Os planos de saúde mal se recuperaram dos desafios dos últimos anos e já estão lidando com uma nova bomba. 

O STF vai julgar nesta quarta-feira uma Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) que pode evitar ou confirmar prejuízos bilionários para as operadoras de saúde — e provar, mais uma vez, que no Brasil até o passado é incerto.

A ADC trata da proibição dos reajustes de planos de saúde por faixa etária para beneficiários com mais de 60 anos, um tema que já foi julgado no Supremo três semanas atrás, em outra ação. 

Hoje, os planos de saúde criados depois de 2004, quando o Estatuto do Idoso entrou em vigor, já aplicam o reajuste por faixa etária nos clientes com mais de 60 anos. 

Semanas atrás, o STF desferiu um golpe nos planos ao julgar uma ação proposta por uma beneficiária de uma Unimed que havia contratado o plano em 1999. Quando completou 60 anos, ela sofreu um reajuste significativo em sua mensalidade, o que a levou a entrar com a ação. 

O TJ/RS acatou a ação e aplicou o Estatuto do Idoso ao caso – mesmo se tratando de um contrato firmado antes da entrada em vigência da lei.

A Unimed recorreu, e o assunto chegou ao STF como um recurso extraordinário (RE). Na votação de três semanas atrás, o colegiado formou maioria no sentido de que o Estatuto do Idoso pode, sim, ser aplicado a contratos de planos de saúde anteriores à lei – um caso concreto que aumenta a insegurança jurídica que os ministros do Supremo, depois, dizem desconhecer.  

Dos 11 Ministros, sete votaram a favor de que o Estatuto do Idoso seja aplicado em contratos anteriores a ele; dois votaram contra (Dias Toffoli e Marco Aurélio, que está aposentado e já havia proferido seu voto); enquanto Luis Roberto Barroso se declarou suspeito e Luiz Fux se declarou impedido. 

Agora, a ADC que será julgada — de autoria das operadoras de saúde — tenta alterar aquela decisão, definindo que o Estatuto do Idoso não pode afetar os contratos firmados antes da lei. 

“O problema disso é que as carteiras feitas antes de 2004 foram precificadas levando em conta as regras daquele momento, que permitiam o reajuste por faixa etária depois dos 60. Então, mesmo que a decisão não seja retroativa e só afete os reajustes futuros, isso já teria um impacto relevante,” disse um executivo do setor. 

No julgamento de hoje, o STF pode acatar a ADC, revertendo sua decisão de três semanas atrás e preservando a integridade dos contratos. Mas, se além de proibir os reajustes por idade, o Supremo decidir que a regra vale de forma retroativa, o impacto será desastroso para o setor. 

Há duas hipóteses de modulação: o STF pode decidir que os planos contratados antes do Estatuto do Idoso terão que devolver aos beneficiários os valores dos reajustes nos últimos cinco anos; ou que terão que devolver todos os valores recebidos desde 2004, o que geraria um prejuízo de dezenas de bilhões para as operadoras. 

“De qualquer jeito, o impacto é bilionário. Mas se for retroativo, são mais bilhões ainda,” disse outro executivo. 

No setor, as operadoras que mais devem ser afetadas pela decisão são as Unimeds, já que muitas delas foram criadas nos anos 70 e possuem uma carteira significativa de planos contratados antes do Estatuto do Idoso. 

As grandes operadoras (Bradesco, SulAmérica e Amil), também devem sofrer impactos, ainda que não esteja claro o tamanho do prejuízo de cada uma. 

Fontes do setor disseram ao Brazil Journal que os lobistas das associações que representam as operadoras comeram mosca e demoraram para acordar para a gravidade da ação julgada semanas atrás. Agora, faltando horas para o julgamento da ADC, estão correndo atrás do prejuízo.  

Num manifesto publicado ontem – e assinado pelas presidências da UNIDAS, Abramge e da Unimed – as operadoras de saúde disseram que o resultado do julgamento da ADC é “um divisor de águas, porque a possibilidade de serem revistos os reajustes aponta impacto substancial nos contratos celebrados, que observaram a boa-fé, a transparência e as leis brasileiras.”

O manifesto diz ainda que com “a redução substancial das receitas, as operadoras de pequeno e médio porte certamente não sobreviverão à retroatividade.”

“Estão em risco o princípio constitucional da segurança jurídica e pilares do direito, como o ato jurídico perfeito, a coisa julgada e o direito adquirido. Mas também ficam ameaçados o direito à saúde e a dignidade da pessoa humana, já que eventual solução com intenção de proteger os consumidores poderá expô-los à desassistência de serviços, à falta de oferta aos planos de saúde e à sobrecarga do SUS.”

Procuradas, a Fenasaúde e a Abramge – que, aliás, raramente falam a mesma língua – não quiseram se manifestar antes de uma decisão final.