Apesar da derrota para o Chelsea por 2 a 0 na tarde de hoje, o personagem que saiu com mais moral da Copa do Mundo de Clubes é um velho conhecido do torcedor brasileiro: Renato Portaluppi.
Diante de gigantes europeus e clubes bilionários, nenhum treinador ou time sul-americano foi tão longe ou permitiu que sua torcida sonhasse com o impossível como o Fluminense de Portaluppi. Sua própria trajetória mostra que a garra e a capacidade de dar a volta por cima sempre o acompanharam.
Em julho de 2008, há 17 anos, Renato Portaluppi, mais conhecido como Renato Gaúcho, estava desolado diante da derrota mais marcante de sua carreira. O Fluminense vivia seu próprio Maracanazzo ao perder para a LDU a final da Taça Libertadores, nos pênaltis, após uma campanha espetacular. A ferida de Renato e do Fluminense nunca foi completamente cicatrizada.
Quase duas décadas depois, vivendo dias de sonho na Copa do Mundo de Clubes, o treinador teve novamente a chance de fazer história em seu velho estilo irreverente e vencedor. O título não veio – mas a história, sim.
Renato é desses personagens que misturam glória e cicatriz.
Batizado no Rio de Janeiro, nos anos 80, como Renato “Gaúcho”, Portaluppi nasceu em 9 de setembro de 1962 e cresceu com 12 irmãos em Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha.
Começou a carreira no Grêmio, onde foi campeão da Libertadores e do Mundial Interclubes em 1983, marcando dois gols na final contra o Hamburgo, da Alemanha.
Como ponta-direita, jogava com garra, técnica e dribles curtos. Acumulou títulos e polêmicas. Para cada gol decisivo ou conquista como técnico, Renato coleciona frases de impacto e episódios controversos, como a briga com o técnico Telê Santana, em 1986, que o tirou da Copa do Mundo.
A fama de mulherengo e irreverente muitas vezes ofuscou seu trabalho como treinador. Enquanto o Fluminense eliminava a Internazionale de Milão, time que disputou recentemente a final da Champions League com o PSG, um locutor da TV argentina comentava que Renato “já saiu com 5 mil mulheres,” alimentando o folclore.
No mesmo jogo, Renato foi decisivo: escalou o time com três zagueiros, espelhando o adversário, e venceu por 2 a 0. Não parece coisa de um simples “motivador”, como sugerem seus críticos.
À frente da equipe com o menor orçamento entre os quatro clubes brasileiros que foram tentar a sorte na América, o técnico do Flu levou o tricolor a uma inédita semifinal – e uma campanha que já rendeu R$ 349 milhões em premiações.
Com quatro vitórias, igualou Lula – não o Presidente, o treinador do Santos em 1962-63 – e se tornou o brasileiro com mais triunfos na história dos mundiais.
O abismo financeiro também não foi suficiente para frear o Fluminense ao longo da competição. Segundo o Instituto Capology, o clube tem uma folha salarial estimada em 22,4 milhões de euros/ano, cerca de R$ 143 milhões, contra 201 milhões de euros, aproximadamente R$ 1,29 bilhão, do Chelsea.
Na fase anterior, Renato superou o também bilionário Al-Hilal, da Arábia Saudita, e encerrou sua participação sem perder para nenhum europeu até o confronto com os ingleses.
A campanha bem-sucedida do Flu também valoriza os técnicos brasileiros, após anos de domínio de nomes estrangeiros, como os portugueses Jorge Jesus, Abel Ferreira e Artur Jorge.
A torcida tricolor viveu um sonho sob o comando de um personagem lendário na história do clube. A relação Renato e Fluminense tem algo de místico. Ele é o autor do gol de barriga que decidiu o Carioca de 1995 contra o Flamengo de Romário, no ano do centenário rubro-negro.
Mesmo sem a taça, Renato Portaluppi venceu na terra de Tio Sam, e certamente voltará ao Brasil desfilando aquela marra do bem que os boleiros e os tricolores tanto gostam.
Que assim seja.
Bernardo Stampa é rubro-negro e não quer briga por causa deste artigo.