A política econômica brasileira está cada vez mais parecida com a argentina: o Estado não consegue poupar, o empresariado não quer investir, o Governo massageia os números oficiais, a pressão inflacionária se acumula aqui (e explode lá), e — o mais grave de todos os pecados — o poder central é incapaz de fazer um mea culpa.
É hora do nosso segmento especial: “Como partidos populistas aqui e lá fazem exatamente o contrário do que dizem acreditar e levam um país à bancarrota no processo.”
No capítulo de hoje, o triste fim de uma alegoria populista do lado de lá da fronteira. (Agradecimentos ao colega Ariel Palácios, que narrou esta pérola no Estadão.)
Em 2011, o empresário argentino Alex Gordon — com um tino comercial quase tão grande quanto sua propensão ao peleguismo — resolveu prestar uma homenagem das mais lindas ao governo de seu país.
Corria o tempo da reeleição da presidente Cristina Kirchner, e a herança maldita do kirchnerismo ainda não havia explodido em praça pública. Era apenas uma bomba-relógio embrulhada no pavilhão nacional.
A ideia de Gordon era batata, ou melhor, era hambúrguer: montar uma rede de fast food nacionalista. Assim nasceu a “Nac e Pop”, onde o hambúrguer, o cachorro quente e a batata frita foram todos pensados para atrair kirchneristas — o que é curioso, porque esse pessoal acredita em ‘almoço grátis’. “Nac e Pop”, explica-se, é a abreviação de “Nacional e Popular”, o slogan do kirchnerismo.
Pense em todos os clichês que os populistas usam para chegar ao Poder:
Gordon falava em “revalorização nacional”;
Dizia que sua rede ia “enfrentar” as concorrentes estrangeiras com preços mais baixos;
Prometia hambúrgueres feitos “100% com carne de verdade”;
Não vendia refrigerantes de empresas multinacionais e oferecia apenas bebidas argentinas.
Cada unidade da “Nac e Pop” era decorada com fotos de Evita Perón, Maradona, e Che Guevara, entre outros ícones argentinos ou socialistas.
Este era o sonho.
Agora, o desfecho da história.
A “Nac e Pop” quebrou. Terá sido porque o poder de compra de sua clientela foi comido pela inflação de Cristina Kirchner? Ou porque suas metas de faturamento eram tão fictícias quanto o superávit primário brasileiro? Será que tudo era uma tentativa de lavagem de dinheiro youssefiana? A carne era Friboi? Será que a PJ quebrou mas Gordon continua bem na física? Ou será que os ‘preços mais baixos que a concorrência’ eram tão insustentáveis quanto gasolina subsidiada?
Escolha o motivo-clichê que quiser, governos populistas sempre farão jus a ele.
Gordon, que prometia “tratamento igualitário” aos empregados, não paga salários, contas nem encargos sociais há três meses, e está desaparecido.
Na segunda-feira, parte dos 170 funcionários da “Nac e Pop” protestavam na frente das filiais, exigindo a presença de Gordon, de acordo com o relato de Ariel Palácios.
No Brasil e na Argentina, “salvar os pobres”, “lutar pela soberania nacional”, e “valorizar o que é nosso” são ideias poderosas que frequentemente conseguem vitórias eleitorais. A baixa escolaridade e a desigualdade de renda fazem muitos cidadãos reféns da ideia de um “pai dos pobres” ou de uma “mãe do PAC.”
Mas nestes países, a experiência mostra que, para entender a realidade, você tem que ler o livro de cabeça para baixo.
Assim, quando defendem que “o petróleo é nosso,” é porque ele é dos políticos — você é apenas o crédulo, o pato, a massa de manobra.
Quando dizem que “o pré-sal é estratégico”, é porque já bolaram estratagemas para saquear o cofre.
E quando urram que “a Petrobras é um patrimônio dos brasileiros,” você já sabe qual patrimônio vai crescer no final da história.
É nessa retórica do avesso que o conto do hambúrguer e o do petróleo se encontram, e onde o fracasso espetacular de uma alegoria populista pode servir de aviso e lição.