A lingerie sexy e cheia de rococó para agradar os homens parece estar caindo em desuso.

A Victoria’s Secret, que já foi sinônimo de sensualidade e ainda detém cerca de 10% do mercado de lingerie no mundo, vem exibindo resultados broxantes há três anos. A dificuldade da empresa em captar os anseios da mulher contemporânea vem enterrando as ações de sua controladora, a L. Brands: no ano passado, o papel caiu 55%.

Os tempos mudaram. Bojos e arames de sustentação desenhados para turbinar o corpo da mulher estão dando lugar a lingeries confortáveis e redefinindo o que é sexy.  Saem de cena os ‘pushups’ – sutiãs que apertam e fazem o seio parecer maior – e entram os ‘brallets’, espécie de top de ginástica em versão delicada, com rendas e outros materiais.

Nas campanhas, saem os corpos perfeitos de outrora e entra um marketing realista, com modelos plus size, transgender e de todos os tons de pele.

A Aerie, marca de lingerie para adolescentes da American Eagle Outfitters, é uma das mais antenadas com o novo espírito do tempo feminino: as peças aliam conforto e um look natural e as clientes são estimuladas a postar fotos no Instagram com as calcinhas e sutiã da marca, em uma celebração da diversidade.

A marca cresce acima de 20% desde 2015 e já está avaliada em US$ 500 milhões.

Mas a revolução do sutiã também está vindo das startups, com novas marcas que dialogam de forma mais intensa e personalizada com as consumidoras no ambiente digital, explorando nichos e avançando num mercado antes dominado pela Victoria’s Secret.

Nascida em San Francisco, a Third Love foi pioneira ao lançar meios-tamanhos de bojo – e também em incorporar o uso de big data para desenhar suas peças.

São 11 tamanhos de bojo – em um total mais de 24 modelos e até 74 SKUs. A Victoria’s Secret costuma trabalhar com 36 SKUs no máximo (seis tamanhos de costas e seis de bojo).

Mas se o estoque centralizado do e-commerce favorece uma maior variedade de tamanhos – um desafio logístico quando se tem que abastecer mais de 1000 lojas físicas, com o é o caso da Victoria’s Secret – a dificuldade de experimentar as peças pode ser um inibidor.

A Third Love contornou isso com uma política de trocas que permite experimentar as peças por 30 dias e devolver sem custo. Desde então, as vendas saltaram de US$ 1,5 milhão em 2015 para US$ 160 milhões no ano passado, segundo estimativa da Forbes. A empresa já levantou US$ 30 milhões e está avaliada em US$ 750 milhões.

No Brasil, a Pantys cresce com a proposta de aliar conforto e sustentabilidade – sem perder o glamour. O tecido das calcinhas vem com uma tecnologia que dispensa o uso de absorventes descartáveis. (Há também uma linha de sutiãs absorventes para mães lactantes e até biquinis.)

Na entrada da pequena loja conceito na Oscar Freire, em São Paulo, a placa com duplo sentido resume bem o espírito da marca: “Entre e comece um novo ciclo.”

A Pantys foi fundada em 2017 por Emily Ewell, uma engenheira química americana que mora há cinco anos no Brasil e desenvolveu o tecido localmente. “Nosso tecido é muito competitivo e tem um poder de absorção maior do que os lá de fora”, diz a empresária. O foco é o e-commerce, mas a marca vem sendo convidada a ocupar espaços dentro de lojas como a Ahlma, a grife de ‘moda consciente’ da Reserva.

O sucesso das novas marcas deixa claro o que está acontecendo com a Victoria’s Secret: sua marca e seu canal de vendas estão sendo deslocados por um mundo em que a mídia é cada vez mais nicho – e no qual a mulher passou a se enxergar de outra forma no espelho.

“Essa ideia de que a mulher usa lingerie só para o homem não tem ressonância com a mulher de hoje”, diz Emily. “A mulher usa lingerie para ela. Não há nada mais sexy do que uma mulher autoconfiante.”