O setor de educação passou o dia sob forte pressão depois que a Ânima reportou um resultado ruim e deu mais detalhes de como funciona a dinâmica dos repasses para o FG-FIES — o fundo para o qual as empresas do setor contribuem para cobrir a inadimplência do programa.
A ação da Ânima fechou o dia em queda de 19%; a Yduqs, despencou 15%; a Ser, 9,4%; e a Cogna, outros 6,10%.
No final do call de resultados, o CFO da Ânima , Átila Simões, disse que a comunicação do Governo sobre os repasses do FG-FIES não é clara e que a empresa não tem visibilidade de quantos e quais alunos são inadimplentes com o FIES.
O executivo disse ainda que a Ânima não consegue fazer a checagem do número passado pelo Governo e não sabe como atuar em cima disso.
“Este tema estava fora do radar de todo mundo e colocou um novo grau de incerteza num setor já volátil,” disse Rafael Barros, o analista de educação da XP.
Os repasses das empresas para o FG-FIES começaram no final de 2015, quando a regra do FIES foi alterada para lidar com o alto nível de inadimplência.
Na época, foi definido que as empresas que captam alunos usando financiamento do FIES teriam que ajudar a compor o FG-FIES, que teria que ter R$ 1 para cada R$ 10 de financiamento dado.
A regra dizia que as empresas contribuiriam um valor fixo até o final de 2022 e, a partir deste ano, o valor a ser contribuído seria definido com base na inadimplência dos contratos gerados por cada empresa.
Segundo Rafael, no primeiro tri, isso não apareceu. Mas no segundo tri, a Yduqs mostrou uma queda do tíquete médio de medicina – o curso onde está o maior número de alunos do FIES, dado o valor alto das mensalidades. (A queda no tíquete médio tem a ver com o aumento do repasse ao fundo, que reduz a receita líquida).
“Agora, a Ânima teve um comportamento parecido, com o impacto dos repasses do FG-FIES gerando uma redução de R$ 16 milhões na receita líquida,” disse Rafael.
O resultado ruim da Ânima também contribuiu para a implosão do papel hoje, apesar dos números terem vindo praticamente em linha com as projeções do sellside.
A dona da Universidade São Judas e Anhembi Morumbi cresceu sua receita em apenas 2,4%, e o EBITDA ajustado cresceu menos ainda (2,2%). Já o prejuízo líquido foi de cerca de R$ 50 milhões, em comparação a R$ 24 milhões de um ano atrás.
O pior desempenho foi no chamado segmento core da companhia, que exclui o ensino a distância (EAD) e a Inspirali, a subsidiária da companhia focada em educação médica.
Essa vertical teve uma retração de 3,4% na receita do trimestre, com a base de alunos caindo 2% no ensino acadêmico, para 222 mil alunos, e o tíquete médio, 2,9%.
Já a Inspirali cresceu a receita 10,9%, com a base de alunos subindo 14% e o tíquete médio caindo 3,2%. O EAD teve um crescimento de 17,3%, com a base de alunos subindo 18,5% e o tíquete médio caindo 1%.
O Itaú BBA notou que o resultado fraco já era “amplamente esperado pelo mercado”, e que os números vieram praticamente em linha com o consenso, mas disse que as tendências mostradas “são piores que as dos outros players listados.”
Apesar do resultado operacional magro, um analista disse que a companhia reportou uma melhora na sua estrutura de capital.
“A geração de caixa não foi tão ruim e eles levantaram R$ 300 milhões de dívida no trimestre. E mesmo levantando isso e alongando o prazo, o custo da dívida diminuiu, de CDI + 2,6 para CDI + 2,4%,” disse ele.
A alavancagem da Ânima é um dos principais pontos de atenção do mercado. A empresa se alavancou quando pagou R$ 4,4 bilhões pela Laureate em 2021. Hoje, a Ânima inteira vale R$ 1,5 bilhão.
A alavancagem fechou o trimestre em 3,9x o EBITDA dos últimos doze meses, o mesmo patamar do trimestre anterior.
O CFO disse ao Brazil Journal que a companhia conseguiu manter o nível de alavancagem mesmo num trimestre sazonalmente pior, em que há mais consumo de capital de giro. (No setor, os trimestre mais fortes são os ímpares, que é quando acontecem as rematrículas e os alunos pagam as mensalidades atrasadas).
Segundo Átila, a Ânima tem trabalhado em duas frentes para reduzir a alavancagem. A primeira é a eficiência operacional, com a melhora do EBITDA e diminuição das despesas. A segunda, que ainda não foi colocada em curso, é a monetização de ativos — por exemplo, uma operação de sale and leaseback de algumas unidades.