O Brazil Journal conversou com Fabio Carvalho sobre jornalismo, o modelo de negócio da velha imprensa e o futuro da Abril.  
 
 
Abaixo, trechos da conversa:
 
DIGITAL FIRST
 
“Temos que encarar a realidade da migração do papel para o digital e dar prioridade a levar estas marcas — que ainda estão entre as mais relevantes do mercado editorial — para o digital. A Abril está atrás na curva da tecnologia, e precisa ficar à frente. Vamos fazer uma revisão completa na estrutura de custos e estratégia operacional, adequando o organograma, reorganizando os times e orientando o foco para esse objetivo.”  
 
 
10595 c19a88b7 63bc 7f0e 99f8 a874d4753d81“UMA GRANDE STARTUP”
 
“Em todos os processos de restruturação, há uma análise que é feita e refeita sobre os objetivos, a infraestrutura e o time que podem entregar o que a companhia precisa.  Tudo na companhia — não só as estruturas dos times e dos processos — será estudado, e então transformado ou ratificado. A gente encara isso como construir startups dentro da empresa. A partir dessa aquisição, a Abril passa a ser uma grande startup que fatura R$ 1,6 bi.  Tudo que ela herda de estratégias, processos, organograma, conceitos e filosofia vai passar por um filtro de ratificação ou transformação.”

MODELO DE NEGÓCIOS

“As redes sociais quebraram um dos elos da cadeia da comunicação. 
 
Antes, a produção do conteúdo e os próprios canais de distribuição pertenciam aos mesmos grupos, que eram poucos.  Agora, a disseminação está pulverizada, o que também fragmentou a produção do conteúdo, e esse ciclo se exponencializou.  Isso quebrou boa parte da velha imprensa.  Hoje existe uma superabundância de informação, e isso reduziu o valor do trabalho de qualidade que era feito pela velha imprensa.  
 
Não vamos lutar contra o futuro: as plataformas de distribuição do conteúdo já se provaram, cada uma delas com suas vantagens e seus problemas. Cabe aos grandes veículos usarem essas plataformas como especialistas.  Nós temos que ‘entender de internet’ em prol da comunicação, e não em seu detrimento.”

 
VOCÊ É O QUE VOCÊ LÊ

 
“A minha visão é de que essa percepção de queda na qualidade da imprensa afeta a sociedade como um todo.  Muito da conduta do ser humano é definida pela sua visão do mundo, e muito desta visão de mundo é definida pelo que ele lê.  A crise do mídia tradicional afeta a formação crítica das pessoas. O debate social perdeu qualidade em ritmo acelerado. Acabamos de ver uma eleição que mais parecia uma partida de futebol. Essa degradação do debate está acontecendo em várias partes do mundo, até com algumas ideologias que já haviam sido vencidas pela evolução social ensaiando nova popularidade…”

PAYWALL

“O jornalismo de alta qualidade custa para ser produzido e tem que ser monetizado, em parte, com o leitor pagando.  Isso não quer idzer que 100% do conteúdo tem que estar atrás do paywall. Existe espaço também para alguma liberdade de acesso e liberdade de compartilhamento que transcendam a barreira do pagamento até para você aumentar o engajamento do leitor interessado.  Existe uma sede por qualidade, e essa é a maior força em qualquer mercado: a demanda, o que o cliente quer.”  

FATO E OPINIÃO

“Todos os formatos de entrega da notícia são válidos; o que é central é a valorização do trabalho jornalístico.  A qualidade da notícia passa pelo bom preparo do jornalista, pelas boas condições de trabalho e por padrões éticos. Fatos tem que ser investigados e confirmados.  Opiniões tem que fundamentadas e identificadas como tal.  É uma volta ao básico. A essência do jornalismo — que deu à sociedade décadas preciosas de democracia — tem que ser valorizada acima de qualquer coisa. (…) O jornalismo de qualidade e a imprensa livre são essenciais para que a conversa democrática e civilizatória se desenvolva.”

ABRIL COM FOME

“Vamos dar absoluta prioridade a resolver essa situação, sobretudo a das pessoas que ganhavam menos. Muita gente talentosa ajudou a construir a Abril e hoje, infelizmente, não está mais na companhia.  Se nosso plano der certo, esperamos até poder contratar algumas dessas pessoas de volta, porque é graças a elas que a Abril sabe fazer revista.  Parte do nosso trabalho é evitar que haja um colapso completo, o que engrossaria a fila de quem perdeu emprego.”