Um caos logístico se avizinha.
Os 45 mil estivadores e trabalhadores de 36 portos americanos na Costa Leste e no Golfo do México entraram em greve hoje – e as repercussões em cascata serão sentidas em todo o mundo caso o movimento se prolongue.
Desde 1977 não havia greves conjuntas nos portos dessas regiões, abrangendo docas que vão do Maine ao Texas.
Os portuários cruzaram os braços a partir das 0h de hoje. Eles querem melhores salários e restrições à automação de suas atividades. Até o início da tarde não havia um balanço da adesão.
Praticamente metade das importações americanas são feitas por esses portos, e a indústria e o comércio se preparam para lidar com a falta de insumos e produtos.
A National Association of Manufacturers estimou que o volume diário de comércio atingido é de US$ 2,1 bilhões, e o impacto na economia como um todo pode alcançar US$ 5 bi ao dia.
Nas contas de um analista do JP Morgan, o custo deverá ficar entre US$ 3,8 bi e US$ 4,5 bi a cada dia de paralisação – um prejuízo equivalente a 6% do PIB diário.
Uma paralisação de até duas semanas deverá ter um impacto localizado e sem maiores consequências para além de um atraso nas movimentações, dizem os analistas.
Mas se o impasse não for superado rapidamente, haverá efeitos sobre a inflação e o crescimento econômico. Navios ficarão parados aguardando liberação para o embarque e o desembarque, com efeitos em cascata ao redor do mundo.
“Não se trata apenas do custo da suspensão nas operações, mas também o período de normalização e quanto tempo será necessário para que as coisas voltem ao normal,” Jonathan Gold, vice-presidente de supply chain da National Retail Federation disse ao USA Today.
Segundo Gold, cada dia de greve exige de três a cinco dias para que o trabalho atrasado seja recuperado.
A paralisação já afetou o desembarque de insumos farmacêuticos e medicamentos – entres eles as importações de Ozempic e Wegovy, da Novo Nordisk. Muitas farmacêuticas dependem dos portos da Costa Leste e deverão recorrer parcialmente ao transporte aéreo.
O movimento grevista é liderado pela International Longshoremen’s Association (ILA), que não aceitou as contrapropostas da United States Maritime Alliance (USMX).
A ILA reivindicava um reajuste nos salários de US$ 39 para US$ 69 por hora trabalhada, num aumento escalonado de 77% ao longo de seis anos. Agora aceita um reajuste de 61,5%. Os sindicalistas pedem também proteções contra a perda de vagas para a automação.
“Eles adorariam ver a automação em toda costa Leste e costa do Golfo,” disse o presidente da ILA, Harold Daggett. “Por eles, nós não teríamos emprego.”
A USMX propôs um reajuste de 50%, além de triplicar as contribuições dos empregadores para os planos de previdência e melhorar os planos de saúde. Aceita também discutir alguns limites à automação.
Em 2002, uma greve de estivadores se alongou por 11 dias até que o presidente George W. Bush usasse um recurso legal, o Taft-Hartley Act, para obrigar a volta ao trabalho enquanto as negociações não fossem concluídas.
Apesar da pressão das associações empresariais para uma intervenção da Casa Branca, Joe Biden preferiu defender a continuidade das conversas e disse que não tem a intenção de invocar o Taft-Hartley Act.
As cadeias globais de suprimento já vêm enfrentando estresses por causa dos conflitos no Mar Vermelho, a seca no Canal do Panamá e o colapso da ponte no porto de Baltimore. Nos últimos dias, houve ainda o efeito do furacão Helene.
O efeito dominó poderá portanto se intensificar no período em que a economia começa a se preparar para as vendas de fim de ano, disseram as associações empresariais.
“Parece uma tempestade perfeita, mas é também uma ótima posição de negociação para quem deseja entrar em greve,” afirmou o analista chefe de fretes marítimos da Xeneta, Peter Sand, em uma entrevista à CNBC.
A gigante dinamarquesa Maersk estimou que uma única semana de paralisação poderá acarretar de quatro a seis semanas para normalização do transporte.