Ciro Possobom, o CEO da Volkswagen do Brasil, foi um dos signatários da carta que os presidentes das maiores montadoras instaladas no País encaminharam ao Presidente Lula manifestando preocupação caso fosse concedida a redução de tarifas pleiteada pela BYD.
Numa decisão na quinta-feira, o Governo não atendeu ao pleito da chinesa, mas concedeu uma cota temporária para a importação de carros elétricos prontos ou ‘semidesmontados’ com alíquota zero de importação.
Nesta entrevista ao Brazil Journal, Possobom diz que “beneficiar tão somente a montagem de veículos importados no Brasil e com peças importadas destrói a cadeia de produção” local.
“O grupo Volkswagen tem 39 fábricas na China. Poderíamos trazer carros de fora e vender no Brasil, gerando riqueza apenas financeira, mas queremos continuar construindo também para o País, isso é realmente importante.”
Por que a Volkswagen, ao lado das outras grandes montadoras instaladas no Brasil, se posicionou contra a redução das tarifas de importação de carros ‘semidesmontados’, como solicitava a BYD?
A venda de um veículo na concessionária é uma complexa cadeia de riquezas e eventos. Quando um carro é produzido no Brasil, uma dinâmica saudável acontece, mantendo a economia forte, garantindo milhares de empregos, fomentando a tecnologia, pesquisas e desenvolvimento.
Só aqui na Volkswagen, em 2025 vamos comprar R$ 26,3 bilhões em peças automotivas, dinheiro que movimenta o Brasil, desenvolve soluções, coloca o pão na mesa do trabalhador.
É muito mais do que somente uma venda de carro – e repito, é uma responsabilidade da indústria automotiva e de suas centenas de parceiros e fornecedores.
Não podemos ser ingênuos e achar que a relação do veículo com a família brasileira é só a compra e venda do carro.
Um automóvel é composto, em média, por mais de 3.000 componentes que, no caso da produção local, são desenvolvidos aqui, gerando riqueza aqui.
Nosso índice de nacionalização é de 85%, como vemos por exemplo no Tera, nosso mais novo lançamento. Um carro que foi projetado aqui, desenvolvido aqui, produzido aqui.
Beneficiar tão somente a montagem de veículos importados no Brasil e com peças importadas destrói essa cadeia de produção. Só o Tera gerou mais 260 novos empregos diretos na fábrica da Volkswagen do Brasil e cerca de 2.600 empregos indiretos.
Não é uma reação protecionista da indústria contra a concorrência dos importados?
Queremos proteger o desenvolvimento brasileiro, a mão de obra brasileira, a pesquisa e a tecnologia brasileira. Recebemos de braços abertos a concorrência, desde que o cenário seja isonômico e previsível. Venham produzir no Brasil, gerem riqueza e empregos aqui, abastecendo não só a garagem mas também a riqueza e a cultura dos brasileiros.
A Volkswagen é brasileira e estamos aqui, acelerando com o povo brasileiro há 72 anos.
Como a eventual redução das tarifas poderia afetar seus planos de investimento?
Afeta profundamente. Todo e qualquer investimento depende de previsibilidade, regras claras e isonomia. Fica difícil explicar para a matriz, talvez impossível, que as regras mudaram com o jogo em andamento, ou que existam injustificáveis suportes para aqueles que não produzem e que, de alguma maneira, o mercado beneficia aqueles que só querem vender.
Nossos investimentos são para ampliação da capacidade produtiva, para a geração de novos empregos, desenvolvimento, pesquisa e tecnologias brasileiras. Estamos investindo R$ 20 bilhões na América do Sul até 2028, R$ 16 bilhões disso no Brasil.
A chegada do novo Volkswagen Tera injetou investimentos em todas as áreas de produção e logística da nossa fábrica de Taubaté, criando uma cadeia produtiva ainda mais rica. Já pensaram se o Tera fosse apenas importado, sem gerar um real de desenvolvimento aqui no Brasil?
Como explicar para a matriz que é mais barato, vantajoso e simples importar o veículo, ganhar dinheiro e ainda ser agraciado com benefícios fiscais, enquanto estamos querendo investir em pessoas, na compra de peças brasileiras?
A China tem uma superprodução de veículos, e diversos países estão vendo um aumento das importações de carros chineses. Como lidar com essa conjuntura, sobretudo diante das guerras comerciais e tarifárias?
Não se enganem, pois não se trata apenas de guerra comercial – é uma questão de produção e desenvolvimento gerando riqueza aqui.
Temos 39 fábricas na China. Poderíamos trazer carros de fora e vender no Brasil, gerando riqueza apenas financeira, mas queremos continuar construindo também para o País.
A questão é fomentar a região, gerar um futuro melhor para nós brasileiros. A Volkswagen aqui na América do Sul é responsável por 11% do volume total de carros produzidos pela empresa no mundo, e o Brasil é nosso terceiro maior mercado global em volume de vendas.