A criação de um novo produto previdenciário — nos moldes do sucesso colossal do Tesouro Direto — poderia resolver diversos problemas ao mesmo tempo: aumentar a rentabilidade do poupador (chave para o seu bem estar de longo prazo) e fomentar a formação de poupança doméstica (necessária para o desenvolvimento do País).
Nossa proposta de uma Previdência Direta é baseada na ideia originalmente defendida por Abraham Weintraub e outros autores num artigo acadêmico de 2017 intitulado “Poupança Individual de Aposentadoria – PIA”, e tem semelhanças com a ideia dos SeLFIES, defendida pelo Prêmio Nobel Robert Merton.
A mecânica da Previdência Direta é a mais simples possível. O Governo abriria contas individuais automaticamente para cada CPF. Os aportes seriam facultativos e feitos via transferência bancária para tais contas por trabalhadores ou empresas e, imediatamente, comunicados à Receita Federal para abatimento no imposto de renda das pessoas físicas e jurídicas.
Os saldos em conta seriam automaticamente utilizados para comprar NTN-B’s a taxas vigentes no mercado. Tais títulos poderiam ser vendidos antes dos 65 anos, porém com um “pedágio” de 30%, de modo a incentivar a poupança de longo prazo e para reaver os benefícios tributários anteriormente concedidos.
Quando faz 65 anos, o participante tem que escolher: ou converte seu saldo em uma renda vitalícia, calculada conforme a curva de juros vigente e seguindo modelos atuariais parametrizados, ou faz a portabilidade para outro plano, saindo do sistema.
Um simulador financeiro também seria disponibilizado na plataforma online da Previdência Direta para que os participantes possam inferir o valor provável de sua renda na aposentadoria a partir de sua poupança acumulada, das perspectivas de depósitos futuros e das curvas de juros vigentes no momento da simulação. Este tipo de ferramenta é fundamental para que os participantes possam, ainda em tempo, verificar se os seus fluxos contributivos estão adequados à sua meta de renda na aposentadoria.
Além disso, a portabilidade para outros planos previdenciários estaria sempre assegurada, de forma a aumentar a confiança e a estabilidade do sistema. Os empregados e funcionários públicos da administração direta e indireta nos níveis federal, estadual e municipal poderiam, a seu exclusivo critério, direcionar a contribuição patronal para a Previdência Direta, o que traria uma competição saudável para melhoria da previdência complementar fechada dos entes públicos.
Em nossos estudos para a operacionalização do produto, verificamos que a Previdência Direta seria um produto claramente superior às demais possibilidades de investimento — VGBL, PGBL, fundos de pensão, fundos de renda fixa, Tesouro Direto, INSS, poupança e imóveis.
Como se sabe, um trabalhador que contribui pelo teto do INSS recebe, ao final de 35 anos, R$ 5.839,45. No entanto, se as contribuições patronais e do empregado pudessem ser redirecionadas à Previdência Direta, o valor previsto de sua aposentadoria seria de R$ 14.738 ao final de 35 anos, já descontando todos os impostos.
As principais características do produto, que explicam seu elevado desempenho, são a ausência de taxas de administração; a extensão dos benefícios tributários já existentes em outros produtos previdenciários; e a conversão do valor acumulado em renda vitalícia.
Os títulos públicos compõem cerca de 80% da carteira dos fundos de pensão e dos planos previdenciários dos tipos PGBL/VGBL. Entretanto, os custos de administração das entidades corroem grande parte da rentabilidade de seus investimentos. As taxas de administração são tão elevadas nos planos PGBL que a aplicação via Tesouro Direto é capaz de produzir aposentadorias maiores, mesmo considerando que o Tesouro Direto não possui os benefícios tributários do PGBL.
Em decorrência de tais custos, uma conclusão lateral de nosso estudo é a de que o nível dos benefícios atuais do INSS dificilmente será alcançado pelas opções atuais do mercado privado.
A conversão em renda vitalícia é o “pulo do gato” do produto, pois possibilita um aumento na aposentadoria menos evidente à primeira vista. A sutileza é que, na aposentadoria vitalícia, há o mutualismo entre os participantes, de modo que as reservas dos que morrem primeiro são transferidas para cobrir as aposentadorias dos que vivem mais. Isto permite poupar por um tempo médio de vida e não por um tempo máximo, uma vez que em sistemas não-solidários os indivíduos, por precaução, devem fracionar a sua poupança para uma vida extremamente longa.
Uma alternativa também avaliada — e que é comumente utilizada pelos brasileiros para a geração de renda na aposentadoria — foi a compra de imóveis destinados a locação. Conforme nosso estudo, esta seria a pior estratégia a ser seguida para maximização da renda previdenciária, tendo em vista que a renda é impactada pelos altos impostos incidentes sobre o aluguel, pela baixa rentabilidade deste tipo de investimento e, principalmente, pela impossibilidade de se consumir o principal (isto é, o valor do imóvel) durante a fase da aposentadoria.
Há formas e formas de se implementar um sistema de capitalização na Previdência Social, e o resultado pode ser bom ou ruim a depender do desenho do sistema, de seus custos e dos incentivos adotados. Acreditamos que a Previdência Direta incorpora o que há de melhor em cada produto.
Além de tudo, a criação da Previdência Direta seria um excelente negócio para o Governo Federal, que passaria a contar com funding abundante, estável e de longo prazo para o financiamento de suas atividades.
Fabio Giambiagi é o economista-chefe do BNDES.
Felipe Vilhena é funcionário do BNDES e doutorando em Administração pela UnB (Universidade de Brasília).
Você pode ler a íntegra do estudo aqui.