presidente do conselho da Suzano, a COP30 também precisa reconhecer o valor econômico e climático de atividades produtivas que capturam carbono mas ainda não são contabilizadas.
Ele cita o setor de florestas plantadas, que conserva 1,1 milhão de hectares e mantém 7 milhões de hectares em cultivo com ciclos contínuos de plantio e colheita que geram captura efetiva de carbono.
“Essa produção captura carbono de forma real, porque são árvores novas se renovando constantemente, diferente da floresta nativa, que é estática. O problema é que isso ainda não é reconhecido nos créditos de carbono apenas porque é uma atividade empresarial,” disse Feffer. “Existe aí um valor enorme de captura que o Brasil poderia ver reconhecido.”
O documento da ICC Brasil estima que a bioeconomia da Amazônia pode gerar até US$ 140 bilhões em receitas até 2032 se o País conseguir alinhar políticas públicas, financiamento e inovação.
Para o empresariado, a COP30 será um teste de maturidade.
“Essa COP está mais prática do que as anteriores. As pessoas estão menos preocupadas em negociar e mais em implementar,” disse Mussa. “O Brasil tem a chance de usar Belém como vitrine. Somos mais solução do que problema quando se fala em clima. Precisamos mostrar isso ao mundo.”






