Em 2015, quando a China enfrentou a ameaça de uma retração acentuada no PIB, o país engendrou um gigantesco programa de incentivo ao setor imobiliário.
Dez anos se passaram, US$ 900 bilhões foram gastos, o endividamento total do país explodiu para mais de 300% do PIB – e, com o fim da bolha de investimentos imobiliários, os chineses perderam um de seus principais motores de crescimento nos anos recentes.
“Será difícil simplesmente repetir o manual de 2015,” disse à Bloomberg Christopher Beddor, um analista da Gavekal Dragonomics. “O problema fundamental são as forças macroeconômicas, como a fraca demanda das famílias, que provavelmente não serão resolvidas por intervenções governamentais aleatórias.”
Os juros já estão perto de zero, com a taxa básica em 1,4%, e os sinais deflacionários são sentidos em diferentes setores.
A queda nos preços reflete o excesso de capacidade da indústria. O governo promove as exportações, mas mesmo o mercado externo é incapaz de absorver tudo que sai das fábricas chinesas – ainda mais agora, com as barreiras criadas pelo tarifaço de Donald Trump e a reação protecionista da Europa e outros países.
Internamente, as indústrias chinesas – como a de carros elétricos – entraram em uma guerra de preços, uma das preocupações do governo, que vem tentando administrar preços e oferta.
O Presidente Xi Jinping lançou no início do mês uma política de “anti-involução” – visando aplacar a concorrência destrutiva, o excesso de capacidade e as guerras de preços.
O objetivo é estabilizar os preços, melhorar as margens de lucro, eliminar gradualmente os players mais fracos e mudar o foco para o desenvolvimento econômico.
A ‘involução,’ para as autoridades chinesas, é o risco de a economia ficar atolada em uma conjuntura em que a competição ‘selvagem’ leva à diminuição das recompensas aos empreendedores, corrói as margens e cria uma sensação de esgotamento, debilitando as perspectivas dos mais jovens – especialmente os de melhor qualificação, podendo elevar o mal-estar social.
No documento Unlocking consumption, publicado em junho, o Banco Mundial afirmou que “desafios estruturais – incluindo uma desaceleração do crescimento da produtividade, alto endividamento e envelhecimento da população – devem restringir o crescimento no médio prazo.”
Para o economista Eric Zhu, da Bloomberg Economics, reduzir o excesso de capacidade em certos setores pode amenizar a guerra de preços, mas haverá preocupações crescentes com o impacto no crescimento e no emprego.
“Um caminho mais viável seria focar no aumento da demanda por meio de mais renda e apoio ao emprego,” disse Zhu.
Segundo Michael Pettis, fellow da Carnegie Endowment e um analista veterano de China, o excesso de capacidade produtiva da indústria chinesa não foi uma reação a um aumento da demanda interna nem de um crescimento na demanda de outros países – tratou-se na verdade uma consequência da queda no setor imobiliário chinês.
“A criação de excesso de capacidade no setor imobiliário se transformou na criação de excesso de capacidade para o setor industrial – especialmente nos setores favorecidos politicamente, como painéis solares, veículos elétricos e baterias,” Pettis escreveu no X.
As autoridades chinesas procuram, portanto, outros motores de crescimento para impedir uma desaceleração ainda mais acentuada do PIB.
Uma alternativa seria o incentivo ao consumo interno, especialmente para um país que vai exibindo sinais de “japanização” – baixo potencial de crescimento por causa da montanha de dívida acumulada e deflação.
Mas incentivar o aumento de gastos das famílias chinesas não é algo simples; exigiria reorientar o modelo econômico do país.
“O baixo consumo na China não é resultado de um descuido que possa ser corrigido por uma decisão administrativa, porque ele é fundamental para um sistema econômico em que as transferências familiares subsidiam o rápido crescimento do investimento e da indústria,” disse Pettis. “Um dia veremos uma transformação, mas acredito que Pequim conseguirá adiar isso por mais alguns anos.”
Enquanto isso não acontece, argumentou o analista, o país continuará transferindo excesso de capacidade de um setor para o outro.