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Pepe Cafferata e Guilherme Dogliani
Crescer ou não crescer, eis a questão… Errada. Toda empresa precisa crescer – a pergunta que deve ser feita é: como crescer? A construção de novos negócios tem se mostrado uma avenida prioritária, relevante e resiliente. Na América Latina, ela não só se mantém como uma das três principais prioridades estratégicas dos CEOs como as organizações da região esperam que os novos negócios gerem entre 25% e 30% das suas receitas nos próximos cinco anos.
Na quinta edição anual do único levantamento global que monitora a percepção dos líderes empresariais em relação à construção e ao ganho de escala de novos negócios, realizado pela McKinsey, um dado surpreendente: quase a totalidade das empresas latino-americanas entrevistadas já dispõe de pelo menos um produto ou serviço pronto para ser comercializado. Isso revela que existem verdadeiros ‘tesouros escondidos’ e inexplorados dentro das organizações. Como esperado, a IA se destaca como uma importante viabilizadora de novas oportunidades no futuro próximo, mesmo em áreas e indústrias não relacionadas à tecnologia.
Pequenos investimentos, grandes negócios
Em empresas que estão priorizando cada vez mais a construção e a escala de novos negócios, os entrevistados costumam afirmar que os esforços são orientados principalmente pelo desejo de crescer – e há uma boa razão para isso. Os resultados da nossa pesquisa indicam que, em comparação com empresas que não investem nada, aquelas que alocam 20% ou mais do seu capital de crescimento na construção de negócios inteiramente novos têm um crescimento de receita maior.
Investir cerca de 20% do capital de crescimento parece ser o ideal para capturar valor significativo. Abaixo disso, a taxa de retorno não chega a ganhar fôlego; acima, ela começa a perder força. No entanto, apenas 38% dos entrevistados globalmente estão aportando a parcela ideal do seu capital de crescimento, o que sugere que quase dois em cada três líderes estão deixando valor sobre a mesa.
Comece com o que a organização já tem
Hoje, 13% das receitas e 16% do valor das organizações entrevistadas em todo o mundo já se originam de novos negócios. E a América Latina tem um terreno fértil a explorar: somos a única região a superar os 95% de empresas afirmando ter pelo menos um ativo com potencial comercial não realizado. Na lista de candidatos a novo negócio, pouca surpresa: dados, propriedade intelectual, novas tecnologias, capacidades/produtos internos que podem ser escalados e se tornar atraentes ao público externo. Este último é, para quase metade dos CEOs latino-americanos, o ativo mais subaproveitado por suas empresas.
Tesouros escondidos ou à vista de todos, os tipos de novos negócios considerados mais interessantes variam conforme o setor. Mas com pelo menos um denominador comum: a IA é vista por oito em cada dez líderes como a maior viabilizadora de novos negócios nos próximos cinco anos, seguida por IoT (internet das coisas) e blockchain.
Onde está o ouro
Soluções “copiloto”, em que a IA generativa reduz o esforço ou aprimora a tomada de decisão, são os casos de uso mais esperados nos diferentes setores, particularmente naqueles voltados para serviços ou com forte foco no atendimento ao cliente. Essa expectativa é maior nos setores de saúde e de tecnologia, mídia e telecomunicações. Nos setores de serviços financeiros e de viagens, logística e infraestrutura, a hiperpersonalização e os equivalentes digitais do modelo de negócio atual despontam como implementações mais promissoras e prováveis. No setor de bens de consumo e varejo, a IA generativa deve ser mais alavancada em negócios ligados a novos canais de distribuição.
Há também oportunidades além do digital e da IA. Empresas líderes da região estão desenvolvendo ecossistemas em diversas indústrias (como embedded finance e meios de pagamentos), entrando em novas geografias ou segmentos (aproveitando vantagens competitivas em produtos ou distribuição, por exemplo) ou desenvolvendo negócios sustentáveis com alto valor intrínseco (in the money).
A nave mãe e os segredos do sucesso
Alguns elementos comuns a organizações experientes na construção de novos negócios já estão mapeados: uma abordagem de portfólio disciplinada, consistência no investimento e uma equipe dedicada. A prática leva à perfeição: empresas com mais experiência e maturidade na construção de novos negócios têm duas vezes mais chances de sucesso em seus empreendimentos. Em comparação com as novatas, as mais experientes geram receita 12 vezes maior no quinto ano após o lançamento do novo negócio, mesmo com um investimento de capital apenas duas vezes maior antes do ponto de breakeven.
A relação entre o negócio novo e o principal tem se mostrado, ao longo de todas as edições da nossa pesquisa, determinante para o sucesso. Para promover uma interação saudável e evitar que aspectos organizacionais impactem negativamente o novo empreendimento, é essencial estabelecer uma governança clara, contar com talentos capazes de lidar com os temas desafiadores de um negócio nascente e oferecer incentivos para que a liderança da empresa original trabalhe pelo sucesso do novo negócio. Além disso, é preciso equilibrar independência e conexão entre as organizações. Conforme vão ganhando experiência, as empresas dão aos novos negócios um grau maior de autonomia para buscar vantagens excepcionais, inclusive indo além das adjacências da “nave mãe”.
Crescendo com o novo
Hoje, se um CEO não está promovendo esforços para construir novos negócios, ele está colocando em risco o legado e a relevância da sua empresa. Mesmo as organizações que desfrutam de um sólido posicionamento no mercado – devido a um produto ou ao acesso a clientes – podem experimentar uma reviravolta. Poucas empresas têm motivos para se sentirem confortáveis com as suas vantagens atuais.
Alcançar o nível necessário de comprometimento requer dos CEOs a capacidade de reimaginar indústrias e companhias, e os papéis e os espaços que suas empresas podem ocupar. Para isso, é preciso vislumbrar as possibilidades: enxergar como novas tendências, tecnologias, colaborações e circunstâncias abrem novas oportunidades. E, para além dos aspectos mais tangíveis do negócio, líderes veem a construção de novos negócios como uma via para inspirar as pessoas, unindo-as em torno de um propósito comum, enquanto constroem o legado distintivo.
Pepe Cafferata é sócio sênior da McKinsey em São Paulo e líder de Leap – Novos Negócios na América Latina
Guilherme Dogliani é sócio da McKinsey em São Paulo e líder de Leap – Novos Negócios no Brasil